Capítulo 68: A coroa está manchada de sangue.

1.3K 264 40
                                    

Seus lábios estavam unidos em uma linha fina e seu rosto perdido, confuso. Ela olhou diretamente para os meus olhos e percebi pela primeira vez todas as coisas que Seth havia puxado dela. A mesma curva fina e elegante do nariz. O mesmo formato dos olhos, além da curva acentuada da orelha elfa que era exatamente igual.

—A coroa está manchada de sangue. —Ela sussurrou, flutuando para perto daqueles tronos solitários que eram devorados pela noite. —Manchamos ela quando nos tornamos rei e rainha e você fez a mesma coisa para toma-la de volta.

—Ela sempre foi minha por direito! —Sibilei, observando o fantasma da rainha que parecia apenas uma ilusão da minha cabeça, mas eu sabia que ela era real. —Por que ficou?

Quando meus pais foram assassinados, por algum motivo eu ainda esperava que eles decidissem ficar como almas nesse mundo e aparecessem naquela torre para me ver e me fazer companhia. Mas os dois partiram. Nenhum deles quis ficar nesse mundo.

Ela parou ao lado do trono que antigamente ocupava e que agora seria de Seth por direito, como meu príncipe consorte. Ela o avaliou com os olhos apagados e vazios, antes de abrir um sorriso dolorido e fraco, trazendo os olhos de volta para os meus.

—Ele me envenenou. —Sussurrou, com a voz carregada de dor. —E ele avisou meu filho de que faria isso. Meu próprio filho sabia o que iria acontecer e não fez absolutamente nada para impedir. —Afirmou, enquanto eu sentia meu coração despencar do peito e o sangue sumir do meu rosto ao ouvir aquilo. —Não precisa ficar assustada, havia uma única taça envenenada e o rei sabia qual delas era. Seth não pensou em me salvar, mas ele teria corrido para salvar você se estivesse em risco. —Ela riu, com os lábios se comprimindo. —Mas ele sabia. Ele mandou um guarda avisa-lo do que ia acontecer no meio do baile. Você se lembra, não é? Ele não estava lá quando tudo aconteceu, porque estava sendo avisado do que iria acontecer. —Os olhos dela brilharam em dor e raiva. —E eu tive que ouvir os guardas contando mais tarde como Seth não expressou absolutamente nenhuma emoção quando contaram a ele. Como ele não fez esforço nenhum para tentar impedir. A única coisa que ele perguntou foi de você. A única coisa que ele fez foi gritar com os guardas para saber se ele tentaria envenenar você também...

—A culpa disso tudo é absolutamente e somente sua. Você usou seu filho quando ele era apenas uma criança ingênua que não fazia ideia do que as próprias ações podiam causar. —Afirmei, cortando qualquer outra palavra que ela pudesse dizer. —Se ele a odeia tanto para não se importar com sua morte, a culpa é sua por ter sido uma mãe horrível.

—Não importa mais. —Os lábios dela se curvaram em um sorriso maior. —Eu estou morta e ainda ganhei alguma coisa. Meu filho virou príncipe consorte e os herdeiros dele se sentaram no trono. —Ela deu de ombros, olhando no fundo dos meus olhos. —Agradeço a você por isso. Você sempre agiu como uma rainha de verdade.

—Onde ele está? —Indaguei, sentindo aquela adaga na minha mão ficar mais pesada.

—Ele está fugindo por onde tudo começou. —Os olhos dela encaram acima do meu ombro, como se ela pudesse ver a luta que acontecia lá fora. —Corra, Evangeline. Seth sabe pra onde ele está indo e pretende matá-lo com as próprias mãos.

Eu olhei para trás de mim na mesma hora que a rainha desapareceu, me dando conta que Seth havia sumido no meio da confusão no corredor, depois que soltei sua mão. Meu coração disparou quando percebi que sabia pra onde o rei estava indo, antes de eu disparar por uma das portas laterais da sala do trono para ir atrás dos dois.

Meu coração acelerou a medida que eu atravessava os corredores até dar de cara com vários elfos e humanos brigando. Não pensei muito e apenas corri pelo meio deles, desviando das flechas e empurrando quem estava no caminho antes de trombar contra uma porta e entrar em um cômodo que parecia ser uma simples sala.

Agarrei uma cadeira e lancei contra as janelas, vendo elas se estilhaçarem. Então pulei a janela para o jardim, sentindo os cacos de vidro cortarem minha pele. Cai de joelhos entre os arbustos e flores, me levantando e voltando a correr. O labirinto estava completamente dominado pelo breu, enquanto eu me surpreendia com o quão vazio aquela parte do jardim estava. Alguns poucos criados corriam por ali tentando se esconder.

Eu disparei pela entrada do labirinto, sentindo meu coração chegar a garganta. Tudo estava escuro demais, com o ar gélido da noite e o som da batalha ao longe. Parei de correr quando cheguei a uma bifurcação, começando a me perguntar se o rei teria sido óbvio ao ir atrás da passagem secreta ou teria preferido se esconder.

Segui aqueles muros vivos na direção que eu sabia ficar o centro do labirinto, enquanto tentava fazer silêncio e ouvir qualquer som que fosse ao meu redor. Meus machucados queimavam e minha garganta doía, mas tudo que eu precisava fazer era seguir em frente até que tudo isso enfim terminasse.

Parei de andar, me virando para olhar para trás quando meus pelos se arrepiaram com o som baixo de passos. As bifurcações ao meu redor estavam completamente escuras, não me permitindo ver muito longe. Virei de volta pra frente quando um vulto atravessou uma das bifurcações, fazendo meu coração doer de tão rápido que estava batendo.

Eu me virei para o outro lado e depois para o outro, erguendo aquela adaga quando percebi que havia alguém ali. Mas quando me virei uma última vez meus olhos finalmente encontraram a figura no meio da noite, entre aquelas paredes de arbustos, com os olhos tão iluminados na minha direção e um sorriso lascivo nos lábios.

Meu sangue gelou quando meus olhos lentamente se abaixaram até suas mãos. Seus pulsos estavam envolvidos por um bracelete de ferro, enquanto o lugar onde deveria estar aqueles tocos de dedos que haviam restado depois que os cortei, haviam duas lâminas que pareciam brilhar com o tocar da luz da lua, fixas naqueles braceletes como armas.

Zion deu um passo na minha direção e eu ergui ainda mais a adaga, mesmo que soubesse que não havia chance alguma minha de o vencê-lo. Ele iria me matar se pudesse. Mas primeiro ele teria que me pegar. Então eu me virei e corri, vendo o momento que ele disparou atrás de mim, pronto para me matar.



Continua...

O Trono da Rainha Onde histórias criam vida. Descubra agora