XXXIV

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Bem, o que posso dizer? Meses se passaram sem que meus olhos pudessem varrer as vastas terras de Eldarya, sem que meu olhar encontrasse o de Ezarel, sem que meu coração errasse uma batida a cada vez que Nevra se pusesse em minha frente. Minha esperança havia ido embora, me acostumei com a rotina com Finan, mas já estava me achando um fardo, acontece que Finan é um homem muito bonito e chama muita atenção entre as mulheres de seu povo, porém, todas elas possuem um respeito enorme umas com as outras, quando me veem perto dele, supõe que temos uma relação e não se aproximam dele. Finan não repara, mas uma mulher sabe quando a outra está interessada, é um instinto que não falha.

Eu já não acreditava mais que minhas pernas iriam voltar a funcionar, havia aceitado o destino que também já pertenceu a meu pai, talvez fosse uma maldição dos Deuses por eu ter enfrentado os reis, talvez o mundo realmente pertença ao homens.

Acordei lentamente, como já era meu costume, abri meus olhos devagar e suspirei pesado, levei as mãos aos cabelos e os empurrei para trás. Involuntariamente pus as mãos no colchão e impulsionei meu corpo para cima, no intuito de me sentar, ouvi o trote das patas de um cavalo passando por cima de mim. Era impossível esquecer que me encontro em baixo da terra, me locomovendo por túneis, como uma formiga. Principalmente por quê todos os dias podia-se ouvir os trotes de cavalos e vozes de pessoas pertencentes ao mundo acima de nós. No entanto, o que eu não esperava dessa vez, era reconhecer a voz que passava a cima de mim.

- Ember! - Ele gritava muito alto, acredito que Odin podia ouvi-lo, mesmo sentado em seu trono. - Ember! - Ezarel repetiu, eu reconheceria a sua voz mesmo depois de cem anos. Estava abafada e longe demais, mas era ele, ele estava me procurando. Ele não havia desistido de mim. O trote do cavalo ficou mais distante e aos poucos sumiu.

"Você pode ir para muito longe, mas o fio vermelho que conecta vocês, sempre o levará até você."

A voz de Mildred soou em minha cabeça e, de repente, eu entendi tudo. Tudo que não havia entendido antes. Ela não falou sobre Nevra naquele dia, nunca foi sobre ele. Tive um impulso de me levantar e correr para a janela, para gritar por Ezarel e dizer que estou viva, que ele me achou mais uma vez. Minhas pernas responderam a isso e meus joelhos se dobraram, para me dar impulso em cima da cama.

Incrédula, eu parei, olhos arregalados e coração acelerado, meu corpo me dizia que eu podia me mexer, mas minha mente tinha medo de que tivesse sido apenas reflexo ou imaginação.

Devagar, retirei o lençol de cima das minhas pernas e as encarei brevemente, decidi começar pelo básico, tentei mexer os dedos e eles mexeram, em seguida os joelhos e por fim dobrei as duas pernas, sim, agora eu podia ver, o movimento voltou e eu podia sentir até o sangue correndo nas veias. Desesperada gritei por Finan, considerando o tempo que passei na cama, ele já devia estar em frente a minha porta, ou no corredor.

- O que aconteceu?! - Ele abriu a porta e correu para dentro do quarto.

- Minhas pernas, Finan! - Sorri para ele. - Elas voltaram.

- O quê?! - Ele arregalou os olhos e começou a andar pelo quarto, sem saber o que fazer. - Você pode ficar de pé?!

- Eu ainda não me levantei. - O olhei com receio.

- Pois levante, oras! - Ele pôs as mãos no quadril e se pôs a esperar.

Lentamente comecei a empurrar minhas pernas para a beirada do colchão e apoiei meus pés no chão frio. A frieza fez meus dedos se contraírem um pouco e meus músculos tiveram o impulso de alçar minhas pernas, há tempos eu não sentia a temperatura do chão. Firmei meus pés no solo e me pus de pé, no início minhas pernas beberam e eu achei que não consiguiria, mas Finan se adiantou em me apoiar com seus braços e espero até que meu corpo se adptasse novamente com o ato de ficar de pé, sozinho.

- Pode me soltar agora. - Pedi a Finan.

- E então? - Ele me encarou com os olhos brilhates de entusiasmo.

- Acho que finalmente poderemos ir à Eldarya. - Abri um largo sorriso.

- Bem. - Ele sorriu. - Precisamos informar a anciã que suas pernas voltaram ao normal e preparar nossa partida. - Finan parecia tão empolgado quanto eu, creio que nós dois possuímos grandes motivos para estarmos contentes em sair daqui.

Não que eu não goste do povo Wonkru, eles me acolheram da maneira deles, mas não são o meu povo, o povo do qual eu sou a líder, um povo sem um líder é um povo perdido e um líder sem seu povo não é nada. Porém, devo minha vida aos Wonkru, e, por esse motivo, sempre que precisarem, terão meu apoio e minha devoção.

- Onde está a anciã? - A anciã é a lider do povo Wonkru, ela cuidou de mim enquanto eu estava desacordada, depois passou a tarefa para sua aprendiz, Emori.

- Deve estar no templo, precisamos ir logo, antes que ela inicie suas orações. 

- Então vamos. - Sorri. - Só preciso me trocar.

Coloquei uma roupa qualquer enquanto Finan me esperava do lado de fora do quarto. Mal conseguia conter a ansiedade por estar de pé novamente, por ter o controle sobre meu corpo. Meu coração batia descompassado só de ter ouvido a voz dele, de saber que estava mantendo sua promessa até agora, mesmo depois de tantos meses. Não cheguei a passar dois anos imobilizada, mas foram longos meses que me fizeram perder a conta e as esperanças.

- Eu ouvi Ezarel gritar meu nome hoje. - Contei. - Ele ainda está me procurando.

- Os guardas sempre veem cavaleiros por aqui. - Finan me olhou. - Parecem procurar por algo.

- Será que pertencem ao meu reino? - Eu não podia negar que estava feliz em saber que não haviam desistido de mim.

- Eu acredito que sim. - Ele assentiu. - A rota dos viajantes não se desvia da estrada e esses homens passam todos os dias por cima de nós, pelo lugar onde encontramos você.

- Finan, quem me achou naquele dia? - Essa curiosidade sempre esteve presente em mim, eu via a indiferença do povo Wonkru, eles não decidiriam me resgatar do nada.

- Emori te viu. - Ele disse. - Ela correu até nossa anciã e ela enviou suas curandeiras para buscar você.

- Por quê?

- Por quê Emori disse que você estava morrendo. O meu povo não tem o costume de salvar pessoas perdidas, isso pode revelar nossa localização, mas você é uma rainha cujo nome chega aos lugares antes da sua presença.

- Eu não estou entendendo.

- Te salvaram pela sua bondade, Ember. - Finan sorriu.

Saí cambaleando, como uma criança aprendendo a andar, Finan me apoiava segurando minha cintura enquanto eu reaprenda a ter segurança em minhas pernas. Tentamos conter nossa ansiedade quando paramos em frente as grandes portas do templo, era um lugar sagrado e precisávamos demonstrar respeito. O rapaz apoiou a mão em minhas costas me dando apoio moral, eu deveria entrar primeiro, falar como uma rainha e, o mais importante, precisava interceder por ele, para que me acompanhasse.

Jamais deixaria Finan aqui depois de tudo que ele fez por mim.

Realm of EmberOnde histórias criam vida. Descubra agora