POV Galahad
Talvez vocês estejam se perguntando o que aconteceu depois que o meu pai voltou para casa. A verdade é que eu não lembro muito bem desse dia, nem do que acontecia antes dele. Mas eu posso dizer que meus pais eram ótimos, e eu conseguia ver o amor deles um pelo outro através dos seus olhares. De certa forma, desejava que um dia algo assim acontecesse comigo.
Meu pai nunca mais saiu de casa por tanto tempo, e se precisava viajar, costumava levar todos nós junto. Eles tinham pequenas brigas, como qualquer casal, mas não passavam mais do que alguns dias sem se reconciliarem e encherem a casa de alegria novamente. Tal amor se manifestou em mais quatro repartições: Verena, Maeve, Meredith e Cedrik.
Verena, depois de mim, era a mais velha. Tinha cabelos bem escuros e lisos, era um pouco pálida e adorava vestidos e joias brilhantes. Dizer que brigávamos muito era um elogio, considerando a sua personalidade forte. Odiava passar os dias debaixo do sol, ao contrário de todos nós. Gostava de ler, e era extremamente calculista.
Maeve era a filha do meio, e a mais curiosa. Não ligava para coisas brilhantes, e raramente se arrumava para alguma festa. Passava a maior parte do tempo lendo os grimórios do nosso avô e praticando os feitiços que ele a ensinava. Era um pouco rebelde, e se ninguém prestasse atenção, iria se aventurar em algum riacho próximo e só voltaria toda ralada no fim do dia.
Em seguida vinha Meredith, que era só uma criança. Para ela não importava o quanto eu estivesse cansado, ela sempre me puxaria pelo braço para levá-la para brincar na floresta. Talvez por ter nascido quando eu já era bem mais velho, me sentia na responsabilidade de cuidar dela, e acabava aceitando. Era fácil de fazê-la rir, e eu sempre tirava proveito disso.
O mais novo era Cedrik, que tinha nascido há apenas algumas semanas. Ele chorava muito, como qualquer bebê. Era isso que eu podia dizer sobre ele.
- Galahad, se despeça de Cedrik. Ele não pode sair lá fora, vai pegar friagem. - meu pai disse, balançando Cedrik em seus braços.
Hoje era um dia especial, em que eu entraria na Caçada, assim como meu pai fez. Estava ignorando os conselhos de todos enquanto fazia isso, mas era como uma espécie de missão, e tudo tinha começado há alguns anos atrás, de uma maneira que para mim tinha sido no mínimo, cômica.
Estávamos todos na sala da Távola Redonda. Verena estava brincando com Maeve pelos corredores, enquanto meu pai e mãe conversavam com Arthur. Me sentia cansado e acabei sentando na cadeira mais próxima, sem ter ideia que era a cadeira do escolhido e que eu poderia morrer apenas sentando nela. Minha mãe veio correndo me tirar de lá, sendo que eu não entendia nada. Mesmo meus pais demoraram muito para processar, e depois me explicaram.
No ano passado, tinha conseguido tirar uma espada que estava presa numa rocha há muito tempo. Para Arthur, isso era um sinal de que eu era o melhor cavaleiro que ele já tinha visto, já que nenhum outro conseguiu fazer o mesmo. Era impossível fugir da Caçada depois de ter todos contando comigo. Sentiria falta de todo o conforto daqui, mas era uma missão traçada desde o meu nascimento.
Lancelot entregou Cedrik para Maude, e saiu em seguida. Maude tinha a mesma idade que eu, e há alguns anos, estava sendo vendida como escrava. Minha mãe não deixou que isso acontecesse, pagou sua dívida e ela começou a nos ajudar na organização do castelo. Depois de ganhar confiança, passou a cuidar apenas das crianças. Era a única que conseguia prestar atenção em Maeve, brincar com Meredith e acalmar Cedrik, enquanto nossos pais estavam ocupados com outros assuntos. Além disso, as crianças gostavam tanto dela que a chamavam de "tia Maude".
