Saímos em direção ao castelo pela manhã, ao ponto que víamos o Sol nascendo no horizonte. Tentamos interpretar aquilo como um bom sinal, imaginando que os Deuses estavam ao nosso lado.
Nosso grupo ficou à espreita atrás de algumas rochas, observando cada passo de Arthur. Eu era bem familiarizada com a sua capacidade de persuasão e habilidades de causar um motim, mas ainda estava apreensiva com seu papel nessa missão.
A primeira parte já havia dado certo: Arthur havia sido carregado para dentro pelos guardas, mas sua missão começava a demorar mais do que imaginávamos. Esperamos muito tempo, e os guardas permaneciam fixos em seus lugares, distante do que tínhamos planejado. Não ouvíamos nenhum barulho e não recebíamos nenhum sinal, até que uma mulher desconhecida começou a acenar com um pano vermelho em uma das janelas. O nosso código para atacar era um pano branco.
- O que isso significa? - Guinevere perguntou, claramente preocupada.
- Algo deu errado. Vamos precisar invadir. - respondi.
Merlin imediatamente reuniu um grupo e cavalgou até o castelo, como se fosse se render. Enquanto ele chamava a atenção de todos os guardas, eu, Guinevere, Lancelot e Morgana corremos até os fundos do castelo, por onde a garota nos jogou uma corda para subirmos até uma das torres.
A garota estava agitada, beliscando as pontas dos dedos e tremendo. Não estava ferida, mas parecia estar horrorizada com algo. Tinha cabelos curtos e escuros, era um pouco pálida e parecia ser muito jovem.
- Todos os presos foram soltos e estão correndo pelo castelo, mas o aliado de vocês foi capturado. O Rei suspeita que ele esteja trabalhando com os feéricos. - ela disse, gaguejando um pouco.
- Onde ele está? - Guinevere perguntou.
- Uma sala do subsolo. - a garota respondeu - Posso levá-los até lá.
Descemos correndo aquelas escadas, às vezes esbarrando nos fugitivos que corriam pela sua liberdade. Alguns guardas estavam mortos, estirados pelo caminho, e outros avançavam até nós. A garota ficava horrorizada em ver tanto sangue espalhado, e resolvi me aproximar dela.
- Qual é o seu nome? - perguntei.
- Enid. - ela disse, em voz baixa.
- Quantos anos você tem, Enid?
- Onze.
- Não olhe para as espadas e os corpos, olhe para o fim do caminho. No próximo amanhecer você não vai lembrar mais disso.
Chegamos até um corredor com uma grande porta no final, vigiada por vários guardas. Esperei com Enid, enquanto os outros lidavam com os guardas e invadiam a sala. Sentia dó pela garota, que definitivamente não deveria ver uma cena dessas tão jovem.
Entramos na sala e encontramos Arthur com diversos ferimentos. Ao seu lado, vários instrumentos de tortura. Tinha imaginado o pior, mas não havia cogitado que isso pudesse realmente acontecer. Guinevere o ajudou a se levantar, enquanto ele gemia de dor.
- Arthur, eu sinto... - me apressei em dizer, mas ele me interrompeu.
- Eu assumi esse risco bem no início, e vocês felizmente chegaram a tempo. Uther vai fugir do castelo, precisamos correr se quisermos pegá-lo. - ele respondeu.
- O que é aquilo? - Enid perguntou, apontando para alguns instrumentos ao lado de Arthur.
- Acho que somos muito sortudos para saber disso. - ele respondeu.
- Morgana, saia do castelo e leve Enid até Kota. Ela vai levá-la até o navio, as coisas podem ficar selvagens por aqui. - pedi.
- Da última vez que eu deixei meu irmão sozinho, ele quase foi torturado! Não vou sair daqui de maneira alguma! - ela disse, indignada.
- E você não poderia ter feito nada para impedir. É mais útil você proteger uma garota do que um homem adulto que sabe se defender.
- Eu levo a garota. É mais fácil eu voltar para o castelo do que Morgana. - Lancelot disse.
Assenti com a cabeça, depositando toda a minha confiança nele. O resto de nós subiu as escadarias novamente, entrando em cada sala à procura de Rei Uther. Finalmente o encontramos, fugindo com a ajuda de alguns guardas, que Guinevere e Morgana rapidamente detiveram. Me escondi atrás de uma parede, sabendo que minha cabeça valeria tudo para Uther. Não era a primeira vez que nos encontraríamos, e eu sabia que ele não tinha muita simpatia por mim. O Rei os convidou para irem até uma sala, onde eu fiquei do lado de fora, ouvindo toda a negociação.
Todo o deboche e ironia em suas falas me dava nojo. Ele duvidava de cada palavra de Arthur, me levando até a questionar se o que Morgana tinha dito era verdade. Seu poder de manipulação era inegável. O Rei se tornou flexível apenas ao ouvir Arthur dizer o nome de sua mãe: Gaheris.
- Talvez eu tenha conhecido uma Gaheris em certo ponto da minha vida. E eu preciso admitir... ela era a cara da sua irmã. Eu ficarei muito feliz em te colocar na linha de sucessão, meu filho. Por que não me traz uma caneta, que você encontra na sala ao lado?
Estranhei o pedido, mas relevei. Arthur saiu da sala, e depois de alguns segundos, ouvi espadas sendo desembainhadas e Guinevere gritando com o Rei. Imediatamente entrei na sala, temendo que algo pior acontecesse. Guinevere segurava uma espada no pescoço de Uther, que já estava desarmado. Arthur entrou logo em seguida, e Uther gargalhou, em tom de deboche.
- Que time mais incrível que meu filho trouxe! A irmã-viúva, a pirata que é uma gracinha, a Bruxa de Sangue de Lobo e o Monge Choroso? - ele disse, e só nesse momento percebemos que Lancelot estava de volta - Ouvi dizer que os Paladinos sentem a sua falta... mas é seu dia de sorte, querido, a cabeça da Bruxa em um prato com certeza vale o seu perdão.
- Me chame de gracinha de novo e eu corto a sua garganta para fora. - Guinevere respondeu.
- Vocês não estão em posição de barganha. Devo dizer que o plano me impressionou, então eu lhes cedo uma honra: se hospedem aqui no castelo, por tempo indeterminado, e festejem a coroação do meu filho.
- Não viemos para ser seus prisioneiros. - respondi.
- Nem para me matar. Vocês sabem que eu tenho uma aliança com os Paladinos. Mas se vocês desconfiam tanto da minha gentileza, podem ficar apenas para o jantar. Não devem ter vindo de tão longe apenas para que eu assine um papel.
- Com uma exigência. - disse Arthur.
- Qual, meu filho?
- Sem guardas.
- Que seja, sem guardas. Mas eu ficaria bem decepcionado se vocês atentassem contra a minha vida. Vocês não durariam uma semana aqui, se eu morresse.
Ele tinha razão, por mais que eu odiasse admitir. No fim das contas aceitamos o convite, imaginando que Arthur teria algum plano. Esse jantar seria como um jogo de estratégia: o mais sorrateiro levaria tudo.
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Hurricane | Nimulot
FanfictionLancelot, antes um guerreiro dos Paladinos, se junta à Nimue e seus aliados. Mas, será que a ligação de ambos poderá sobreviver à guerra que libertará os feéricos? Atenção: é necessário ter terminado de assistir a série "Cursed - A Lenda do Lago" p...