Capítulo 24

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Christian sorriu ao baixar a caixinha de música, observando a minúscula bailarina girar ao som de "All I Ask of You".

Tocou a dançarina loira, que girava sem parar, o maior desejo dele. Se ao menos pudesse pedir a mesma coisa a Ana. Aquele era o jeito fofo dela, ele imaginava, de lhe pedir que pensasse nela mesmo quando estivessem longe um do outro. Ah, se ela soubesse! Christian não fazia outra coisa além de pensar nela. Ansiava por ela. Desejava Ana com uma necessidade desesperada que fazia seu estômago se revirar e seus músculos se retesarem. Dor de amor, havia descoberto, era bem real. Ele sofria disso.

Mesmo assim, havia algo doce naquele sofrimento. Era um tormento que ele buscava continuamente, como se Ana fosse não apenas o sintoma, mas também a cura.

Ah, sou um caso perdido, pensou com um suspiro doloroso.

Christian se perguntou se ela teria escolhido aquela música de propósito. Ele reconheceu a melodia porque tinha visto O Fantasma da Ópera várias vezes, em uma viagem de negócios que fizera a Nova York, quando ganhara ingressos para a Broadway. Fora acompanhado, mas, quando tentava evocar o rosto de sua acompanhante, não conseguia nem se lembrar vagamente dos seus traços.

A canção de amor da caixinha de música era sobre um fantasma mascarado, que não queria mostrar seu rosto desfigurado, e sobre a mulher que o amava mesmo assim.

Minha nossa, Ana!

Sim, ela o atormentava, mas também havia começado a afrouxar aquele nó de forca que ele trazia em volta do pescoço havia anos. Ele não tinha certeza se era prudente considerar tal coisa. Mas, desde que falara com ela pela primeira vez através do muro que chora, sua natureza cheia de vida... o havia preenchido. Antes dela, respirar fundo era algo quase inimaginável.

Christian passou a mão pelo rosto rugoso e sulcado, os dedos percorrendo uma cicatriz particularmente grossa que descia do seu olho ruim e fazia a curva da bochecha, dando formato àquele osso.

Talvez ela pudesse aprender a aceitá-lo. Gail e Taylor haviam aprendido. Sim, mas Gail era quase cega sem seus óculos e Taylor tinha sido criador de porcos durante metade da vida, então estava acostumado a ver criaturas menos atraentes. Mas nenhum deles parecia mais abalado ao vê-lo.

Será que ele ousava considerar uma coisa dessas?

Levou o dedo ao lábio inferior, ao canto derretido que ela sentira com a língua e que não parecera desagradá-la. Ana até tentara tocar o local novamente, mas ele a distraíra. Mas é claro que sentir algo com a ponta da língua e ver todo o ferimento em plena luz do dia eram coisas completamente diferentes.

Christian se lembrou do jornalista que havia seguido Gail e ele no dia de sua alta do hospital. A atadura de Christian se soltara por causa da corrida insana até o carro para fugir da multidão que gritava e cuspia, e parte do seu rosto ficara à mostra – a carne crua e vermelha de sua ferida exposta –, e o jornalista primeiro ficara chocado, e depois sua expressão se transformara em horror enquanto ele se afastava aos tropeços. Enojado. E, naquele momento, Christian ficara grato pela reação do cara ao ver seu rosto desfigurado, porque assim conseguira se livrar dele. Ou pelo menos era isso que dissera a si mesmo.

A música terminou, e o silêncio que a seguiu parecia triste. Solitário.

Normal.

Ele não queria que terminasse. Mas terminaria mesmo assim, não é? Ele sentia que estava mudando, emergindo, só que para ele não haveria uma transformação de lagarta em borboleta – sua aparência seria eternamente a do abdômen de um inseto. Aquilo não mudaria.

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