Capítulo 5

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Ele lhe dera paz – Christian, o homem atrás do muro. O apanhador de desejos. Ana realizou com perfeição um grand jeté, pousando em sua marca e mantendo a pose enquanto um dos bailarinos executava o seu movimento.

A sensação de paz continuava a envolvê-la feito um cobertor quentinho. Sim, ela pensou. É isso! Ali era onde seu pai gostaria que ela estivesse, nenhum outro lugar. Dance com todo o seu coração, Christian havia dito, e era isso que ela faria.

Que engraçado, pensou. Aquele tinha sido seu desejo original: ficar em paz com relação à situação do pai. E conseguira. Em apenas um instante, Christian dera um jeito de realizar seu maior desejo.

Ana sorriu para si mesma à medida que começava a se mover de novo, os outros bailarinos esvoaçando pelo palco com ela. Ela o havia chamado de apanhador de desejos, mas talvez ele também tivesse o dom de realizá-los. Pelo menos no caso dela fora assim.

– Ana– Madame Fournier chamou a garota enquanto esta deixava o edifício com a bolsa de lona pendurada no ombro. – Você dançou lindamente hoje. – Ela abriu um sorriso tenso, sinal de que não ficara impressionada, mas mesmo assim o coração de Ana bateu mais forte.

– Muito obrigada, Madame Fournier. Até amanhã. – Ela deu um sorriso largo, deixando a porta vaivém fechar atrás de si.

Já eram sete da noite e Ana sentiu um desejo súbito de ir até o muro que chora, chamar Christian, contar-lhe sobre o seu dia e expressar o quanto ele a havia ajudado com suas palavras sinceras. Mas obviamente seria estupidez. Eles mal se conheciam. Ele não iria gostar que ela aparecesse em sua casa – ainda que do lado de fora – sem ter sido convidada. Afinal, ele já não estava cheio de todas aquelas pessoas indo até lá do nada, o tempo todo?
Amigos aparecem de surpresa às vezes, mas eles dois não eram amigos de verdade. Ou eram?

Pensamentos sobre Christian, sobre o vínculo incomum que ela sentia se formar entre ambos, a acompanharam na volta para casa e, quando desceu do ônibus, ela avistou o homem que vendia artigos de hortifrúti e flores sob um toldo improvisado na esquina, guardando seus produtos.

Um borrão vermelho chamou sua atenção e ela percebeu que, naquele dia, ele tinha rosas vermelhas na barraca. Num impulso, Ana atravessou a rua, sorrindo ao se aproximar do senhor.

Ele retribuiu o sorriso, sua pele enrugada formando centenas de dobras, seus olhos se estreitando de um jeito gentil.

– Com licença, senhor. Sei que está fechando, mas será que ainda dá tempo de comprar um buquê de rosas?

– Claro que sim. Qual prefere? – O homem apontou para um buquê vermelho e depois para um cor-de-rosa.

– O vermelho, por favor. São as flores favoritas do meu pai.

– Ah. Um típico cavalheiro. Gosto disso.

Ana pegou a carteira, inclinando a cabeça ao entregar o dinheiro ao homem.

– E é mesmo. Vim de Ohio e estou morando aqui há pouco tempo, mas vi as rosas e pensei nele. Meio que me fez lembrar de casa.

O homem recusou o dinheiro.

– Bem, então considere estas rosas as minhas boas-vindas a Nova Orleans.

– Ah não, não posso aceitar. – Ana estendeu novamente as notas ao homem, mas ele as
recusou mais uma vez, rindo.

– É melhor ir para casa e colocar as flores na água antes que comecem a murchar. – Ele deu
uma piscadela e lhe ofereceu um sorriso caloroso e gentil.

Relutante, Ana baixou o braço.

– Se é assim...

– E toma – ele lhe entregou uma planta com florezinhas num vaso de terra-cota –, leve um
mimo. – O vendedor riu ante a perplexidade dela. – É o que nós de Nova Orleans chamamos de brinde. Agora você tem algo bonito para pôr dentro de casa e também do lado de fora.
Coloque nos degraus de entrada. Minha mãe sempre dizia que a melhor maneira de receber bem as pessoas em casa é mostrando que se importou em enfeitar o lugar para causar uma boa primeira impressão.

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