Enquanto fiquei sozinho na sala esperando Anne e Cole, meus pensamentos foram transportados para 10 anos atrás. Nunca imaginei que veria aquele rosto novamente, com os mesmos olhos claros e boca avermelhada que eu bem conhecia.
Cole Mackenzie, que pode ser considerado meu primeiro amor, o verdadeiro.
Eu não esperava o encontrar, e não esperava que ainda existissem fragmentos dos sentimentos que nutri por ele quando tínhamos 16 e 17 anos.
Minha sexualidade era um mistério para mim. Claro, me atrai por muitas mulheres até aquele ponto, mas haviam outras pessoas que também mexiam com meu coração. Cole foi uma delas, e a primeira que me ajudou a entender o que eu sentia.
Eu era intensamente apaixonado por ele e por tudo que ele fazia, pela maneira como ele era livre, pela maneira como ele me tratava e pelo seu modo de ver o mundo. Acho que ele sentia o mesmo por mim.Mas fiz ele se esconder. Nos víamos em cantos escuros, lugares afastados onde eu sabia que ninguém conhecido estaria. O fiz sentir vergonha por mim. Quando percebi que estava o machucando, me afastei da forma mais covarde que eu consegui; iniciando um relacionamento com alguma garota.
Josie Pye era essa garota.
Ela era incrível, mas não era ele. E no fundo eu sabia que era ele quem eu queria, acho que ele também sabia, mas nunca disse nada.
Acabei indo embora para Toronto alguns meses depois, sem chance de dizer a verdade. Agora eu tinha chance, estávamos eu e ele no restaurante. Dois estranhos com memórias que nos ligavam.— Já que estamos aqui, por que não pegar uma mesa para esperar e ver no que vai dar? — comentei cautelosamente, sempre fui o tipo de pessoa que não se intimida facilmente, em alguns sentidos, é claro. Mas ele fazia com que eu me sentisse vulnerável e... Envergonhado.
— É, por que não?
— A gente precisa conversar.
— Precisa mesmo?
O segui até uma mesa, onde conseguimos ver Anne e Gilbert de longe.
— Olha... Eu sei que te magoei muito.
— Não precisamos conversar, Davy.
— Mas eu preciso que me escute.
— A gente pode fingir que não se conhece e recomeçar?
— Não sem antes você me escutar.
Ele pareceu convencido, então continuei falando, colocando minha mão sobre a mesa e aproximando da sua à medida que falava.
— Sei que te magoei muito.
— Que bom que sabe — ele respondeu rispidamente, sem me encarar.
— Eu me arrependo com todas minhas forças de ter feito aquilo com você. Mas eu te amei, de verdade.
— Nunca me esqueci de você.
— Nem eu.
— Não quis dizer em um bom sentido.
Um garçom sorridente nos trouxe um menu.
— Cole...
— Sim, você me magoou muito, e eu também te amei de verdade. Mas você lembra muito bem o que fez. Entendo você querer usar alguém de fachada pra esconder que estava saindo comigo, mas logo a Josie? Sabia que a gente brigou por causa disso? — o seu olhar era tão voraz que doía.
— Não era minha intenção.
— Você não contou nem pra sua prima, nem pra algum amigo... Eu era o seu segredinho sujo, sabe o quanto isso me magoou?
— Não faço nem ideia.
— Muito, Davy. Muito...
— Eu posso concertar isso, se você quiser.
Ele não respondeu, pois agora estava encarando nossas mãos próximas uma da outra.
— Recomeçar, você disse...
— Eu mesmo consertei isso, sozinho.
— É claro.
— Somos pessoas diferentes agora.
— Por isso mesmo. Pensei em te procurar todos esses anos para saber como você estava mas... Não sabia por onde começar.
— Vou te apresentar para as redes sociais.
— Não seria a mesma coisa, e você sabe disso. Não seria como estar frente a frente com você, vendo que você ainda desvia o olhar quando está falando e que ainda usa o mesmo perfume. Não queria ter a opção de digitar e apagar uma mensagem procurando as palavras certas pra usar com você porque eu queria falar o que está no meu coração, sem filtro e sem medo de errar. Queria ser verdadeiro com você, pelo menos dessa vez.
Ele ainda não olhava para mim enquanto eu falava, mas lentamente levantou o olhar para fitar os meus olhos.
— Tudo bem.
— Tudo bem?
— Sim. Eu guardei essa mágoa todos esses anos e precisava falar sobre isso, mas já se passou muito tempo. Como eu disse, somos pessoas diferentes, e eu quero muito ter a oportunidade de te conhecer de novo.Sorrimos um para o outro, finalmente tocando nossas mãos. Desviei o olhar para a mesa de Anne e vi que ela e Gilbert estavam abraçados, e ele estava colocando um anel no dedo dela.
— Olha aqueles dois... — ele falou.
