Hurricane | Nimulot

Capítulo 1

Estava seguindo o garoto que saía do navio. Nos distanciávamos cada vez mais de lá e entrávamos na floresta. A escuridão era imensa, mas a lua nos ajudava a encontrar um caminho em meio às árvores. O garoto andava correndo, e eu arrumava algum jeito de andar nas pontas dos pés e rápido. Era perigoso e ele não deveria sair só. Por quanto tempo ele estava fazendo isso? Se caminhava com tanta tranquilidade, é porque já tinha vindo antes.

O caminho já estava muito escuro, devido às árvores altas que diminuíam a luz vinda da lua. Mas, logo depois do ponto mais escuro, vi um clarão laranja. O menino correu em direção à luz e eu me aproximei, me escondendo atrás de uma árvore.

Havia um homem sentado no chão, com as costas apoiadas em uma árvore. Ao seu lado, estava um cavalo, e à sua frente, uma fogueira. O homem usava uma túnica escura que parecia familiar. Percival entregou pão e água para o homem, que deu um pequeno pedaço ao cavalo.

- O que você vai me ensinar hoje? - Percival perguntou.

- Por que você não me mostra o que aprendeu até agora? - ele disse, em uma voz falha.

O homem estava à beira da morte. Provavelmente sabia que morreria, mas não queria mostrar ao garoto, que exibia seus movimentos recém-aprendidos com a espada. Enquanto isso, o homem virou seu rosto e olhou nos meus olhos. Me arrepiei e senti meu coração disparando. Era como se ele soubesse que eu estava lá. Seu olhar era como um convite. As lágrimas escuras em seu rosto me lembravam do horror de ver meu povo sendo destruído na minha frente, e eu não ter capacidade de ajudá-los. Me lembrava de como eles haviam sido encurralados e fazia meu sangue se agitar.

Desembainhei a espada e andei rapidamente até a sua direção. Encostei a lâmina em seu pescoço, com toda a fúria que eu tinha dentro de mim.

- Me dê uma razão para não te matar agora. - disse, ferozmente.

- Nimue, não! - Percival disse, correndo em minha direção.

- Eu já estou morto por dentro. - o Monge Choroso disse, baixo.

- Ele me salvou quando os Paladinos tentaram me torturar, e está todo arrebentado por ter lutado contra eles para me salvar! Ele é feérico como a gente. Não o machuque.

Me ajoelhei e fiquei no mesmo nível do homem, ainda com a espada em seu pescoço. Tirei lentamente as espadas da sua cintura, ainda mantendo a guarda.

- Nascido no amanhecer... - comecei.

- Para morrer no crepúsculo. - ele finalizou.

Ele estava gravemente ferido, e eu conseguia ver sinceridade no seu olhar. Também estava vulnerável, não ligando para o fato de eu deixá-lo desarmado. As marcas no seu rosto eram do mesmo tom das marcas que eu tinha nas minhas costas. Aquilo não poderia ser uma farsa, de tão grave o seu estado. E se ele quisesse, já poderia ter feito um massacre no navio. Ele sabia onde todos estavam. Se estava desistindo da vida tão facilmente, é porque não deveria compactuar mais com seus antigos ideais. Mesmo me perguntando se essa era a decisão certa, decidi confiar nele. Se eu o deixasse para morrer ou o matasse, Percival me odiaria pelo resto da minha vida, e eu também.

- Ajude ele, rainha. Ele também é seu povo, e agora está contra os Paladinos. - Percival disse.

E essa frase me comoveu, de certa forma. Agora, me sentia na obrigatoriedade não somente de tirá-lo dali, mas também de tratá-lo.

- Consegue andar? - perguntei.

Ele fez que sim com a cabeça. Ofereci minha mão, e ele se levantou com alguma dificuldade. Deixei com que ele se apoiasse em mim, mesmo tornando a caminhada muito mais árdua. Seu corpo era pesado e o caminho era escuro, mas Percival andava na frente com uma tocha improvisada. Chegando ao porto, pedi que ele entrasse primeiro abrindo caminho até uma sala vazia. O homem se sentou em um caixote com alguma dificuldade, e eu abri sua camiseta para averiguar a situação.