Após um tempo de conversa, todos os reis partiram, exceto o rei James de Sipra. Este e seu filho Lucas solicitaram uma audiência comigo.
- Sabe qual é o assunto dessa audiência? - Perguntei a Deidra.
- Imagino que seja uma oferta de aliança. - Ela suspirou.
- Isso não é bom. - Estalei a língua e neguei com a cabeça.
- Você vai recusar, não é? - Uma pergunta retórica.
- Sim. - Assenti.
- Estarei do lado de fora da sala o tempo todo, se algo sair do controle, grite por mim. - Deidra parou antes que sua imagem aparecesse na entrada da sala.
- Tudo bem. - Sussurei para ela e entrei.
- Majestade. - Ambos me reverenciaram.
- Por favor, sentem-se. - Me dirigi até minha cadeira e sentei frente a eles. - Qual o motivo de tal solicitação?
- Bem, majestade. - Rei James adquiriu uma postura convencida e sorriu. - A senhorita sabe bem que o reino de Sipra produz o bronze de todas as armas usadas pelos nove reinos e que somos muito ricos.
- Sim. - Me esforcei para não revirar os olhos.
- Imagino que seria de grande valia para Eldarya formar uma aliança com o meu reino. Através de seu matrimônio com meu filho, Lucas. - Olhei para o príncipe que sustentava no rosto o mesmo sorriso prepotente do pai.
- Além do mais, majestade. - O príncipe Lucas iniciou sua fala. - Casando-se comigo, a senhorita se livrará das obrigações massivas de comandar um reino, deixando-o em minhas mãos. Um trabalho tão pesado certamente não deveria estar nas mãos de uma mulher. - Ele olhou para o pai como se buscasse aprovação para seu discurso.
- Senhores. - Lhes dei um sorriso. - Com todo respeito que tenho pelo reino dos senhores, devo lhes dizer que não há nenhum interesse da parte de Eldarya em firmar qualquer aliança.
- Com todo respeito, rainha Ember. - James continuou. - A senhorita já está na idade de se casar.
- Majestade.. - Lucas sorriu. - Se não aceitar nossa proposta, seremos obrigados a convocar um levante pelo não cumprimento da lei real. - Seu pai sustentava um sorriso maldoso.
- Os senhores, por acaso, estão me ameaçando em meu próprio reino? - Pus as mãos calmamente em cima da mesa.
- Mas é claro que não, alteza. - Rei James alargou mais seu sorriso. - Apenas estamos lhe avisando das medidas cabíveis dentro das leis reais.
- Estamos cientes de que nove reinos contra um se trataria de uma injustiça , mas é o que a lei ordena. - Lucas tentava manter o rosto passivo, mas no fundo estava adorando o que estava acontecendo.
- Mais uma vez senhores irei repetir. - Respirei pesadamente e os olhei. - O reino de Eldarya não precisa de alianças e a rainha de Eldarya não se casará com nenhum dos príncipes herdeiros inúteis. Não me subjugarei a homens tão tolos.
- Pode se arrepender dessas palavras se não as retirar, majestade. - James me falou em tom de ameaça.
- Eu não as retiro, Rei James. Eldarya é mais poderoso do que todos vocês juntos. Eu não tenho medo homem nenhum! - Os reis se julgam deuses por possuírem controle sobre um povo. Como se tivessem vindo do céu para governar a terra. Uma grande besteira.
- Bem, majestade. - James se levantou. - Não nos resta outra escolha a não ser destruir seu reino.
- E quando isso acontecer, tenha certeza de que não será poupada, sua meretriz. - Lucas cuspiu as palavras, tentando, inutilmente, me atingir.
- Ah, o principezinho não suportou o primeiro não que recebeu na vida? - Encarei Lucas com desdém. - Supera, garoto.
- Sua cabeça será impalada, juntamente com as de suas comandantes. - James quase rosnou.
- Senhores, eu derramei do meu próprio sangue para estar com essa coroa na cabeça. Acho melhor se retirarem do meu reino antes que eu derrame o sangue de vocês também. - Me levantei e fui abrir a porta.
Do lado de fora estavam Nevra e Deidra, ambos puseram as mãos nos punhos de suas espadas e encararam os nobres que saíam da minha sala.
- Você pagará por recusar nossa proposta, Rainha Ember. Você cairá. - Rei James saiu apressado, acompanhado de seu filho inútil.
- Jus drein, jus daun. - Foi a minha resposta. - Desgraçado.
- Nós estamos sob ataque, não estamos? - Deidra me encarou.
- Ainda não, mas em breve estaremos. - Respondi e um frio varreu minha espinha.
Desde que assumi o trono, nunca houveram guerras. Algumas batalhas por território, reuniões um pouco tensas demais com os reis de vez em quando e sempre uma pressão enorme sobre a rainha solteira que insistia em não constituir matrimônio. Nenhum deles havia tido coragem de me desafiar ou de me ameaçar, até hoje. Eu não sei lidar muito com provocações, principalmente quando tentam ferir minha honra ou me coagir e reagi da maneira que fui ensinada por meu irmão. Sem recuar.
" Ataque rápido, ataque forte, sem piedade."
Demonstrar piedade era um ato de fraqueza na visão da maioria das pessoas, no entanto, nesse quesito eu discordava até mesmo de meu irmão. A piedade é o mais nobre dos sentimentos, a mais revolucionária das ações, justamente por que quase ninguém a merece. Meu coração pesou ao perceber que, nesse caso, eu não poderia me dar ao luxo de ter piedade por qualquer um dos reis que ousasse me desafiar. Meu reinado só estaria seguro quando suas cabeças estivessem cortadas de seus corpos, pois, caso contrário, seria a minha.
Bjorn a essa altura estaria vibrando e correndo para reunir seus homens no salão comunal. Eles beberiam, gritariam como loucos e fariam sacrifícios aos deuses, se preparando para uma batalha violenta e sangrenta, que os deixaria satisfeitos com a própria vida. Para nosso povo, morrer em batalha é o jeito mais honroso de passar para o outro lado, pois, nossa valentia nos daria passagem livre para os portões de Valhala e lá seríamos recepcionados pelo próprio Odin. A falta de medo pela morte nos tornava assustadoramente corajosos, beirando a loucura na maioria das vezes, soldados inimigos se assustavam muito mais por essa coragem exacerbada do que pelas habilidades dos guerreiros. Embora, a violência e a força utilizadas em seus golpes também não deixavam a desejar.
A virilidade dos homens vikings era apreciada em todos os lugares do mundo. Nossos nomes eram temidos, sussurrados pelos cantos, pois a menção em voz alta poderia ser trazida pelo vento até os nossos ouvidos. Mas, as mulheres não eram tidas como guerreiras, na verdade, pouquíssimas conseguiam se destacar no campo de batalha. Isso começou a mudar quando meu irmão simplesmente ignorou as regras e começou a me ensinar a lutar. Ele também tentou convencer Elsa, mas ela preferia se sentar no trono e mandar nas pessoas como se fossem bonecos de xadrez. Ela nunca aprendeu absolutamente nada sobre estratégia, defesa pessoal e regência, tudo que ela queria era simplesmente colocar a coroa na cabeça e depois que conseguiu, não soube mais o que fazer.
Agora eu precisava mostrar o meu valor, precisava organizar o tabuleiro de acordo com as minhas regras e colocar cada um dos reis que ousar me desafiar em seu devido lugar.
Jus drein, jus daun.
Sangue se paga com sangue.