Ao longe

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Eu o sentia forte, seu calor intenso, seu cheiro suave, como se estivesse embalado em meus braços, firme em minhas mãos enegrecidas, algo meu havia surgido ao longe e eu o ouvia me chamar constantemente, por noites atormentou meus sonhos, sua risada aconchegante já ecoava em minha mente, meu cerne estava mais atribulado do que jamais estivera, me puxava, exigia minha presença em algum lugar que não era ali, sentado em meu confortável casarão de pedras e por fim eu já sabia: era meu, aquilo era inteiramente meu, minha fagulha e eu iria onde fosse necessário por ela.

Parti na direção em que aquela bússola de sentimentos me impulsionava, mas não sabia como faria, eu simplesmente não sabia o que estava procurando e torcia para que aquilo se revelasse óbvio no momento que chegasse. Como ele seria? Criança, adulto? Humanóide ou animalesco? Não me importava sua aparência, eu só queria protegê-lo, dar a ele a melhor vida possível, ajudá-lo a compreender sua função, qualquer que essa fosse, faria tudo que estivesse ao meu alcance e além dele. Será que ele também me buscava? Será que ele sabia da minha existência? Eu sentia que ele se movia lentamente, talvez também estivesse à minha procura e isso me animou, me aqueceu, me deu esperanças.

Segui para o Sul, eu tinha pressa, a ansiedade já me tomava, mas ao passar pelas campinas humanas, uma chuva torrencial me assolou e, por mais que eu pudesse andar sob ela, eu me sentia fraco e exaurido, ela me era antinatural, me repelia ferozmente e acabou por me obrigar a parar em um casebre abandonado qualquer a fim de uma precária proteção. Sempre, sempre a maldita chuva gélida atrapalhando-me! Parecia que o maldito Deus das Água tinha algum prazer mórbido em se por no meu caminho, mesmo que eu duvidasse que ele soubesse ou se importasse com minha movimentação, eu não era nada para ele, assim como ele não era nada para mim além de uma lembrança ruim, uma série delas eternamente lembradas. Mas esse momento de pausa forçada deu-me tempo para pensar sobre o ser que me convocava tão arduamente, ele com certeza assemelhava-se comigo em seu nascimento, pois assim como eu, ele não parecia ter sido criado nessa linha temporal, pois ele certamente existia e eu ainda não o havia feito, eu ria comigo ali encolhido, nunca havia sentido essa ligação, porém eu nunca havia tido filhos sem ser por criação de Emeritus e agora...algo me dizia que esse ser era diferente, era algo único e especial, apesar de eu não me relacionar com nenhuma entidade e não ter interesse em fazê-lo, o amor ainda me era uma barreira alta, mas eu sabia que o Destino e o Tempo estavam reservando algo para mim nesse futuro e também fiquei curioso sobre essa pessoa que junto de mim geraria essa nova criatura. Seria alguém novo em minha vida ou alguém que já estava em meu convívio? Pois eu deveria vir a amá-la verdadeiramente a ponto de gerar um ser com ela e isso fez-me sentir estranho, pois eu só havia sentido essa paixão uma única vez a tantos milênios que eu já não esperava por ela novamente, no meu íntimo eu não a queria. Essa era uma preocupação que eu deveria deixar para o futuro que viria certo, meu foco agora era outro e eu não poderia me deixar distrair por outras tramas.

A chuva finalmente demonstrava sinais de calma, o Sol já iluminando os campos com seus raios brilhantes, então cobri meus cabelos loiros com o capuz negro, meus chifres ainda a mostra, o chão elameado sujando minhas botas, o caminho talvez ainda fosse longo, talvez eu o encontrasse na próxima esquina, talvez daqui dias, talvez daqui horas, então apenas parti em busca do desconhecido que já possuia todo meu amor e apego.

Em breve, eu finalmente voltaria para meu reino com meu primeiro filho, custe o que custar.

Waterdrop Firedrop (Rain x Sodo)Onde histórias criam vida. Descubra agora