13. Gilbert

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Como as semanas estavam sendo difíceis, tirei uma folga do trabalho para colocar a cabeça no lugar. O ano estava chegando ao fim, e eu sentia que ele não tinha valido a pena.
Enquanto viajava em meus devaneios vespertinos, ouvi uma batida na porta e corri para atender. Imaginei que fosse Anne, mas a primeira imagem que meu cérebro processou ao abrir a porta foram longos cabelos loiros com cachos soltos e olhos azuis estonteantes.
- Gilbert!
- Winifred?!
- Eu mesma!

Estendi a mão para cumprimentar. Não esperava nem imaginava a visita dela. A convidei para entrar e lhe servi um copo de água.
- Então... O que te traz aqui?
- Quis saber se você estava bem! Eu poderia simplesmente ter ligado ou mandado mensagem, eu sei. Mas eu fui ver o Moody e aproveitei que estava por perto e vim, espero que não seja um incômodo.
- Claro que não! Obrigada por se preocupar Winifred.
- Winnie.
- O que?
- Pode me chamar só de Winnie.
- Ok, então, Winnie. Eu estou bem. Os últimos dias foram difíceis mas uma hora as coisas voltam ao seu lugar.

Assim como naquele outro dia, nos perdemos na conversa indo de memórias de infância a extraterrestres. Conversar com Winifred me levava pra outro universo e me fazia perder a noção do tempo, quando me dei conta, já estava anoitecendo. Enquanto riamos, comentei:
- Olha só, já tá anoitecendo... Há quantas horas nos estamos conversando?
- Não sei mesmo!

Peguei o celular apenas para ver o horário, mas meus olhos bateram de relance em uma mensagem de Anne que aparecia na tela bloqueada.
"Estou namorando..."
Tentei disfarçar que aquilo me atingiu como um soco na boca do estômago.

- Já são 18:12. Deixa eu te perguntar uma coisa... Tá afim de sair comigo algum dia desses, talvez um pub, cinema..?
- Ainda bem que você chamou antes de mim. - ela respondeu sorrindo, sem desviar o olhar de mim - Acho que preciso ir agora, amanhã é meu dia de plantão e já viu né? Peguei seu número com o Moody, a gente marca alguma coisa, não é?
- Você é bem... Qual é a palavra certa mesmo?
- Desenrolada?
- Isso!

Eu ri e a acompanhei até a porta. Quando fiquei sozinho, peguei meu celular de novo e reli a mensagem de Anne até às palavras perderem o sentido na minha cabeça, eu não tinha a resposta certa.
"Estou feliz por você!"
"Não vou com a cara dele."
"Achei que ficaríamos juntos."
"Larga ele e fica comigo, por favor."

"Estou feliz por você" me pareceu mais adequada, então enviei.
Eu realmente estava feliz por ela mas mesmo tirando meu ciúme de campo, eu sabia que Roy Gardner não tinha boa fama, mas como eu iria alertar ela disso sem parecer um ciumento controlador?
Ele era o tipo de cara que farreava e passava o dia seguinte se gabando das suas "conquistas" da noite passada, e eu não sei do que eu seria capaz de fazer se visse ele tratando Anne como um de seus troféus.
O natal estava chegando e desde sempre comemorávamos juntando as famílias em um jantar. Foi assim desde que me lembro, em todas as minhas memórias de natais passados o rosto de Anne, Bertha, Walter, meu pai e minha mãe estavam presentes.

Eu não sabia o que esperar do natal mais um ano sem Bertha, sem meus pais que haviam se mudado para o outro lado do mundo para "aproveitar o tempo que lhes restava" e ter que encarar Anne sabendo que todos meus sentimentos por ela deveriam ser esquecidos
Fiquei surpreso quando Winifred realmente me mandou mensagens, marcamos de sair na segunda a noite para um pub que ficava no centro.

Às dez, decidi que era hora de descansar a cabeça para voltar ao trabalho. O principal motivo de eu ter tirado essa folga era que eu queria cuidar de Anne, mas ela não estava mais precisando de mim.
Dormi pensando nela, e em um momento de lucidez incerta me vi entrando no meu quarto e... Anne estava deitada na minha cama. Ela me olhava sorrindo mas não dizia nada.
O que era aquilo no dedo dela? Um anel? Quem deu? A luz do sol invadia meu quarto pelas janelas e iluminava o vermelho do cabelo dela, eu estava... Extasiado. Sim, extasiado é a palavra certa. Me aproximei dela devagar, meu medo era que qualquer movimento brusco pudesse desfazer aquele momento. Sentei na cama com cuidado e ela ainda não havia dito nada. Ela se aproximou, ficando de frente para mim, e levou minha mão ao seu rosto. Acariciei a maçã do seu rosto com o polegar, eu não entendia o que estava acontecendo, mas sabia que a sensação era boa.
Sua pele era macia como seda, seus olhos azuis estavam direcionados aos meus lábios. Ela se inclinou em minha direção e eu mantive a minha mão no seu rosto, senti seu nariz encostar no meu e então seus lábios também estavam em mim, aquela sensação era tão real...

Mas meu alarme tocou indicando que era hora de levantar.
Meu quarto ainda era escuro pelas janelas e cortinas fechadas e não havia ninguém lá além de mim.

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