Amor em tempos de pandemia

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A melancolia é como a tristeza romantizada ou até uma espécie de contentamento em estar triste, mas o fato é que alguém estava sentindo algo que os clássicos vetustos talvez tivessem melhor definido que vivenciado.

Já há duas semanas, o burburinho das repartições, o alarido dos comércios, a cacofonia dos sentimentos haviam cedido espaço em sua vida para um estupor inicial, que aos poucos tornava-se em tédio e agora tingia de sépia o mundo, as sensações, as vontades e os seres cada vez mais ausentes e distantes, essas imprevisíveis criaturas, as pessoas.

Viver em quarentena deveria ser a antítese de morrer no habitat amplo, mas o óbito das possibilidades, a certeza do distanciamento e o inexorável do imponderável traziam à consciência um torpor que se insurgia contra a esperança, na medida de um mar que circunda um náufrago.

No limbo de sua abulia, fomentava devaneios, que invariavelmente eram suplantados em urgência por dilemas relacionados à subsistência. 
Entre os sobressaltos das prestações que venciam, os insumos que ficavam exíguos e a incerteza que minava a esperança, os afetos transitavam, reféns da situação e dos estragos que o temor ocasiona no ânimo de um nefelibata.

Um silêncio angustiante ribombava em seus tímpanos, a penumbra toldava suas íris gris, sua mente era disputada num solerte embate entre o cochilo e consciência, quando de repente, a tela do smartphone piscou, vibrando num chamado virtual, que parecia mais concreto que a realidade esmaecida.

Num impulso, atendeu ao chamado.

Tudo mais não foi como dantes...

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