Capítulo 18 - Charlie

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Pela milionésima vez naquele dia, Charlie se beliscou levemente, para ter certeza de que não estava sonhando. Porém, a escadaria de pedra sob seus pés continuou a mesma e o gramado verdejante cheio de pessoas continuou barulhento e movimentado. Arrumando a alça de sua mochila em seu ombro, assim que chegou no último degrau, ela fez questão de se virar e admirar o complexo de pequenos prédios da área destinada aos cursos de biologia novamente. Ao longe ela conseguia enxergar o sol da tarde batendo nas muitas janelas do prédio de medicina veterinária, de onde ela tinha acabado de sair, depois de um dia cheio de aulas introdutórias e apresentações que tinha passado rápido demais.

Quando buscava na memória, parecia que ontem mesmo ela ainda estava de mãos dadas com seu avô Aiden, aprendendo a andar a cavalo, alimentar os porcos e tomar conta dos cachorros da fazenda. E agora ali estava ela, a apenas alguns semestres de distância de se tornar uma veterinária, como vinha sonhando desde que conseguia se lembrar. Um sonho que a havia acompanhado até mesmo depois que seu avô tinha morrido e Anthony tinha deixado bem claro que não ia desperdiçar dinheiro pagando um curso que iria formá-la em uma profissão que não traria posses ou status para o precioso sobrenome Manson. Mas ali estava ela. Com a mochila lotada de livros sobre a anatomia de mamíferos e o nome Charlotte Dawn Foster Sullivan assinado em cada um de seus documentos de inscrição, sem qualquer menção aos Manson.

Ela ainda estava um pouco reticente em deixar Morgan pagar por tudo aquilo, já que aquilo a fazia sentir como se ele tivesse alguma obrigação quase parental com ela, como um adulto se responsabilizando pelos estudos de uma criança. Mas, ainda assim, agora que ela tinha finalmente dado o primeiro passo em direção a seu sonho, não havia como voltar atrás...

Não, tudo ficaria. Ela o pagaria por aquilo, em um ano. Nem que fosse na cama.

Se ele apenas voltasse a agir normalmente com ela de novo...

— Charlie!

O som de seu nome chamou de sua atenção e ela se virou para ver duas garotas descendo as escadarias. Ela as reconheceu como suas colegas de turma, mas só conseguiu se lembrar do nome de Emma, a garota esguia de cabelos castanhos encaracolados e óculos, que a havia ajudado a encontrar o laboratório onde elas teriam sua primeira aula. Já a segunda garota, com o cabelo loiro levemente alaranjado e uma expressão entediada, tinha se sentado ao lado dela no auditória para assistir o discurso de inauguração de aulas do reitor, mas elas não tinham trocado uma única palavra, até Emma encontra-las e as apresentar.

— Oi, Charlie. Você já está indo embora? — Emma perguntou, quando as três ficaram cara a cara — Eu e Ava estamos indo até os nossos dormitórios. Quer com a gente? — ela perguntou, com um sorriso simpático — Em qual dos quartos você está ficando?

— Hã, na verdade, eu já vivia na cidade, então não precisei alugar um dormitório... — Charlie explicou, um pouco constrangida — Eu já moro com meu marido, então...

— Oh, você é casada? — Emma perguntou, parecendo surpresa, mas não desdenhosa, muito diferente de Ava, que ergueu uma sobrancelha como se estivesse olhando para uma idiota.

— E quantos anos tem o bebê? — a colega de Emma perguntou, ganhando um olhar enviesado da amiga.

— Não temos filhos ainda. — Charlie rebateu, encarando-a sem vacilar — E eu não me casei porque estava grávida, se é isso o que você está insinuando.

— Hã... Então, Charlie... — Emma emendou, parecendo ansiosa para amenizar o clima tenso que pairava no ar — Nós ouvimos falar que os veteranos vão dar uma festa de boas-vindas em uma das fraternidades hoje. Você quer vir com a gente?

— Oh, eu não sabia... — Charlie perguntou, surpresa pelo convite. Quando ela costumava sonhar sobre a faculdade, tudo o que lhe vinha à mente eram os estudos e a formatura, mas é claro que havia muito mais. Na verdade, era muito provável que as outras garotas de sua idade estivessem mais ansiosas para ir para festas como aquela, do que com aprender a fazer uma cirurgia de alto-risco no bichinho de estimação de alguém — Bom, eu não estava planejando ir, mas... Também não tenho nenhum plano para hoje... — ela ponderou, sentindo a tristeza a tomar ao pensar que teria voltar para casa naquele dia tão feliz e encontrar o olhar nervoso e a atitude esquiva de Morgan em casa — Quando vai ser, exatamente?

Como Seduzir o Seu MaridoOnde histórias criam vida. Descubra agora