LVII

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O grande salão não estava cheio como era de costume, ao menos, não cheio de pessoas. Haviam flores por todos os lados, velas em castiçais e um enorme tapete vermelho que ia do topo da escadaria até o altar improvisado onde Lucas me esperava, com toda sua pompa. Comandantes e sub comandantes de pé, alinhados lado a lado, aguardando a minha entrada, o rei James sentado, sem a minha permissão e erroneamente, em meu trono. Não lancei minha adaga em seu pescoço pois até o final da noite ele já não caminharia entre os vivos.

Meus passos vacilaram quando meu olhar encontrou o de Ezarel. Ele estava simplesmente lindo, usava suas vestes habituais, nos tons azul escuro e preto, as mãos cruzadas em frente ao corpo. Embora carregasse os ombros tensos e a expressão cansada, ele era a pessoa mais linda do mundo para mim. Respirei fundo quando ele desviou o olhar de mim, apenas realinhei minha caminhada e abri um sorriso falso. Enquanto andava, observei Deidra segurando o braço de Octavia, com mais força do que julguei necessária. Minha comandante da guarda da sombra olhava fixamente para James, sentado em meu trono, sua mão livre agarrando o punho da espada, ela poderia degolá-lo facilmente.

Finan sorria, percebi ser essa a reação que ele tinha sempre que sabia de algo a mais sobre qualquer coisa. Lucas parecia satisfeito com tudo, adiantou seus passos quando terminei de descer as escadas, mas Sihtric se adiantou e me estendeu o braço, mantendo meu noivo no lugar. Nevra não havia levantado a cabeça em nenhum momento, encarava as próprias botas e respirava devagar, como se tivesse medo que sua respiração fizesse barulho.

Sihtric me levou até Lucas, depois caminhou para o lado de Octavia. Segurei a mão que estava estendida para mim, meu noivo enlaçou nossos dedos e eu tive vontade de vomitar, mas respirei fundo e mantive o sorriso. James não se levantou para me receber, um sinal claro da falta de respeito que tem por mim, agora ainda mais. Em sua cabeça, eu devo ter me curvado para suas vontades e por isso ele é melhor que eu, também é por isso que ele vai cair.

Embora Lucas tivesse feito muito questão de trazer os costumes do cristianismo, eu não aceitei que um padre realizasse o casamento. Então, quando nosso ancião entrou no grande salão, acompanhado de seus aprendizes, todos respiraram aliviados, de certa maneira. Por mais que eu tentasse disfarçar pu desviar, meu olhar sempre retornava para Ezarel, ele respirou fundo quando me virei de frente para Lucas e me preparei para dizer as palavras tradicionais. Acredito que esse, entre todos os momentos terríveis pelos quais passei em minha vida, tenha sido o pior deles. Ver, nos olhos do homem que eu amo, a tristeza por algo que eu estava fazendo, mesmo que fosse durar pouco tempo.

Eu o entendo completamente. Nunca pensei em me casar, nunca almejei esse acontecimento, no entanto, se fosse para acontecer, não gostaria que fosse desse jeito. O casamento é um elo sagrado, que, embora um dia acabe, o tempo nunca vai ser capaz de apagar o momento em que aconteceu. E, de fato, mesmo que Lucas morra, o que vai acontecer brevemente, eu nunca deixarei de estar casada com ele, apenas ficarei viúva. Minha garganta quase travou quando precisei dizer os votos, quando tive que dizer sim ao homem covarde que sorria abertamente bem na minha frente. Lucas segurava minhas duas mãos de uma maneira possessiva, seu sorriso chegava a me assustar, ele não poderia estar mais feliz com tudo que imaginava estar conquistando ao conseguir essa aliança comigo.

Embora o beijo depois do sim não fosse um costume do meu povo, Lucas não esperou uma reação ou um consentimento, quando o ancião terminou de consagrar nossa união, ele me agarrou pela cintura e me beijou. E que beijo terrível, devo ressaltar, naquele momento constatei que a língua daquele homem só servia para dizer asneiras. Ouvi as portas do grande salão baterem com força, larguei Lucas e observei o salão, Ezarel não estava mais lá e Nevra caminhava rapidamente em direção a saída. Vi Sihtric encarar Octavia e logo depois sair apressado na mesma direção para qual os dois haviam ido.

O rei James finalmente se levantou do meu trono e abriu os braços, nos dando um abraço falso. Seu sorriso também era enorme, ele estava mais do que satisfeito com o que havia acabado de acontecer.

- Bem. - Lucas falou em alto e bom som, ignorando totalmente o fato de Ezarel e Nevra terem ido embora daquela maneira. - Agora que somos um só, gostaria de falar, por mim e por minha esposa. - Mordi minha língua para não xingá-lo naquele momento. Finan começou a rir, debochando do príncipe e levou um beliscão de Deidra. - Que se inicie o banquete.

Ele saiu me puxando pelo braço, o pai andando em nossa frente, como se tivesse se tornado dono do meu castelo. A mesa estava repleta de comidas deliciosas e, entre elas, a linda garrafa de vinho destinada a James, posta em frente a minha cadeira, onde eu sabia que ele iria se sentar. Nevra havia conseguido trazer Ezarel de volta, eles estavam nos esperando de pé, ambos inquietos e sem conseguir olhar diretamente para mim. O sorriso de James pareceu aumentar quando os viu daquela maneira e ele prontamente se sentou na cadeira na ponta da mesa, no meu lugar. O velho caquético parecia querer me mostrar que era mais forte, bem patético.

Me soltei de Lucas e fui para perto das minhas comandantes, elas conversavam com Finan e Sihtric, tentando acalmar os ânimos e manter as aparências, embora nenhum deles soubesse o que realmente iria acontecer naquele jantar, sabiam que havia algo grande pela frente. Uma tempestade.

- Noivinha. - Finan sorriu, erguendo sua taça de rum. - Devo parabeniza-la?

- Se quiser que eu corte sua garganta. - Respondi sorrindo.

- E agora? - Octavia perguntou, seus olhos varrendo o salão, estado de alerta.

- Esperem. - Disse calma. - Vamos comer.

Estávamos indo em direção a grande mesa quando Ezarel se juntou a nós. Ele parou ao meu lado, encostando o braço levemente no meu, chamando minha atenção.

- Parabéns pelo casamento, minha rainha. - Disse sem me olhar. - Devo me curvar ao novo rei?

- Não me trate assim. - Pedi e ele me encarou.

- Assim como?

- Com tanta formalidade.

- Me desculpe. - Suspirou. - Mas você é casada agora, devo respeito.

- Você vai pagar por isso depois. - Um sorrisinho brotou no canto de seus lábios e ele seguiu para a mesa, finalmente.

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