021 - Dont cry for me

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— O-O que? — Encarou-me incrédula. — N-Não estou entendendo, Harry. Está terminando comigo? — seu choro se intensificou, ao ponto da menina se levantar e me dar as costas trêmula por conta dos soluços involuntários que soltava.

Respirei fundo. Será que tinha sido uma boa ideia?

— Eu não quero que você sofra, Grace. E é isso o que vai acontecer! Se pararmos de nos envolver agora irá doer menos quando eu for embora. — Argumentei enquanto Grace apenas se negava a me ouvir.

Teimosa!

— Mentira! — Sussurrou virando-se, deixando seu rosto vermelho e molhado pelo seu choro desenfreado. Passei a mão em meu rosto com força arrependendo-me de ter tomado aquela decisão. — Só eu sei o quanto vai doer, você não sabe de nada, Harry. Fica aí com essa pose de sabichão, como se soubesse tudo da vida, você não sabe! — Soluçou enquanto lágrimas caiam sem parar de seus olhos cristalinos. — Nada que fizer vai fazer doer menos, porque eu vou continuar a gostar de você e sentir a sua falta!

Neguei com a cabeça afundando meu rosto em minhas próprias mãos. Eu não a via, porém ainda podia ouvir seu choro baixinho, queria poder me desligar daquele momento, desejei simplesmente sumir daquele quarto somente para não ter que lidar com aquilo.

Eu sabia que a faria sofrer, desde o início tinha ciência que estava brincando com os sentimentos de Grace. Mas eu não dava a mínima, não me sentia capaz de sentir remorso pelo que estava fazendo com ela, eu pensava que ela merecia ser enganada pelo simples fato de vê-la como inimiga, assim como via Juliet e todos os soviéticos. Mas não, Grace não merecia! E eu só estava me dando conta do estrago que fiz com alguém totalmente inocente naquela hora.

Planejava fazê-la se apaixonar perdidamente, ao ponto de tê-la rastejando aos meus pés, fazendo o que for preciso para me ajudar a fugir dali sem ao menos perceber. E funcionou! Eu já tinha o que precisava, Grace tinha feito até mais do que eu esperava! Mas a que preço? O que era aquela vitória que me fazia sentir péssimo?

Levantei o rosto observando-a sentada num canto. A cabeça escondida entre os braços cruzados sobre as pernas dobradas, encolhida, debulhando-se em lágrimas. Achei que seria fácil, apenas sair daquela casa escondido, sem sequer olhar para trás, nunca mais voltar. Não a veria naquele estado, quando percebessem que eu tinha desaparecido, estaria bem longe dali, tão longe que não escutaria seu choro muito menos me molharia com suas lágrimas.

Infelizmente tive a ideia estúpida de sair do planejado.

— Grace. — Chamei sendo completamente ignorado. — Olha para mim. — A menina apenas negou com a cabeça enquanto seu abdômen se movimentava rápido por conta dos soluços que ela ainda soltava. — Por favor, Grace, olhe para mim.

Seus olhos azuis e vermelhos focaram-se nos meus. Meu coração doeu por um instante ao notar o inchaço que tinha envolta deles.

— Não chore por mim, querida...eu não mereço. — Sorri amargurado. — Não chore, nem mesmo quando eu partir, quem irá sair perdendo sou eu. Você é alguém incrível que me deixou fazer parte da sua vida. Eu não sou nada, Grace. Não me ache melhor por uma vida amorosa agitada, foram apenas experiências vazias. Nem se impressione por eu ser um piloto, carregar bombas e soltá-las sob as cabeças de outros homens não é algo que eu deveria me orgulhar. — A loira apoiou o queixo no braço e me ouviu calada, eu ainda tinha o mesmo sorriso amarelo nos lábios. Ouvir verdades já machucava, mas fala-las em voz alta doía muito mais. Sentia minha garganta queimar. — Aprendi isso com você. Sei que acha que não tem nada a ensinar, mas não é verdade. Se eu tivesse ao menos metade da sua caridade, da sua doçura, se eu fosse um pouquinho igual a você...Eu mereceria que derrubassem algumas lágrimas por mim.

Grace se levantou de onde estava e veio em minha direção. Me abraçou tão forte que foi capaz de me arrancar as lágrimas que eu segurava. Se fosse qualquer outra, iria embora, me daria as costas ou talvez até me entregaria para Juliet como vingança por eu querer terminar. Mas ela não. Estava lá com os braços envolta de mim consolando-me.

