O barulho abafado da música reverberava nos meus tímpanos enquanto Anthony me puxava para fora de uma das cabines do banheiro, com uma cara preocupada. Mas eu também ficaria desse jeito se meu melhor amigo estivesse bêbado e chorando escondido num banheiro de festa após vomitar no garoto que tinha acabado de beijar.
No momento eu não me perguntei como ele havia me encontrado naquele lugar lotado de pessoas, a única coisa que me preocupava agora era meu ego destruído. Isso era cem por cento patético.
Meu estômago revirava e doía, e a cada segundo que passava eu me arrependia de ter bebido tanto. Entretanto não havia muito que pudesse fazer, a não ser tentar me lembrar de nunca mais, sob hipótese alguma, fazer aquilo novamente. A minha cota diária de humilhação pública já estava completa por hoje.
Anthony segurou meu pulso, me empurrando para fora do banheiro e me guiando por entre toda aquela multidão eufórica, que cantava e dançava ao som de alguma música ruim do David Guetta que não me lembrava muito bem o nome. Todo esse barulho fazia minha cabeça doer ao ponto que achei que fosse acabar explodindo. Mas antes que isso acontecesse, chegamos do lado de fora da festa, ao ar livre.
Estava de noite, deveria ser mais de duas da madrugada e tinha certeza que a ressaca no dia seguinte seria mil vezes pior do que assistir o último episódio da série Game of Thrones. E pensei em pedir para meu chefe me deixar ausente de alguns compromissos até que conseguisse me recuperar fisicamente e psicologicamente dessa noite.
Caminhamos até a rua, e nos sentamos no meio-fio da calçada, sem dizer absolutamente nada. Mas com Anthony o silêncio nunca era constrangedor ou chato, era só silêncio, sem nada demais. Encarei as estrelas, brilhando fraco por entre as nuvens de um céu noturno sem Lua, me lembrando das vezes que eu era criança e ficava às observando durante horas na varanda da casa de meus pais.
Eram bons tempos.
- você está bem?- Anthony perguntou baixinho, me entregando uma garrafa d'água que trazia consigo.
- aham, estou - menti, tirando a tampinha da garrafa e bebendo seu conteúdo em longos goles, tentando tirar aquele gosto amargo da boca - não foi nada.
- o que aconteceu? Por que estava escondido lá então?- ele insistiu em questionar, sempre curioso.
- praticamente acabei vomitando no garoto que eu estava ficando, se quer saber tanto assim - respondi automaticamente, sabendo que era impossível manter qualquer segredo a salvo dele por muito tempo - pode me zoar, se quiser.
- eu nunca ia te zoar!- ele disse, e revirei os olhos.
- até parece - falei sarcástico.
- é verdade, quando o assunto é sentimentos eu sou bastante sério, pode acreditar - Tony comentou, passando os dedos pelos fios encaracolados da barba, desviando o olhar.
- tão sério que sua primeira vez foi no banco de trás de um Celta prata no meio do mato, com um cara que você nem se lembrava do nome três dias depois!- retruquei, rindo ao me recordar da história toda - e nem pense em dizer que você estava bêbado, porque eu sei que estava bem sóbrio!
- porra, isso daí não conta! Foi golpe baixo - ele também riu, me dando um leve empurrão no ombro, ficando vermelho de vergonha - e qual é o problema de não me lembrar do nome dele? Foi ótimo, e é isso que importa. Se eu fosse tentar me lembrar do nome de cada pessoa que já fiquei nessa vida...
- às vezes você me surpreende!- bradei, facilmente imaginando uma lista de uns quatrocentos metros com os nomes de todos os garotos que Anthony já conheceu.
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Desconstruindo Detroit
RomanceUma noite chuvosa, um táxi amarelo e uma mala com somente o essencial e seu violão. Era tudo isso que Bright tinha ao embarcar rumo para o lugar mais longe possível de suas aflições em Nova York e, principalmente, da sua banda. Detroit era como uma...