𝗺𝗶 𝗮𝗺𝗼𝗿, 𝖵𝖨𝖭𝖭𝖨𝖤 𝖧𝖠𝖢𝖪𝖤𝖱

𝖲𝖾𝗏𝖾𝗇

𝗠𝗜𝗔 𝗚𝗥𝗔𝗬

Hoje era sexta, glória! Eu não aguentava mais a escola. As aulas mal tinham voltado e eu já estava atolada de atividades, como se quisessem acabar comigo antes mesmo do semestre começar.

— Avisa para sua mãe. — Megan fala para a Amy, ansiosa.

— Já avisei, e ela deixou. — Amy responde, e nós três damos um pulinho de alegria, quase como um desabafo.

— A minha eu nem preciso perguntar, ela está em viagem. — digo. Elas me olham com aquele olhar de pena silenciosa. — Não, gente, sério... tá tudo bem. Agora que os negócios aumentaram, eles têm que viajar muito.

A verdade pesa no peito. Eu meio que menti. Eles não viajaram por negócios — viajaram para ficar longe.
Mas eu não ia dizer isso em voz alta.

— Ok, mudando de assunto: temos que passar em casa para pegar as minhas coisas e depois na da Amy para pegar as dela. — falo enquanto caminhamos, tentando afastar a sensação de vazio que sempre fica quando menciono meus pais.

[...]

— Oi, família linda! — Megan anuncia quando entramos em sua casa. Ela parece otimista demais. — Mãe, posso pedir uma coisa?

— Fala, Megan. — tia Maria diz, desligando o celular como se estivesse preparada para negar qualquer coisa.

— Então... as meninas podem dormir hoje aqui? — ela pergunta, e nós três sorrimos num nervoso sincronizado.

— Podem. — tia Maria responde, e nós comemoramos. — Hoje eu e seu pai vamos dar uma saída, então vou deixar o Vinnie de olho em vocês.

Nosso entusiasmo se parte ao meio.

— Vou fazer o quê, mãe? — Vinnie aparece na sala, a voz grave e cansada.

— Ficar de olho nas meninas. — ela diz.

Ele revira os olhos, irritado.

— Mãe, hoje eu ia sair com os meninos. — reclama, mas ela nem se vira.

— Sai amanhã. — fala firme, subindo as escadas.

O clima fica pesado.
Quase dá para ouvir Megan engolindo a própria vontade de xingar.

Fugimos para o quarto dela, como quem foge de uma bomba prestes a explodir.

⸻

VINNIE HACKER

Desligo meu computador e saio do meu quarto, tentando respirar fundo. A casa sempre parece mais barulhenta quando minha mãe me coloca para "tomar conta". Como se eu fosse babá.

Vou para a cozinha, pego minha garrafinha de água — a única coisa sob controle na minha vida — e bebo. A água desce gelada, mas não esfria minha irritação.

Subo as escadas. A porta do quarto da Amy está entreaberta.
E ouço risadas.

Meu nome.

Paro.

Me aproximo.

Mia e Amy estão sentadas à esquerda da cama. Megan à direita. As três iluminadas pela luz fraca do abajur, rindo como se o mundo lá fora não existisse.

Até que Megan fala:

— Mia, parte para outro. Meu irmão é lerdo, não entendeu que você está a fim dele.

Paraliso.

— Desculpa, Megan, mas o Vinnie parece ser um verdadeiro babaca. — Amy diz.

Eu arqueio a sobrancelha. Bonito.

Mas aí...

— Ele é um verdadeiro gostoso. — Mia fala.

As três explodem em gargalhadas.

E eu...
Eu continuo paralisado.

Meu coração dá um soco no meu peito, forte, incômodo.
A Mia.
A Mia me chamou de gostoso.

A mesma Mia que sempre foi... quase família.
A mesma Mia que eu nunca deixei minha cabeça enxergar de outro jeito.
Ou talvez tenha deixado — tarde da noite — quando ninguém podia saber.

Saio dali rápido, como se tivesse encostado numa tomada e tomado choque.
Fecho a porta do meu quarto sem força.
E claro... o celular vibra.

Samantha.

Já estou chegando, baby.

Reviro os olhos.

Na onde?

Em sua casa.

Quem te chamou?

Ela não responde.

Ótimo.

Exatamente o que eu precisava:
Mais caos.
Mais confusão.
E o nome da Mia latejando na minha cabeça como se tivesse sido queimado ali.

Agora, além de lidar com a Samantha, eu teria que lidar com isso:
O fato de que talvez...
Só talvez...

Eu quisesse que a Mia tivesse falado sério.