Capítulo V

6.4K 942 140
                                    


O que Ophelia mais gostava eram os dias que ela passava na residência de Southfield Park. Não que a mocinha invejasse ou ambicionasse ter grandes fortunas, ou mesmo ter seu momento de pompa no lar alheio. Acontece que, quando Frederick e August levaram-na pela primeira vez, Ophelia desejou poder voltar muitas vezes para ler os vastos livros que preenchia a ornamentada biblioteca dos Blackall.

Em sua casa, Ophelia acostumara-se a ter o mínimo. Isso significava que os livros também eram raros, por isso o Sr. Stanhope apenas adquiria o que acreditava ser o melhor a ele e aos filhos. Então, quando Ophelia, ainda menina, depositara seus grandes e curiosos olhos sobre aquele paraíso literário de Southfield Park, ansiou por mais momentos naquele aconchegante e inteligente ambiente. Para uma menina do campo, filha de um singelo reverendo, se existia de fato um céu e um inferno, os Blackall já haviam adquirido um pedacinho do Éden para si. O que a fazia pensar se somente os ricos eram privilegiados por tamanha glorificação de vida.

Naquela tarde, Ophelia terminava de ler um livro enorme sobre grandes navegações. Frederick havia pedido ao pai para que Ophelia levasse o volume para sua própria casa e, lá, continuasse a leitura quando quisesse. O pedido não havia sido negado pelo Sr. Blackall, mas a jovem não poderia perder o pretexto de continuar a visitar com frequência a majestosa biblioteca de Southfield Park. Enquanto a moça embalava-se na sua aventura, Frederick e August aproveitavam da folga dos estudos. Dali a alguns meses, estariam na Universidade; então o melhor era sossegar o cérebro com conhecimento e gastá-lo com a divertida concentração do jogo de cartas. Como de costume, August empolgava-se com quaisquer jogos; assim como o pai, era profundamente competitivo.

— Ganhei! — triunfou o vaidoso rapaz. — É péssimo jogar contigo, Fred. Preciso de um concorrente à minha altura.

— Um que seja tão arrogante quanto?

— Um que seja um vencedor, e não um perdedor como você é.

— Defina perdedor, August — Frederick gostava de desafiar seu irmão a um questionamento mais aprofundado sobre as coisas mundanas.

— Só há uma definição clara para perdedor — contrapôs o outro. — Aquele a quem a vitória é impossível.

— Mas isso é o óbvio — insistiu Frederick, desapontado pela resposta. — Gostaria de uma resposta mais eloquente.

— Perdedor é uma definição clara de quem não ganha, mas o que Fred quer saber, August, é o que é ser um perdedor diante de tantas possibilidades de vitórias na vida. — Ophelia havia tirado a sua atenção do livro que lia para meter-se na conversa dos gêmeos. — Compreendi sua questão, Fred, e, deveras, um perdedor e um vencedor podem ter muitos cenários; um complementa o outro, mas não necessariamente precisam estar juntos para acontecer. Vencer um jogo de cartas, por exemplo, é algo em que indubitavelmente terá o que ganha e o que perde. Contudo, em relação à vida, há o vencer e o perder individual. Meu irmão Arthur, por exemplo: venceu quando conquistou seu cargo na Marinha Britânica; essa vitória não teve nenhuma perda.

— E um exemplo de perda sem um vencedor? — quis saber August, entediado.

— Bem, podemos usar a morte de minha mãe — disse Ophelia, pensativa. — Quando alguém muito querido morre, é uma grande perda àqueles que o tinham em grande estima. Só há perdas; nenhum ganho.

— Se for um duelo, essa morte pode ser um ganho a alguém — apontou August.

— Mas nesse caso, irmão, é uma morte por competição. Ophelia refere-se à morte por questões naturais ou por acidentes. E, como Ophelia havia dito, há muitas possibilidades de vitórias na vida, o que nós costumeiramente chamamos de sonhos realizados.

Casamento BrancoOnde histórias criam vida. Descubra agora