Capítulo 5

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KIM BALDRICK

Deixo minha bolsa sobre a mesa perto da porta logo depois de entrar. Não é um lugar grande, mas é confortável o bastante, temos privacidade e este é um excelente bairro residencial, ideal para Sean crescer com segurança. Eu viveria muito mais estressada se tivesse que me preocupar com ele em uma vizinhança perigosa.

Olho seu pequeno e esguio corpo na pequena cama de solteiro. A madeira está gasta e os lençóis estão gastos por tantas lavagens, mas não temos dinheiro para repor com tanta frequência. Sean tem a cabeça enfiada debaixo do travesseiro.

Me aproximo com cautela e me sento no tapete de frente para ele. Meu irmão é tudo o que eu tenho de valioso. É difícil criá-lo, não posso negar, mas preciso ser paciente e lembrar que ele é apenas uma criança. Por mais esperto que meu garoto seja, ele ainda não entende nossos problema a fundo.

Estendo minha mão e acaricio seus cabelos. Sean recua um pouco no primeiro toque, ainda chateado comigo e sem levantar o rosto do travesseiro. Insisto em tocá-lo mais uma vez e alívio me preenche quando ele não se afasta.

- Sean. - O chamo, sem muito sucesso em conseguir que ele me olhe. Decido prosseguir mesmo assim - Eu confio em você, querido. Eu sei que sonha em jogar hóquei e sei como é importante para você, mas quero que esteja seguro. Por isso conversamos sobre não procurar o time da escola. Olhe para mim, querido.

Seus olhos úmidos encontram os meus. Seu rosto está vermelho e inchado pelo choro. Me parte o coração vê-lo com todos esses hematomas. Sean é meu garoto desde que veio ao mundo, meu para cuidar e proteger.

- Desculpe por ter te desobedecido.

- O que aconteceu na escola? - Continuo a acariciar seus cabelos.

- Eu queria provar que era bom. Queria usar o presente que você me deu. Meu equipamento é lindo, eu queria que você tivesse orgulho do que eu posso fazer e queria impressionar o Malkin.

- Conte-me como você conseguiu esses machucados Sean.

- O treinador me deixou jogar. Estava na metade do treino quando ele precisou sair para resolver alguma coisa e me deixou no gelo sozinho com os outros. Estava tudo bem até um deles falar que perdi uma boa jogada e me chamar de idiota. Eu tentei pedir desculpa, Kim. Eu juro que tentei, mas ele estava bravo e começou a me empurrar. Eu caí, ele pegou meu taco e o quebrou com a perna. Eu tentei parar ele, mas os amigos desse garoto me seguraram e ele começou a me bater.

- E o capacete?

- Era um treino simples, não precisava de capacete.

- O que aconteceu depois?

- Um deles perdeu o equilíbrio dos patins e escorregou no gelo, acabou me puxando junto e quando o treinador voltou, achou que eu estava tentando bater nele. Eu não fiz isso, Kim.

- Ai, Sean... - Solto um suspiro cansado. De repente eu preciso de uma boa noite de sono. Eu poderia dormir um pouco se não tivesse que voltar para o trabalho e repor as horas que estou perdendo fora.

- Você está brava comigo?

- Não estou brava por ter tentando treinar. Estou chateada porque me desobedeceu.

- Eu sinto muito.

- Preciso de mais que um pedido de desculpas, entende? Preciso que me mostre seu arrependimento.

- Como eu faço isso?

- Não me desobedeça mais. Quando quiser treinar venha falar comigo. Não faça as coisas escondido de mim outra vez. Eu confio em você, Sean e quero continuar confiando. É por isso que te deixo sozinho aqui enquanto estou no trabalho. Você é um garoto grande e sabe se comportar. Preciso ter uma babá aqui com você como se fosse uma criança pequena?

Não que eu tenhamos dinheiro para pagar uma babá. Ainda estou juntando para pagar o aluguel desse mês, mas uma tática muito útil que venho usando com Sean é fazê-lo se sentir um homenzinho. Treiná-lo com responsabilidades e prepará-lo aos poucos para os desafios da adolescência, juventude e vida adulta. Quero que meu irmão tenha uma vida muito melhor no futuro e se precisar trabalhar um pouco mais para que ele viva em uma bairro seguro, mesmo que de maneira humilde, é o que farei.

- Não. Eu não vou te desobedecer de novo. Eu prometo.

- Estou confiando em você.

- Kim, acha que Malkin não vai mais querer ser meu amigo?

Meu peito aperta com o medo em seus olhos. Joe Malkin é o ídolo de Sean desde que ele tinha idade para entender hóquei. Confesso que nunca assisti a um jogo, me parecia confuso entender porque homens crescidos corriam de um lado para o outro no gelo e se empurravam tentando alcançar um disco minúsculo. Para mim pode ser uma besteira, mas para Sean é algo importante. Meu garotinho gritou e pulou muito feliz por aí quando descobriu que morava do outro lado da rua de Malkin. Uma coincidência grande do destino, de fato. Sean ainda observou a casa por três dias seguidos para garantir que o morador era mesmo o grande Malkin.

- Ele ainda é seu amigo, querido. Ele é ficou surpreso que você tenha se metido em uma briga. - Deixo que meus dedos deslizem por seus fios macios antes de fazer a pergunta - Como Malkin foi parar na escola?

- Ele me deu o número dele para emergências. Quando o diretor disse que te chamaria eu liguei para ele. Era uma emergência. Então eu contei tudo e ele me disse que estava indo para a escola me ver.

- Eu estive pensando... Acho melhor você não ir a escola pelos próximos dias. - Hoje é quarta e o diretor não fez uma suspensão formal. Todavia, prefiro prevenir Sean de mais "incidentes" e encontros na sala do diretor - Volte na segunda-feira. Até lá seus machucados estarão melhores.

- Mas e o meu taco? Eles quebraram o presente que você me deu!

- Eu posso trabalhar um pouco mais e comprar outro. Você ainda tem os protetores, os patins e aquilo ali. - Indico por cima do ombro para o gol de hóquei de plástico em frente ao sofá-cama que eu durmo - Vai se sair bem.

- Vou ficar aqui sozinho enquanto você está no trabalho?

- Hm... Não. É uma surpresa e eu acho que você vai gostar muito de amanhã.

- Sério?! O que é?

- Se eu contar deixa de ser uma surpresa! Preciso voltar para o trabalho agora, consegue ficar sozinho aqui até eu voltar?

- Sim, senhora!

- Tudo bem. - Sorrio e beijo sua cabeça antes de levantar - Lembre-se de ficar longe do fogão e procurar a senhora Brown se precisar de algo. Se houver uma emergência, me ligue.

- Kim? - Sean me chama quando estou com a porta aberta para sair.

- Sim?

- Eu te amo.

- Eu também te amo, querido.

Apenas uma Chance - Os Jogadores #1Onde histórias criam vida. Descubra agora