Eu queria muito poder contar a Grace que iria fugir, contar a verdade. Mas sabia que seria mil vezes pior deixá-la saber que foi tudo um teatro para usá-la em meus planos. E eu não queria e nem iria machuca-la mais, bom, pelo menos até a minha fuga.

— Não diga isso. — Murmurou ainda me abraçando. Meus braços envolta de sua cintura a puxaram para meu colo, eu ainda tinha minha cabeça deitada em seu peito ouvindo seu coração bater descompensado. — Não é verdade, Harry, você é maravilhoso, — fungou separando-se de mim, seus olhos me analisaram devagar e ela soltou um pequeno sorriso em meio a lágrimas. — por dentro e por fora. Você me ensinou tanto que nem ao menos imagina, nunca vou me esquecer do que vivemos juntos. Por isso que eu acho que essa foi a maior besteira que você já me disse. — negou veemente com a cabeça. — Eu não vou sofrer menos se terminarmos antes de você ir, pelo contrário, vou sofrer se não aproveitarmos o pouco tempo que nos resta juntos. — Encostou nossos narizes brevemente.

Selei nossos lábios devagar, pude senti-la suspirar de puro alívio contra minha boca. Segurei sua cintura com firmeza, para mostrá-la que estava ali. Por enquanto ainda estava. Decidi que era melhor seguir com o plano e não dar mais bolas foras.

— Tem toda a razão. — a beijei novamente. — Eu só estava pensando num jeito de não te fazer sofrer, Grace, não gosto de te ver chorar. — acariciei seu rosto.

— Você tem me feito sorrir há tantos dias. Harry, antes de você chegar aqui eu vivia triste pelos cantos pensando nos meus pais e me lamentando por não poder fazer nada. — encolheu os ombros. — Você me faz muito feliz.

Encostou seu rosto no meu e ficamos daquele jeitinho por um tempo, apenas aproveitando o calor do momento. Grace chegou a fechar os olhos de tão relaxada que estava. Encarei a porta me dando conta de que alguém poderia entrar.

— Estamos nos arriscando demais ultimamente, não? — murmurei ainda passando a mão distraidamente pelo seu corpo.

— Uhum. — Murmurou preguiçosamente, sem ao menos se mover, arrancando um riso meu. — Está tão bom ficar assim com você que eu queria que o tempo parasse.

Ah, o poder de controlar o tempo. Eu também tinha aquele desejo. Enquanto muitos prefeririam saber voar, ou ficar invisível, eu me contentaria apenas com poder parar todos os relógios do mundo, impedir o dia de virar noite, paralisar as pessoas nas ruas, os soldados na infantaria, nos ares e no mar. Eu aproveitaria aquele dom para fugir, é claro. Mas Grace tinha uma opção mais romântica.

— Mas já vou indo. — saiu do meu colo andando em direção ao banheiro. — Acho que não dá para perceber que andei chorando, ou da?

Dava sim. Sua pele era muito pálida, seu rosto ainda estava avermelhado por suas incessantes tentativas de secar as lágrimas. Seu nariz ainda estava vermelho na ponta, e seus olhos ainda pareciam irritadiços.

— Sinceramente? Sim. — A loira respirou fundo recolhendo a bandeja.

— Vou direto para a cozinha, todas já tomaram café, vou comer alguma coisa enquanto disfarço essa minha cara.

Selou nossos lábios algumas vezes, fazendo o característico barulho de nossas bocas se encostando. Grace saiu sorrindo, olhando para trás antes de sumir porta a fora.

Apressei-me em voltar para o banheiro, quando cheguei vi que apenas as duas luzes de antes estavam acesas. Comecei a me perguntar se meu pai teria coragem de desistir de mim assim tão fácil. Eu no lugar dele procuraria saber se meu filho ainda estava vivo após tanto tempo sem um mísero sinal ou tentativa de comunicação. Não apenas se estivesse vivo, seu algum dia eu tivesse um filho, iria onde quer que fosse atrás de seu corpo, pelo menos tentaria lhe dar um funeral, ou conseguir dormir tranquilo sabendo o que houve com ele. Era estranho pensar sobre aquilo, o que um pai faria por um filho, nunca tive pensamentos sobre aquilo. O tempo de confinamento naquele quarto estava começando a me deixar louco.

The enemy | H.S.Onde histórias criam vida. Descubra agora