KIM BALDRICK
Deixo minha bolsa sobre a mesa perto da porta logo depois de entrar. Não é um lugar grande, mas é confortável o bastante, temos privacidade e este é um excelente bairro residencial, ideal para Sean crescer com segurança. Eu viveria muito mais estressada se tivesse que me preocupar com ele em uma vizinhança perigosa.
Olho seu pequeno e esguio corpo na pequena cama de solteiro. A madeira está gasta e os lençóis estão gastos por tantas lavagens, mas não temos dinheiro para repor com tanta frequência. Sean tem a cabeça enfiada debaixo do travesseiro.
Me aproximo com cautela e me sento no tapete de frente para ele. Meu irmão é tudo o que eu tenho de valioso. É difícil criá-lo, não posso negar, mas preciso ser paciente e lembrar que ele é apenas uma criança. Por mais esperto que meu garoto seja, ele ainda não entende nossos problema a fundo.
Estendo minha mão e acaricio seus cabelos. Sean recua um pouco no primeiro toque, ainda chateado comigo e sem levantar o rosto do travesseiro. Insisto em tocá-lo mais uma vez e alívio me preenche quando ele não se afasta.
- Sean. - O chamo, sem muito sucesso em conseguir que ele me olhe. Decido prosseguir mesmo assim - Eu confio em você, querido. Eu sei que sonha em jogar hóquei e sei como é importante para você, mas quero que esteja seguro. Por isso conversamos sobre não procurar o time da escola. Olhe para mim, querido.
Seus olhos úmidos encontram os meus. Seu rosto está vermelho e inchado pelo choro. Me parte o coração vê-lo com todos esses hematomas. Sean é meu garoto desde que veio ao mundo, meu para cuidar e proteger.
- Desculpe por ter te desobedecido.
- O que aconteceu na escola? - Continuo a acariciar seus cabelos.
- Eu queria provar que era bom. Queria usar o presente que você me deu. Meu equipamento é lindo, eu queria que você tivesse orgulho do que eu posso fazer e queria impressionar o Malkin.
- Conte-me como você conseguiu esses machucados Sean.
- O treinador me deixou jogar. Estava na metade do treino quando ele precisou sair para resolver alguma coisa e me deixou no gelo sozinho com os outros. Estava tudo bem até um deles falar que perdi uma boa jogada e me chamar de idiota. Eu tentei pedir desculpa, Kim. Eu juro que tentei, mas ele estava bravo e começou a me empurrar. Eu caí, ele pegou meu taco e o quebrou com a perna. Eu tentei parar ele, mas os amigos desse garoto me seguraram e ele começou a me bater.
- E o capacete?
- Era um treino simples, não precisava de capacete.
- O que aconteceu depois?
- Um deles perdeu o equilíbrio dos patins e escorregou no gelo, acabou me puxando junto e quando o treinador voltou, achou que eu estava tentando bater nele. Eu não fiz isso, Kim.
- Ai, Sean... - Solto um suspiro cansado. De repente eu preciso de uma boa noite de sono. Eu poderia dormir um pouco se não tivesse que voltar para o trabalho e repor as horas que estou perdendo fora.
- Você está brava comigo?
- Não estou brava por ter tentando treinar. Estou chateada porque me desobedeceu.
- Eu sinto muito.
- Preciso de mais que um pedido de desculpas, entende? Preciso que me mostre seu arrependimento.
- Como eu faço isso?
- Não me desobedeça mais. Quando quiser treinar venha falar comigo. Não faça as coisas escondido de mim outra vez. Eu confio em você, Sean e quero continuar confiando. É por isso que te deixo sozinho aqui enquanto estou no trabalho. Você é um garoto grande e sabe se comportar. Preciso ter uma babá aqui com você como se fosse uma criança pequena?
Não que eu tenhamos dinheiro para pagar uma babá. Ainda estou juntando para pagar o aluguel desse mês, mas uma tática muito útil que venho usando com Sean é fazê-lo se sentir um homenzinho. Treiná-lo com responsabilidades e prepará-lo aos poucos para os desafios da adolescência, juventude e vida adulta. Quero que meu irmão tenha uma vida muito melhor no futuro e se precisar trabalhar um pouco mais para que ele viva em uma bairro seguro, mesmo que de maneira humilde, é o que farei.
- Não. Eu não vou te desobedecer de novo. Eu prometo.
- Estou confiando em você.
- Kim, acha que Malkin não vai mais querer ser meu amigo?
Meu peito aperta com o medo em seus olhos. Joe Malkin é o ídolo de Sean desde que ele tinha idade para entender hóquei. Confesso que nunca assisti a um jogo, me parecia confuso entender porque homens crescidos corriam de um lado para o outro no gelo e se empurravam tentando alcançar um disco minúsculo. Para mim pode ser uma besteira, mas para Sean é algo importante. Meu garotinho gritou e pulou muito feliz por aí quando descobriu que morava do outro lado da rua de Malkin. Uma coincidência grande do destino, de fato. Sean ainda observou a casa por três dias seguidos para garantir que o morador era mesmo o grande Malkin.
- Ele ainda é seu amigo, querido. Ele é ficou surpreso que você tenha se metido em uma briga. - Deixo que meus dedos deslizem por seus fios macios antes de fazer a pergunta - Como Malkin foi parar na escola?
- Ele me deu o número dele para emergências. Quando o diretor disse que te chamaria eu liguei para ele. Era uma emergência. Então eu contei tudo e ele me disse que estava indo para a escola me ver.
- Eu estive pensando... Acho melhor você não ir a escola pelos próximos dias. - Hoje é quarta e o diretor não fez uma suspensão formal. Todavia, prefiro prevenir Sean de mais "incidentes" e encontros na sala do diretor - Volte na segunda-feira. Até lá seus machucados estarão melhores.
- Mas e o meu taco? Eles quebraram o presente que você me deu!
- Eu posso trabalhar um pouco mais e comprar outro. Você ainda tem os protetores, os patins e aquilo ali. - Indico por cima do ombro para o gol de hóquei de plástico em frente ao sofá-cama que eu durmo - Vai se sair bem.
- Vou ficar aqui sozinho enquanto você está no trabalho?
- Hm... Não. É uma surpresa e eu acho que você vai gostar muito de amanhã.
- Sério?! O que é?
- Se eu contar deixa de ser uma surpresa! Preciso voltar para o trabalho agora, consegue ficar sozinho aqui até eu voltar?
- Sim, senhora!
- Tudo bem. - Sorrio e beijo sua cabeça antes de levantar - Lembre-se de ficar longe do fogão e procurar a senhora Brown se precisar de algo. Se houver uma emergência, me ligue.
- Kim? - Sean me chama quando estou com a porta aberta para sair.
- Sim?
- Eu te amo.
- Eu também te amo, querido.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Apenas uma Chance - Os Jogadores #1
RomanceJoe Malkin viveu para o hóquei. Tudo em sua vida se resumiu ao jogo desde que ele consegue se lembrar, mas agora deseja mais. Como um dos astros na liga profissional, Malkin tem muitos fãs em suas costas, especialmente um garoto simpático que se mud...