Regra Número 5:

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Toquei a campainha, passei as mãos por meu vestido e aguardei olhando em volta. Quando era criança tinha morado naquela casa com meus pais, foi meu primeiro lar, guardava lembranças vagas, mas dei um sorriso ao olhar a calçada e recordar minha mãe me ensinando a andar de bicicleta sem rodinhas ali. Levei várias quedas, mas a pior foi uma que ralou muito meu cotovelo, até hoje lembro da textura da pele quando toquei o lugar ainda sem saber que tinha machucado. Era gosmento, era sangue.
Meu pai, enfim, abriu a porta depois que toquei mais uma vez sua campainha. A casa não tinha mudado muito, só estava mais velha, a pintura descascando, o piso da varanda rachado e os modelos de janelas arredondado que lembravam igreja.
Quando adentrei a sala, estranhei, havia uma mulher de cabelos longos e cacheados sentada no sofá. Ela sorria para mim e foi aí que meu pai se apressou a nos apresentar. Ela era Clarissa, sua namorada. Lembro que levei alguns segundos para processar a ideia, tinha tão pouco tempo do divórcio, esperava que fosse demorar mais para algo assim vir a acontecer. A mulher se levantou e estendeu a mão para mim, a cumprimentei enquanto encarava, não ela, mas meu pai, incrédula com aquela cena toda.
- Achei que um jantar seria ideal para vocês se conhecerem. - Explicou, meio sem graça.
- Estou feliz por enfim conhecer a filha de quem ele tanto fala! Realmente, ela é linda.
- Eu não sabia... - murmurei para meu pai. - Se tivesse me explicado, teria sido melhor.
- É... Achei que não fosse necessário. - Murmurou, acanhado.
O clima pesado pairou o tempo inteiro em que ficamos na sala conversando. A mulher tentava ao máximo ser gentil e agradável comigo, os lábios com um sorriso largo e cheio de gloss me contavam sobre si, como se eu estivesse lhe fazendo mil perguntas, porém, eu mal falava. Estava chocada com isso, pois esperava que naquela noite fosse passar um bom momento com meu pai, relembrando quando morávamos ali, eu o atualizando sobre o horror da nova escola, assistiriamos um filme de ação péssimo, mas que ele ama. Mas não, ali estávamos os três naquela sala sentados em sofás brancos que já tinham sido bonitos em outros tempos.
Clarissa, sentada no sofá menor, com as pernas brilhosas cruzadas me contava que trabalhava com decoração de interiores e que conheceu meu pai na loja dele quando tinha ido fazer uma lista para seu projeto. Eu me limitava a assentir, não conseguia demonstrar tanta gentileza quanto ela, estava chateada com toda situação e me questionava se, como ele havia encontrado alguém tão rápido, era possível que já estivesse com ela enquanto casado com minha mãe. Tal pensamento embrulhou meu estômago e me fez fechar a carranca, se já estava nos limites ali, naquele momento havia ultrapassado e transbordava de frustração, tristeza, pairava sobre mim um sentimento que até então era desconhecido, de abandono.
Provavelmente meu pai percebeu minha cara fechada e, numa tentativa de mudar os ares, nos conduziu para a cozinha, onde nos servimos de uma lasanha de queijo que, com certeza, tinha sido comprada em um restaurante que frenquentavamos.
O único som que se sobressaia era o dos talheres tocando os pratos. Um ou outro gole no refrigerante e frases soltas de Clarissa tentando puxar conversa. Eu ignorava o que havia ao meu redor, me encontrava no automático vivenciando um jantar apenas por educação enquanto queria estar em casa, no meu quarto, escutando uma boa playlist.
- Tudo bem com você, princesa? - Perguntou Clarissa com seu sorriso largo e olhos brilhantes, aquela mulher parecia irradiar luz, mas não no sentido bom, era uma luz tóxica que não me fazia bem.
- Não. - Enfim, assumi. - Não tá tudo bem, inclusive, acho que já comi o suficiente e vou embora. - Levantei da mesa, empurrando a cadeira que fez um barulho alto riscando a cerâmica sob si. - Boa noite para vocês. - Sai em direção a sala para pegar minha bolsa e alcançar rapidamente a rua, mas meu pai me deteve, tentando se desculpar ou era se explicar, falava comigo de maneira carinhosa e gentil, mas eu não estava pronta para lidar com aquilo e simplesmente me fechei, deixando que suas palavras tocassem a minha barreira e fossem de encontro ao chão. Clarissa estava atrás dele, como um borrão luminoso, eu me desvencilhei daquele agouro, abri o portão e ganhei a rua.
Enquanto dava rápidas passadas, eu o ouvia gritar meu nome, mas não me virei, não queria mostrar minhas lágrimas escorrendo. Naquela noite, me senti a pessoa mais boba por não aceitar a nova fase da vida de meu pai, porém, meus sentimentos me consumiam de tal maneira que eu só sentia tristeza e raiva. Talvez, estivesse sendo egoísta, mas me sentia maltratada.
Subi a rua deserta o mais rápido que pude sem tropeçar e cair com a visão empastada pelas lágrimas. As luzes amareladas dos postes me acompanhavam e eu nem me preocupava com algo ruim que pudesse vir a me acontecer aquela hora da noite. Alcancei a calçada do shopping e parei, aguardando que o trânsito cessasse para que eu pudesse passar. Assim que consegui uma brecha, fui, desci a avenida deserta e que, se fosse em outro momento, com outro estado de espírito, teria achado assustadora. A avenida dava na universidade que um dia fui com Mateus e Rafaela, ela estava iluminada, mas pelas grades vazadas vi que já se encontrava vazia.
Atravessei a rua e continuei, topei com algumas pessoas que eu conhecia por morarem próximo a mim, mas não os cumprimentei, apenas abaixei a cabeça e segui andando. Ao chegar ao portão de minha casa, desabei no meio fio, cansada do percurso, cansada do que tinha vivenciado.
Meu celular começou a tocar, o volume estava baixo e era possível que já vinhesse tocando há muito tempo. O peguei, era meu pai, neguei a chamada e puxei a barra de notificação: 10 chamadas perdidas! Três delas de minha mãe. Ignorei todas e entrei em uma notificação do Instagram, havia sido marcada em uma foto.
Vi que se tratava das fotos da exposição de arte, alguém estava atualizando o perfil da galeria naquele momento, pois a cada atualização encontrava uma nova foto, pra eu ter sido marcada, desconfiei que fosse minha mãe. Fui rolando a tela e procurando, inconscientemente, uma foto que tivesse Benjamin e a encontrei, me dei conta que a estava buscando quando me detive na imagem, olhando o sorriso largo de meu professor ao lado de uma moça de cabelos compridos e um outro homem. A única pessoa marcada naquela foto era a mulher, entrei em sua conta, mas era privada, me limitei apenas a ler sua biografia, lá dizia "casada" e seu sobrenome era o mesmo de meu professor. Uma pontada de decepção me açoitou, mas não durou muito, pois fui puxada para a minha realidade novamente.
Mãe tinha aberto o portão da garagem, pronta para tirar seu carro, mas se deteve ao me ver sentada no meio fio. Gritou meu nome em tom de repreensão e alívio, ela estava pronta para ir me procurar pela cidade em meio a noite. Ela começou a dizer algo que não me dei ao trabalho de entender, a abracei e sussurrei que sentia muito, por tudo.

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Como  ̶N̶ã̶o̶  Se Apaixonar Pelo ProfessorOnde histórias criam vida. Descubra agora