A chuva se transformou numa tempestade durante o decorrer da madrugada, e mesmo distante ainda conseguia escutar o som dos trovões e ver o brilho dos relâmpagos entrarem pela janela em meio a escuridão do quarto.Quando eu era pequeno, toda vez que chovia achava que o céu ficou triste e estava chorando. As longas horas que fiquei na janela da sala da casa de meus pais observando o temporal, enquanto minha mãe preparava chocolate quente, eram um dos meus momentos favoritos. Sinto falta dessa época. Mas ainda fico me perguntando o que seria capaz de fazer o céu chorar (caso fosse possível).
Acordei com o barulho das gotas de chuva batendo contra o vidro da janela do quarto, que me permitia ver as nuvens cinzas que cobriam o Sol numa manhã fria de terça-feira. Tentei levantar e imediatamente senti algo pesado sobre meu peito. Win estava ali, dormindo profundamente. Deitado de bruços em cima de mim, com o rosto escondido na curva do meu pescoço, com sua respiração fraca se chocando em minha pele. Não ousei me mexer, e por um instante fiquei confuso, eu não tinha ido dormir no meu próprio quarto na noite passada?
Flashes de ontem povoaram a minha mente, e logo me lembrei de tudo que aconteceu depois que saímos do bar. Lembrei da chuva, da sensação da mão de Win entrelaçada à minha, e de quando nós chegamos ao prédio, cambaleando de cansaço e tontura por causa da bebida.
Esperamos o elevador, e foi bem difícil conseguir apertar o botão do décimo andar quando sua visão não para de girar. Pelo menos acertar a chave no buraco da fechadura da porta foi até que bem fácil. Win esbarrava por todos os cantos do apartamento enquanto murmurava coisas sem nenhum sentido, parecendo meio desorientado. Tive que o guiar com toda a paciência possível até o seu próprio quarto, com cuidado para que nem ele e nem eu (que também não estava numa das melhores situações) acabasse derrubando algo ou tropeçando.
Win se jogou exausto na cama, sem forças nem ao menos para trocar de roupa. Fiquei um tempo o observando, para ter certeza de que ele estava bem e não precisava de nada, um remédio para dor de cabeça ou um copo d'água, por exemplo. Peguei um cobertor no armário (que, por incrível que pareça, tinha estampa de cenoura), o abri e cobri Win, que estava praticamente quase hibernando ali. Respirei fundo, com uma coragem que não sei de onde veio, me aproximei e me acomodei debaixo das cobertas, deitando ao lado dele.
- o que está fazendo?- ele perguntou num resmungo tão embolado que nem sei como consegui entender.
- vou dormir aqui- respondi, com um sorriso.
- folgado - Win deu risada, ainda estando com os olhos fechados - você por acaso sabia que existe algo chamado espaço pessoal?
- então esse tal de espaço pessoal não existiu lá no táxi quando você estava dormindo apoiado no meu ombro, né?- retruquei com uma voz irônica - se quiser que eu vá embora, é só falar.
- não...- Metawin sussurrou, bocejando e ficando mais perto de mim, perto o suficiente para que eu sentisse seu perfume e escutasse sua respiração pesada - pode ficar.
E eu fiquei.
Então resumidamente, foi assim que acabei acordando no quarto de Win, com ele dormindo em cima de mim a sono solto após uma noite de bebedeira com os amigos.
A chuva continuava a cair do lado de fora, aos poucos ganhando intensidade e voltando a ser a mesma tempestade que se formou durante aquela mesma madrugada. Apesar da minha cabeça doer por causa da famigerada ressaca, não tive vontade de me levantar. Afinal, qual é a probabilidade científica de conseguir dormir agarradinho com seu crush? Acho que é bem pequena, então deveria aproveitar o momento, não é mesmo?
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Desconstruindo Detroit
RomanceUma noite chuvosa, um táxi amarelo e uma mala com somente o essencial e seu violão. Era tudo isso que Bright tinha ao embarcar rumo para o lugar mais longe possível de suas aflições em Nova York e, principalmente, da sua banda. Detroit era como uma...