Capítulo XII

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Finalmente, o segundo mês do outono parecia ter o clima correto para a estação. O teimoso e vaidoso verão havia partido, prometendo retornar no próximo ano; o outono, então, aproveitou que seu irmão egoísta ausentara-se e pôde mostrar o seu talento alaranjado. As folhas, secas e grandes, caíam das árvores, deixando-as cada vez mais preparadas para o inverno. Nenhuma flor coloria Hampshire; nenhum sol aquecia os dias; nenhuma brisa era apaziguadora e gentil. O outono, indubitavelmente, seria frio; o inverno prometia ser ainda mais.

Apesar da ventania e da temperatura baixa, nada fizera Ophelia e o reverendo George retroceder em seus afazeres cristãos. Enquanto Thomas cuidava da Igreja, pai e filha seguiram à região mais pobre de Hampshire a fim de levar um pouco de conforto aos mais necessitados. Ao lado deles, os gêmeos, Frederick e August, juntaram-se ao grande movimento beneficente. Quando Ophelia, no dia anterior, propôs o programa aos irmãos, Frederick fora o primeiro a aceitar, sem hesitações. August, por sua vez, tentou fugir da ideia, pois não lhe agradava passear por lugares tão lamacentos, humildes e mal-cheirosos.

— A pobreza tem um ar lúgubre.

— A pobreza não é algo a ser idealizado, August, mas também não precisa ser vista com tamanho desprezo — censurou-o Ophelia. — Se somos capazes de ajudar essas pessoas, não vejo por que não o fazer. A utilidade do ser cabe quando este tem a qualidade de oferecer algo ao mundo. O nosso mundo, por ora, está em Hampshire; portanto, aqui devemos servir e ser útil.

Após a bronca, August deu-se por vencido, embora ainda lhe fosse muito sacrificante sair de seu luxo para meter-se na falta dele. Não à toa que, quando chegara ao local destinado, sentiu-se terrivelmente incomodado pelo cheiro e pela aparência das pessoas, que os encaravam com extrema curiosidade. Ophelia e o Sr. Stanhope eram pessoas já conhecidas; mas os gêmeos eram a novidade do momento, então logo despertaram a indiscrição daqueles que não sabiam se comportar com a civilidade imposta do outro lado do condado.

— Que lugar horrível — resmungou August.

— Vai fazer-lhe bem conhecer outra realidade, meu irmão — disse Frederick, pensativo. — Eu mesmo sinto o quanto as diferenças são impactantes, mas, por ser privilegiado e viver na mordomia, pouco caso fazia dessa situação que não me convinha. Agora, aqui, ao verificar tudo com os meus próprios olhos, mensuro as dificuldades e tento trabalhar em minha empatia para com os que não usufruem das mesmas bonanças de vida, como nós dois. Agradecemos, irmão, pelo nosso pão de cada dia; agradecemos por nunca termos passado por dificuldades. E, neste momento — e em outros —, sejamos mais solidários e tentemos ajudar mais, pois temos esse poder sobre nossas mãos.

— Eu agradeço pela vida que levo — rebateu August. — Ainda mais agora, ao conhecer esse lugar.

Frederick constatou que seu irmão não compreendera suas palavras. Às vezes, pensou o rapaz, pessoas como August precisam ter mais experiências para terem conhecimento e entendimento de certos assuntos. Não adianta falar com pessoas que não querem escutar; não adianta dialogar com aqueles que escutam somente o que lhe competem. Por ora, Frederick Blackall contentava-se pelo fato de August estar presente naquele cenário atípico aos dois.

— Venham, meninos — chamou Ophelia, após passarem pelas casas de duas famílias. — Aquela é a casa da Sra. Smith. Papai e eu nos solidarizamos mais com essa pobre alma, pois se trata da única viúva com sete filhos para criar.

Formalmente, o reverendo George anunciou sua visita aos Smith, adentrando a pequena e escura residência de forma cerimonial, como de costume. Atrás, Ophelia sorria às crianças, as quais já conheciam aquele rosto amigável. No entanto, quando Frederick e August surgiram em seguida, as seis crianças esconderam-se onde podiam: duas atrás das saias da mãe, que tinha um bebezinho em seu colo; uma ao lado do reverendo; e as três menores perto de Ophelia. Exceto a bebê Jane, todas as crianças tinham os olhos arregalados para os dois novos intrusos.

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