— O amor deles deve ter cheiro de livro velho, que passou anos em uma estante esperando para ser lido.
Nós trocamos olhares e percebemos o toque de nossas mãos. Ele se desvencilhou e levantou, indo até Anne e Gilbert e eu o segui.— Tem noivinha e noivinho na área?
— Tem sim! — Cole respondeu.
Ele abraçou Anne e beijou sua bochecha enquanto eu apertei a mão de Gilbert.
— Te desejaria sorte, mas você já conhece bem a raça da Shirley.
— Eu achei que esse dia nunca chegaria!
— Nós também — Anne falou, rindo.Eu e Cole voltamos para a nossa mesa.
— Você pode considerar esse o nosso primeiro encontro de muitos.
— Encontro?
— Sim, Cole. Ou ainda posso te chamar de... Mon chaton?
Mon chaton. Eu chamava Ele assim porque ele falava muito sobre ir para a França estudar moda. Tanto que eu acabava ficando sem paciência. Então o apelidei de "meu gatinho" em francês, um apelido justo já que eu o achava muito bonito, e chaton me lembrava chato, que era do que eu realmente queria chamar ele.
— Não acredito que ainda lembra disso!
— Claro que lembro!
— Você pode me chamar assim se eu ainda puder te chamar de papillon.
— Então combinado, mon chaton. Você nunca me explicou o porquê desse apelido.
— Borboleta, em francês. Você me lembrava uma, a cor do seu cabelo e a liberdade que você tinha… Ou que eu achava que tinha.
— Você nunca usou "mon"(meu) junto. Por que?
— No fundo, eu sabia que você não era meu, e uma hora iria voar, como uma borboleta.
Não tinha uma resposta para aquilo, ele estava certo.
— Ei, tudo bem. Já faz tempo, lembra?
— Lembro. Mesmo assim... Sabe, Cole, no fundo sempre te pertenci.
— Não vem. Como pode ter sido meu se tantas pessoas já passaram pela sua vida e ocuparam o mesmo espaço que eu.
— Primeiramente, muitas pessoas é exagero, quem você acha que eu sou?! — sorri pra ele, tentando demonstrar que eu estava brincando — Segundamente, pertencer não é sobre estar sempre junto. É mais sobre você saber que se você me ligasse eu viria do outro lado do continente por você. E terceiramente, ninguém ocupou o seu espaço, nem a Josie e nem ninguém.
— Porque ele me pertence?
— Exatamente.
— Então, mudando de assunto...
— Ok. Então, você conseguiu? O lance da França...
— Não.
— Ah, sério?
— Sim, mas de certa forma, deu tudo certo sim... Só não como eu planejava.
— Senti sua falta.
— Não quero falar profundamente dos meus sentimentos na primeira vez que eu te encontro em sei lá quantos anos.
— Mas...
— Mas também senti sua falta.
— A gente não precisa se esconder dessa vez.
— Por que?
— Todos já sabem, até meus pais... E é por isso que estou aqui.
— Então eles não devem ter reagido bem.
— Sabe como são Clyde e Bethany...
— Não lembro, você nunca nos apresentou.
— Eles não apontaram o dedo na minha cara e disseram que eu estava errado, mas o clima em casa ficou horrível. Pensei em passar um tempo na casa do meu tio—avô Matthew, mas ele também é um Cuthbert, provavelmente entraria em pânico tentando me ajudar. A única pessoa que saberia lidar com isso seria a tia Bertha, mas...
— Eu sei.
— Pois é. Mas Walter também é um ótimo tio. Ele me recebeu e disse que podia ficar o tempo que precisasse, o problema é que não sei de quanto tempo preciso.
— Na hora certa tudo vai se acertar.
— Espero.Anne e Gilbert foram embora sem que nós notássemos, e no fim da noite, deixei Cole em casa.
— Já te dei meu número, certo? — ele perguntou quando parei em frente a casa dele.
— Sim...
A conexão em nossos olhares me deu um nó na garganta e borboletas no estômago que eu só lembrava de ter sentido com ele. Involuntariamente, nossos rostos se aproximaram, dissipando o espaço que havia entre nós. Apoiei a minha mão no seu queixo, e antes que eu pudesse tocar nossos lábios ele sussurrou:
— Tanto tempo se passou e as borboletas continuaram aqui.
— Também sinto elas — respondi em um tom semelhante ao seu.
Finalmente, o beijei. Revivendo os momentos que eu me forcei a esquecer por anos, sem sucesso.
De repente, eu tinha 17 anos de novo
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aposta infantil.
FanfictionAnne e Gilbert sempre foram amigos desde crianças, e um dia fizeram a seguinte aposta: "Se não estivermos com ninguém daqui 20 anos, vamos nos casar com o outro". Eles só não sabiam que o tempo iria passar tão rápido. "- Você sabe que não quebro pro...