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Nikolai:

Voltei para o quarto ainda irritado, pensando em como eu poderia fazer para corrê-lo de meu quarto. Ele estava falando com alguém ao telefone, que língua ridícula é essa? Ele ria, cheguei a encolher os ombros de irritação. De onde saiu esse cara? Tirei os sapatos, as calças, coloquei minha calça pijama e joguei meu sobretudo na cadeira no canto junto do suéter, catei minha camisa de dormir, aumentei os graus do aquecedor do quarto, e fui pra minha cama sem nada a lhe dizer. 

-Desculpe! -murmurou ele. - Era minha mãe.

-Não me importo! -falei virando pro outro lado. 

-Boa noite! -disse ele se levantando. 

Voltei a me virar irritado desliguei a luz do meu abajur e ele estava nu na frente da cômoda, suas costas tinham mais músculos que minha barriga, imagina como não será sua barriga, ele amarrou uma tolha na cintura e foi pro banheiro. Quem em sã consciência toma banho com esse frio a essa hora da noite?

Fechei os olhos tentando dormir, mas o cara me irrita tanto a ponto de tirar isso de mim. Mas que porra de aquecedor. Levantei-me furioso para aumentar mais os graus daquela porra e ao me virar me dou de cara com ele de cabelo úmido pingando sob o peito nu, a luz do abajur dele deixava sua pele mais escura. Engoli em seco sentindo uma queimação no meu peito.

-Posso consertar se quiser!

-Vai levar um choque! -rosnei e voltei para minha cama. Encolhendo-me o máximo que consegui. 

Esperei ouvindo todos os movimentos sussurrados dele, parecia não querer fazer barulho, então ouvi o movimento da cama dele ao lado da minha. 

-Durma bem! -sussurrou.

Jamais ninguém disse algo assim pra mim, nunca me desejam isso, meus olhos arderam e os apertei com força pra não lacrimejar. 

. . . 

Pela manhã meu despertador toca, e tiro um braço pra fora da coberta pra desligar, sentindo o frio nos dedos me queimar, tirei os olhos primeiro, eu faço um ritual de congelamento, sorri com a idiotice, meus dentes doeram com o frio e apertei minha boca. Esqueci que eu tinha companhia, olho pra quele cara esparramado, com uma perna pra fora da manta, o braço sob os olhos, ele dorme sem camisa? ele deveria ser estudado, como pode alguém aguentar?

-Você tá morto? -perguntei sem pensar, ele não se mexeu, adrenalina percorreu meu peito com medo de que realmente ele estivesse morto, dei um empurrão no braço dele sentindo-o quente.

-Oi, oi! -disse ele desnorteado. -O que ouve?

-Achei que estivesse morto! -falei enfurecido.

-Desculpe eu durmo como pedra, pelo menos é o que minha mãe diz.

Minha ''mãe'' pra cá, minha ''mãe '' pra lá, vai se fuder, peguei minha toalha com relutância, aproveitando o calor da adrenalina e da fúria que ainda me aquecia, fui tomar banho, que arrependimento, estava tão frio do lado de fora que eu não queria sair da água quentinha, não vejo a hora do verão chegar. 

Me vesti aos pulos no banheiro. Quando sai ele estava usando um moletom de primavera e uma calça jeans preta rasgada nos joelhos, coloquei meu suéter e o sobretudo, cachecol e um par de luvas para atravessar o corredor congelado. 

-Está indo tomar café?

-Hurum!

-Posso ir junto, não sei onde fica, é só por hoje prometo!

Dei de ombros, fui sair e o olhei de cima a baixo, vai morrer de frio esse imbecil, para minha surpresa ele tirou um par de luva do bolso canguru, luvas vermelhas chamativas, com pelo saindo das bordas, por que eu estou o observando? Sai do quarto e o frio me açoitou. Rosnei para o frio irritante. Ele manteve a caminhada a meu lado, esfregou uma mão na outra com as luvas e quando dobramos o corredor ele começou a brincar com o ar de sua respiração que condensava diante de si, eu escondia até meu nariz no cachecol. 

-Você não gosta muito do frio não é mesmo?

-Não, já você deve ter pacto com o demônio por não sentir frio! -Resmunguei.

Ele riu, uma gargalhada doce que me tirou do sério.

-Desculpe, você foi engraçado.

-Devo ter cara de palhaço.

-Ei, desculpe. -Não respondi. - Eu só nasci numa cidade fria, num estado frio, lá só não tem neve, mas o dia de hoje é um dia normal lá pra mim, frio mesmo pra por roupa pesada só quando tem vento, aí sim é de cortar a alma, seus dentes parecem que vão quebrar.

-Não quero nem conhecer esse lugar! -comentei, por que estou me dando o trabalho de responder?

-Fica no sul do Brasil!

-Quê? Mas lá não é a terra do calor o ano todo?

-Não no Rio Grande do Sul, na cerra gaúcha tem as temperaturas mais baixas do Brasil, o calor é só para o norte do estado, mas tem uma coisa, os invernos são frios, mas os verões são de morrer de calor.

-Humm!

Entramos no refeitório.

-Que lugar lindo, me sinto entrando no salão comunal de Hogwarts.

Ótimo, uma criança de colega de quarto, era só o que me faltava.

-Ali você se serve e pode se sentar em qualquer lugar. -Apontei.

-Ah, tá bem, obrigado!

Muitos nos olharam quando entramos juntos.

-Bom dia pessoas! -disse ele em alto e bom tom, meu rosto parecia uma chama viva de tanta vergonha alheia que fiquei. 

Algumas pessoas responderam, principalmente umas garotas, baixei a cabeça e segui para pegar uma bandeja enquanto ele foi se apresentar a quem lhe deu bom dia. Garoto estranho pra caralho, espero que não grude em mim. Tomei café enquanto ele conversava de mesa em mesa se apresentando, o idiota vai perder a hora do café. Levantei colocando as sobras no lixo e a bandeja no carrinho, agradeci o café ao passar pelo refeitório e fui pro trabalho. 

-Bom dia Nikolai! -disse o senhor Homer.

-Bom dia senhor. - Pendurei meu casaco e coloquei o avental de trabalho. -Parece animado.

-E estou, veja só estas belezinhas!  -Ele tirou discos que não reconheci.

-De onde são?

-Do Brazil, estou doido para ouvi-los. -Ele tirou uns quantos juntos e os colocou no balcão. -Coloque-os para tocar, tem de várias regiões do país.

-Tem do Sul?

-Humm. . . deixe-me pesquisar aqui na internet! -disse ele indo pra trás do balcão enquanto eu achava lugar nas prateleiras para pôr os discos. 

-Vai me mostrando ai! -disse ele. Fui mostrando as capas. -Esse aí é, esse outro também, esse não, esse não . . .

Por fim tinham seis discos, todos com músicas de vários artistas. Coloquei um deles pra tocar, gostei da melodia de algumas, a maioria muito alegre, por isso o garoto tinha aquele sorriso, era terra de gente alegre. 

-Vou sair buscar algo para a gente comer Nikolai, volto em seguida.

-Está bem. 

o sininho na porta tilintou quando ele saiu, fiquei arrumando os discos, eram poucos os fregueses que iam durante a semana, o movimento mesmo era sexta e sábado. Comprei um deles para mim.  

Quando seus olhos me encontramOnde histórias criam vida. Descubra agora