O beijo não durou muito. Apesar do meu corpo ficar repleto de desejo, o empurrei para longe, cambaleando para trás até bater contra a penteadeira. Seus olhos me encararam confusos, como se por alguns segundos ele esperasse que eu dissesse sim. Seus lábios estavam avermelhados e úmidos, parecendo tão convidativos quanto antes.
—Saia do meu quarto. —Mandei, erguendo o queixo enquanto meu peito subia e descia. —Saia!
—Eva... —Ele deu um passo na minha direção e eu o lancei um olhar de alerta, o fazendo parar. —Por quê? Por que eu sou um elfo? Qual o problema? Você me deseja também, isso é um fato.
—É, tem razão. Eu desejo você. Mas isso não significa absolutamente nada pra mim, Seth. Sabe por quê? —Parei na frente dele, abrindo um sorriso dolorido. —Mesmo que eu durma com você, quando eu acordar na manhã seguinte vou continuar imaginando como matar você e toda sua família.
—Não sou seu inimigo, princesa. —Afirmou, com o rosto se curvando em uma expressão dura. —Vai perceber isso mais cedo ou mais tarde.
—Vou? Será? —Soltei uma risada, balançando a cabeça negativamente. —É tão engraçado o quanto você está disposto a ser gentil comigo. Esse é seu problema, Seth. Você é gentil demais. Prestativo demais. Inocente demais. E ninguém, absolutamente ninguém é assim de graça! —Encarei os olhos dele, ignorando todos os sentimentos que passavam lá. —Sabe quem também era assim? Seus pais eram, antes de traírem os meus. Quero que entenda uma coisa. Não me casei com você porque sinto algum desejo, me casei com você porque você era a única maldita chance que eu tinha de sair daquela torre. Só isso. Não sei porque está fazendo tudo isso, Seth. Mas não me obrigue a acreditar que tudo isso é de graça.
—Não é de graça. —Rebateu, cerrando os punhos e eu ergui as sobrancelhas.
—E é por que então? Conta. Você não disse que quer que eu confie em você? Então... —Ele ficou em silêncio, me fazendo dar um passo para trás e rir. —Saia do meu quarto. Esse beijo é a única coisa que você vai ter de mim.
—Eu te disse. —Ele me encarou, negando com a cabeça. —Vou te mostrar que pode confiar em mim, mesmo que pense que não. Uma hora ou outra, vai abrir os olhos.
Ele soltou uma respiração pesada, virando as costas. Observei a porta de acesso ao quarto dele ser fechada com força, antes de soltar a respiração e desabar sobre a cadeira em frente para a penteadeira. Quando enfim consegui pensar com clareza, puxei minha mão que estava para trás das minhas costas, encarando a lâmina da faca que eu havia roubado dele enquanto o beijava. Seth sequer notou quando a tirei do seu cinto.
—Vou conquistar meus próprios aliados. —Afirmei, ficando de pé e puxando os lençóis da cama para o chão, os deixando de frente para a lareira. Então peguei o travesseiro e me deitei ali no chão, colocando a faca embaixo do mesmo.
[...]
Desviei de um grupo de elfos no jardim, enquanto tentava parecer minimamente simpática com todos eles. O jardim estava cheio, com mesas por todos os lados, criados andando de um lado para o outro servindo bebidas. Mesmo ao ar livre eu estava me sentindo sufocada ali. A rainha achou justo chama todos esses elfos para os jardins do castelo nessa tarde, porque achava prudente que eu conhecesse cada um deles direito. Como se o casamento ontem já não tivesse sido o suficiente.
Olhei para o outro lado do jardim, vendo Seth conversando com um elfo mais velhos de cabelos brancos. Ele olhava na minha direção a cada segundo, enquanto eu tentava fingir que não estava me importando com o circo que a rainha havia criado de propósito.
—Vossa alteza! —Alguém falou atrás de mim, e eu respirei fundo para me controlar, antes de me virar.
O elfo atrás de mim parecia uma parede de músculos, muito mais alto que eu. Os cabelos castanhos eram longos até o queixo e parte dele estava preso para trás, me deixando encarar o rosto bronzeado e os olhos escuros.
—Zion, vossa alteza, general do exército do rei. É um prazer conhecê-la. —Ele fez uma reverência, enquanto eu franzia a testa.
—Senhor. —Acenei com a cabeça. —General do exército?
—Sim, eu estava em uma missão fora do reino e não pude estar presente no casamento ontem. —Ele sorriu, me olhando com certo tom de malícia. —Uma pena. Eu e o príncipe temos uma grande amizade.
Ele estava mentindo. Ou talvez querendo ser apenas sarcástico. De qualquer forma, era óbvio que havia uma coisa completamente errada ali. Encarei ele com um pouco mais de atenção, o sentindo um pouco familiar. Quando olhei para Fitzy, a alguns metros de mim, vi apenas o movimento mínimo da cabeça dele, em um sinal de alerta.
—Não perdeu nada, posso garantir. O casamento foi um pouco às pressas. —Falei, dando de ombros. —Sua majestade estava um pouco ansiosa.
—A rainha é um doce. —Ele soltou uma risadinha, antes de desviar os olhos para algo atrás de mim. Não demorei a sentir a presença de Seth ali. —Vossa alteza.
—Que bom que chegou, Zion. Quero falar com você a sós. —Seth murmurou, tocando de leve na minha mão, enquanto mantinha os olhos no general.
—Agora, vossa alteza? Acabei de conhecer sua esposa. —Zion sorriu, parecendo animado com algo. —Entendo como se apaixonou tão rápido. Ela é tão adorável quanto dizia.
—Você nem faz ideia. —Seth afirmou, deixando claro que queria dizer mais do que estava dizendo de fato. Tentei saber se aquilo era uma provocação ou um elogio, mas Seth se afastou de mim, indicando que Zion o seguisse.
—Princesa, nos vemos por aí. —Ele fez uma reverência, antes de seguir Seth para dentro do castelo.
Ignorei o arrepio de repulsa que passou por mim, sem eu sequer saber nada sobre ele. Fitzy estava olhando para a entrada do castelo onde eles sumiram quando me aproximei.
—Algum aviso sobre o general? Ele e Seth não aparecerem se gostar. —Falei, sentindo pela primeira vez uma mudança em Fitzy, quando ele ficou subitamente tenso.
—O general é protegido do rei. —Fitzy murmurou, evitando olhar pra mim. —E ele não tem uma boa fama com os empregados.
—O que quer dizer? —Indaguei, olhando pra ele com as sobrancelhas erguidas. —Fitzy?
—Acho que você deveria falar sobre isso com o príncipe, vossa alteza. Algumas coisas são sérias demais para serem ditas por um simples guarda. —Afirmou, fazendo meus lábios se comprimirem com a sensação ruim que queimou no meu estômago.
Desviei os olhos dele para o jardim cheio de elfos, percebendo que alguns me olhavam e outros pareciam indiferentes à mim. Ignorei todos eles quando vi a silhueta pálida e silenciosa de Violet, escondida entre os arbustos, parecendo se divertir com algo.
Quando nossos olhares se encontraram, ela sorriu com o canto dos lábios, erguendo uma das sobrancelhas em um tom sugestivo, como se deixasse claro que haviam conseguido o que eu queria.
Continua...
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O Trono da Rainha
FantasyEvangeline Hayes tinha uma certeza, mesmo que seus dias sejam na cinzenta torre que a aprisiona, ela é a verdadeira dona do trono que Castiel Ferraz usurpou de seus pais. Crescendo entre as paredes frias de pedra e sem contato com ninguém a mais de...