O sábado festivo tivera seu amanhecer. Ophelia, muito feliz, quase não se atentou às tarefas rotineiras tamanha excitação pela comemoração de mais um ano de vida; justo a vida dela, que parecia tão ínfima e despretensiosa. O último baile que a tivera como destaque fora há dois anos, a fim de mostrar-se à sociedade. E, naquele dia, no mesmo salão de Hampshire, teria mais uma vez uma comemoração. Ophelia não poderia desejar mais nada, pois já havia realizado o bastante.
— Bem — pensou ela, em voz alta. — Ainda pretendo casar-me por amor. Se for com August, aí sim prometo nunca mais pedir nada aos Céus!
Ela riu de sua própria reflexão, visto que, apesar de adulta, percebia que ainda mantinha a menina tola de outrora. Mas, como não criar expectativas, justamente em um baile cujos flertes são estimulados? August prometera-lhe uma dança, e isso já era o suficiente para a Srta. Stanhope sonhar desajuizadamente. Tentava censurar-se pelas estúpidas ideias, porém, seu lado romântico — ainda muito aguçado — gritava-lhe na alma e incitava-a ao ridículo. O amor, deveras, era ridículo.
Quando, pois, a noite preparava-se em seu crepúsculo fantasmagórico, Ophelia, na companhia de sua amiga Georgiana, arrumava-se para a animada ocasião. A Srta. Young, muito elegante e conhecedora das modas inglesa, presenteara Ophelia com um vestido que deveria ser seu, mas, por não conseguir encomendar um novo com tão pouco tempo de preparo, precisou encontrar uma alternativa, já que havia prometido; e os Young sempre cumprem o que prometem. Por sorte, a moça tinha em seus aposentos um vestido novíssimo, preparado há um mês e nunca usado. Às vezes, para satisfazer-se de suas riquezas, Georgiana Young comprava os tecidos mais caros e pedia à costureira criar os melhores modelos. E, nestes tantos trajes, lá estava um perfeito para um baile, e que, indubitavelmente, cairia como uma luva em Ophelia.
— Estou muito mais bonita do que no dia de debutar — sorriu Ophelia, ao ver-se no espelho. Georgiana terminara o penteado, muitíssimo apropriado à veste. — E, com estes brincos, ter-me-ão como uma rica senhorita.
— Ah, mas isso não tenha dúvidas — concordou Georgiana. — Será divertido para pregar uma peça nos oportunistas.
— Será que os Blackall convidaram muitas pessoas que eu desconheço?
— Ainda tem dúvidas? — indagou Georgiana, desdenhosamente. — Eles só vão convidar pessoas que não fazem parte do seu convívio social.
— Assim sendo — levantou-se Ophelia, confiante. —, terei que enganar alguns oportunistas e ver a expressão que farão ao descobrir que sou uma simples filha do reverendo.
— Querida, cavalheiros como esses não merecem nem mesmo a suposição de um flerte. Você é muito superior a eles.
— Não sou superior a ninguém, Georgiana. Sou apenas eu.
— Não imagina como é lindo ser somente você.
— Sempre muito gentil... Comigo, ao menos — riu Ophelia.
— E está ótimo! É a única pessoa que merece minha admiração e meu respeito.
Os Stanhope foram todos ao salão de Hampshire na carruagem disponibilizada pela família de Gardenfield Park. Em uma, foram os cavalheiros: o Sr. Young, o Sr. Stanhope e Thomas; em outra, as damas: Georgiana, a Sra. Katharine, a Srta. Spencer e Ophelia, radiante em seu momento de fineza.
Ao chegarem ao local, puderam escutar o contagiante som saído do salão. Assim que adentraram o ambiente, avistaram as pessoas divertindo-se conforme as suas preferências: jovens a dançar; velhos a jogar cartas; rapazes a tramar suas aventuras; damas a fuxicar. O que Ophelia certificou-se foram os poucos rostos conhecidos; como Georgiana havia cogitado: a maioria eram famílias amigas dos Blackall. Mesmo assim, a moça não se deixou abalar; prometera entreter-se aquela noite. Quanto aos Young, por serem pouco sociáveis — principalmente com os que prepararam o baile —, ansiavam pelo horário da partida.
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Casamento Branco
Historical Fiction[VENCEDORA DO WATTYS2020 | CATEGORIA FICÇÃO HISTÓRICA] Frederick e August Blackall são irmãos gêmeos não-idênticos. Aos doze anos, iniciam aulas particulares com o reverendo George Stanhope, um homem viúvo com três filhos: Thomas, Arthur e a caçula...