Capítulo 30

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Novembro de 1861

Angelina entrou na sala de estar, onde havia sido chamada, com o pano de prato ainda nas mãos. O cheiro doce de levedura do pão que assava a acompanhou desde a cozinha.

– Pois não, senhora Grey?

A senhora Grey se levantou de onde estivera sentada, e o homem ao seu lado também ficou de pé. Ele se virou e Angelina piscou, confusa. Ele parecia John, só que mais magro, a ponte do seu nariz mais estreita, seus olhos mais fundos nas órbitas... Mesmo assim, a semelhança fez seu coração saltar no peito, e ela segurou com mais força o pano de prato em suas mãos.

– Angelina, este é o senhor Lawrence Whitfield. Ele trouxe correspondência para você.

– C-correspondência? – Angelina sussurrou, um tremor de esperança e de medo percorrendo seu corpo. Seria de John? E, se fosse, por que exporia o relacionamento deles escrevendo diretamente para ela? Não era seguro.

O senhor Whitfield exibiu um sorriso discreto e deu alguns passos até onde ela estava parada enquanto tirava a carta do bolso.

– Meu irmão, John, pediu que eu lhe entregasse isto. Veio junto com a correspondência da nossa família.

Angelina esticou a mão para pegar a carta, mas Lawrence puxou o papel de volta.

– John explicou que você não sabe ler. Ele pediu que eu lesse para você.

Os olhos dela encontraram os dele, seu coração pulsando descontrolado. Ela não sabia como
interpretar a expressão daquele homem, daquele estranho, e se sentia tão consumida pela ansiedade que, por um instante, tudo que conseguiu fazer foi olhar fixamente para ele.

– Tu-tudo bem. Obrigada, senhor.

O senhor Whitfield desdobrou a carta, e Angelina sentiu um sopro de alegria subir por sua garganta quando viu a caligrafia. Ela engoliu a empolgação com esforço, esperando enquanto o senhor Whitfield colocava os óculos.

Aquela caligrafia... as letras pequenas e precisas combinadas com outras maiores e mais espaçadas. Ela já conhecia o estilo da época em que se encontravam na garagem de barcos. John costumava levar a correspondência para adiantar o trabalho enquanto esperava por ela – durante horas, algumas vezes, dependendo de quando ela conseguia escapar –, e ela já havia lançado um olhar para os papéis sobre os caixotes velhos que ele usava como escrivaninha.

Ao ver aquela caligrafia, a saudade a invadiu, com o grande alívio de saber que ele estava vivo. Ileso. Ah, como ela o desejava! Como havia orado pela segurança dele! Como havia desejado febrilmente a notícia de que ele estava voltando para casa! Para ela.

– Angelina – leu o senhor Whitfield –, escrevo esta carta arrependido e sabendo que minhas palavras a magoarão. Mas preciso ouvir o meu coração. O tempo que tenho passado longe de você me fez ver as coisas com uma clareza absurda. Nossos encontros foram prazerosos, mas não têm futuro. Quando voltar para casa, eu me casarei com Astrid. Certamente você compreende que não poderia ser de outro modo. Você tem que aceitar seu lugar no mundo, Angelina. Só assim terá uma vida satisfatória. Cordialmente, John.

O senhor Whitfield pigarreou e dobrou a carta devagar. O coração de Angelina tinha ficado pequenininho durante a leitura e agora ela sentia um peso na boca do estômago, a tristeza a esmagava.

Ela ergueu os olhos lentamente para a senhora Grey, que a olhava com os lábios curvados para cima em um sorriso. Aquilo lhe agradava. Claro que sim.

A senhora Grey esfregou as mãos, como se aquele assunto desagradável envolvendo John e Angelina agora estivesse encerrado e ela pudesse seguir em frente com sua vida.

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