Capítulo 2

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–Alô. Senhora Lovett? É a Ana.

– Olá, Ana, querida. O que está achando de Nova Orleans? Está se adaptando?

– É um bom lugar. Estou me adaptando bem. – Ana colocou um sorriso na voz, determinada
a soar positiva, embora não estivesse de fato se adaptando. Ainda.

– Fico feliz em saber.

– Como ele está hoje, senhora Lovett?

Houve uma pausa antes de a senhora Lovett responder, e a voz dela soou mais baixa do que
um minuto antes.

– Ele teve uma crise ontem. – Quando Ana ia começar a falar, a senhora Lovett apressou-se
para completar: – Mas não foi nada sério. Ele ficou um pouco irritado e arremessou a bandeja do almoço. Demos a ele um sedativo para acalmá-lo e ainda está dormindo.

Ana sentiu um aperto no peito. Ela esperava falar com o pai, nem que fosse rapidamente, apenas para ouvir a voz dele. Lágrimas surgiram em seus olhos.

– Ele ficou lúcido em algum momento ontem?

– Ontem não, querida.

Ana notou o tom de lamento nas palavras da senhora Lovett. Ela sabia o quanto a enfermeira idosa e gentil gostaria de lhe dar boas notícias. Ana havia criado uma relação de proximidade com ela durante o tempo passado na clínica ao lado do pai, antes de partir para Nova Orleans.

– Pode me ligar mais tarde se o quadro dele mudar?

– Claro.

Elas conversaram mais um pouco e então se despediram. Ana colocou devagar o telefone de
volta na bolsa, e uma única lágrima escorreu por sua bochecha. Ela a enxugou, respirando profundamente e de modo entrecortado. Estava com saudade de casa – solitária – e teria sentido a falta do pai mesmo na melhor das circunstâncias. Mas saber que ele estava desaparecendo dia após dia e que ela estava tão longe era como ter uma faca cravada no coração.

Logo ele partiria e Ana sentiria falta dos últimos momentos preciosos que passara com ele, enquanto sua mente ainda estava lúcida, enquanto ainda sabia quem era ela. Vez ou outra, quando a neblina em sua mente se dissipava, será que ele se perguntava onde ela estaria? Será que se perguntava por que a filha o havia abandonado quando mais precisava dela? Ou será que ele se lembrava de que lhe dissera para ir embora?

– Ah, papai – ela sussurrou no vazio de seu apartamento.

Ana se levantou da cadeira em sua cozinha minúscula, agarrando a bolsa. Precisava de ar. Precisava fugir daquelas quatro paredes que a aprisionavam. Dançar a ajudava a se lembrar por que estava ali, ajudava-a a se lembrar dos sacrifícios que o pai fizera por ela. Mas era seu dia de folga e, de qualquer jeito, seu corpo precisava de descanso. Ela desejou que...

O pensamento irrompeu de repente quando ela saiu para o dia abafado de Nova Orleans, a palavra desejo quicando em sua mente. Ana pegou o celular, pesquisou "Fazenda Windisle" e encontrou o endereço com facilidade. Minutos depois, um Uber parou perto do meio-fio e ela embarcou rumo ao muro que chora.

Vinte minutos depois, saiu do carro. Agora, uma leve brisa soprava e o ar em movimento era delicioso em sua pele quente. Ana suspirou alegre, inalando os cheiros doces e sazonados do verão e apreciando a diminuição do calor sufocante das últimas semanas.

Acima dela, o céu exibia vários tons de cinza, as nuvens envoltas por um brilho prateado. Um bando de pássaros passou depressa pela névoa cintilante, um deles saindo da formação e seguindo isolado por uma fração de segundo antes que o restante do grupo retornasse para se unir ao membro desgarrado, completando a formação mais uma vez.

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