Caminhei até Cedrik, que estava sendo coberto e colocado em seu berço. Sabia que ele não entenderia nada do que eu dissesse, mas falei que ele cresceria forte e que eu voltaria logo. Fiz algumas cócegas no pescoço dele, e sua risada preencheu o quarto.
Quando estava prestes a sair do quarto, senti uma mão puxando meu pulso, me chamando a atenção.
- Espere! - a voz feminina disse.
Me virei, dando de cara com Maude. Ela parecia um pouco apreensiva, com o seu olhar inseguro, que não costumava se encontrar com o nosso por muito tempo. Percebi que ela se aproximava de mim, trazendo o seu rosto cada vez mais perto do meu. Me arrepiei, imaginando o que poderia estar por vir.
Seus lábios se juntaram aos meus, num beijo que eu esperava há tempos. Ela tinha sido meu primeiro desejo, mas nunca tinha conseguido tocá-la. Com toda a sua mansidão ela recuava, e eu não insistia mais. Nos afastamos e ela corou, na sua expressão mais fofa e satisfeita possível.
- Por que demorou tanto tempo? - perguntei.
- Porque você é o príncipe. Se quisesse, poderia ter feito de tudo comigo.
- Eu jamais faria algo que você não quisesse.
- Você é um cavalheiro, Galahad. Com certeza vai se casar com uma princesa no meio do caminho e nunca mais vai voltar.
- Talvez seja você que acabe se casando com um príncipe.
Ela sorriu, olhando para o chão, como sempre fazia quando a elogiávamos.
- Cuide bem dos meus irmãos.
- Eu vou. Boa viagem, Alteza.
Sorri, e segui caminho. Minha família me acompanhou até perto do navio, onde paramos para nos despedir.
- Verena... - comecei. - Você sabe que muitas responsabilidades vão passar para você agora, mas eu acredito em você.
- Tome cuidado, seu cabeça oca. - ela disse, me abraçando. - Eu não quero virar a irmã mais velha pra sempre.
- Não vou te dar esse prazer tão cedo.
Ela revirou os olhos, mas me desejou uma boa viagem. Em seguida falei com Maeve, que me fez prometer escrever sobre todas as cidades que eu passasse. No caso de Meredith, a expressão de tristeza no seu rosto conseguia comover qualquer um. Tive que a segurar no colo e lembrar que ela ainda teria tia Maude e um novo irmão para brincar, o que pareceu funcionar rapidamente.
- Filho... - minha mãe disse, segurando meu rosto com as duas mãos. - Não se envolva com as pessoas erradas e sempre escreva para nós. Vamos ficar esperando por notícias suas.
- Pode deixar, mãe.
A abracei e fui me despedir do meu pai, que me olhava orgulhoso.
- Tenho certeza que você vai trazer orgulho para todos nós. - ele disse, me abraçando. - Se precisar de alguma coisa, Percival vai te ajudar.
- Certo. Acho que agora é hora de seguir em frente.
- O mundo te espera.
Vi as cinco figuras ficando cada vez mais distantes, enquanto eu me aproximava do navio. Dava um certo frio na espinha ver aquela construção enorme, mas eu estava empolgado. Era hora de viver a minha própria vida, e a minha própria aventura.
***
Muito obrigada por toda a interação de vocês com a história, ela me inspirou demais a continuar escrevendo não só essa, mas outras histórias também.
Sei que eu não costumo responder muitos comentários, e que a interação de leitor e autor é bem interessante, então prometo responder tudo o que vocês perguntarem ou comentarem por aqui.
Gratidão!
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Hurricane | Nimulot
Fiksi PenggemarLancelot, antes um guerreiro dos Paladinos, se junta à Nimue e seus aliados. Mas, será que a ligação de ambos poderá sobreviver à guerra que libertará os feéricos? Atenção: é necessário ter terminado de assistir a série "Cursed - A Lenda do Lago" p...