O dia amanheceu torrencialmente chuvoso, e Fire não pode deixar de notar isso quando acordou envolto pelos braços fortes de Water, escutando o gotejar dentro do quarto, cada vez mais intenso e surpreendentemente, ambos os corpos haviam equilibrado a temperatura, colocando-os em perfeita sinergia, como se fossem um só corpo, mesmo que nada além de abraços e alguns beijos tenham acontecido na madrugada que os seguiu. Naquela manhã, seus cernes moviam-se na mesma frequência, se reviraram na mesma agitação, se atraiam como se pertencessem ao mesmo mar.
-Você não está facilitando para que eu deixe sua cama, Rain. Prendendo-me aqui com essa tormenta e um ninho quente? Jogo baixo.
-Nada estou fazendo, Sodo- respondeu sonolento, buscando ainda mais proximidade, os dedos traçando padrões suaves na pele do outro- Estou apenas sentindo a sua partida com toda minha alma. Que culpa carrego se o mundo reage a minha dor? Que deixo-vos claro, não é pouca.
-Tão exagerado, minha Chuva.- afirmou deixando seu nariz tocar levemente no de Rain, que aproveitou para roubar um beijo e o que deveria ser um simples selar de lábios acabou se tornando um beijo intenso, o vapor formando-se em suas bocas, escapando pelos cantos, as mãos de Fire contornando sua cintura marcada, deslizando para sua bunda, pressionando-a.
-Ei!
Fire ria no meio do beijo, separando-se quando faltou-lhe o ar.
-Não, Sodo, ainda não...
-Sobre o toque ou sobre minha partida?
-Os dois, seu tolo!
Deixando Rain com um biquinho na cama, Fire por fim se levantou, espreguiçando-se. O amante o observava atento, vendo o Senhor do Fogo banhando pelos primeiros raios de sol que surgiam por entre as nuvens e pareciam buscar teimosamente contato com sua pele clara, deixando-o com uma aparência selvagem e divina, deixando-o radiante, mesmo em um dia emburrado.
-Já falou com nosso filho, Sodo?
-Conversei com ele ontem a noite, antes de vir ter-te. Nossa gotinha flamejante irá precisar muito de você nos próximos dias.
-E eu estarei com ele- afirmou Water, tocando o chão úmido com seus pés descalços. De repente, o frio o despertou, de repente percebia que preferia o calor, mas não qualquer calor, mas aquele que se formava à volta de Fire. E aquela era a última oportunidade de senti-lo antes dele ir para longe.
Passo após passo, Water foi até Fire, ainda envergonhado, abraçando-o, colando seu peito às suas costas, beijando-lhe a nuca suavemente, por entre seus cabelos dourados com aroma de fim de tarde.
-Isso é realmente verdadeiro, Fire?
-O que eu sinto? Tanto quanto o Sol que brilha sobre nós a cada dia.
Mais beijos, que mais pareciam carícias com seus lábios, tamanha a brandura que empregava.
-Não está se divertindo comigo como vingança, está?
Aquela maldita ideia começou a atormentá-lo, tão inseguro, tão incerto quando se tratava de amor. Justo o amor, tão impiedoso com o Water Ghoul.
-Eu jamais o puniria assim, jamais usaria da tua entrega como arma, do teu amor como falsas juras. O passado me dói, Rain, ainda o sinto, mas também sinto esse incêndio que se inflama sempre que você está por perto, mesmo que eu tentasse empurrar isso para o lugar mais escuro do meu cerne e os deuses sabem que tentei, mas eu dormia vendo teu rosto, acordava ouvindo sua voz, pegava-me encarando-o por mais tempo que seria apropriado e tivemos aquele beijo no Castelo do Ar... e desde então...
-Eu mesmo não sabia, mas aquilo foi legítimo. - confessou Rain- Aquilo se perdeu do meu controle assim que descobri teu gosto.
-E qual é, minha Chuva? Qual meu gosto que hoje serpenteia em tua ferina língua?
Fire, segurando as mãos que o abraçava, começara a dançar lentamente, uma música que pertencia apenas aos dois, que parecia tocar unicamente em seus âmagos em sincronia.
Com ternura, Water considerou a pergunta por um momento, como se estivesse saboreando a memória de cada beijo compartilhado, mesmo que ainda não fossem numerosos.
-Seu gosto...-começou, buscando as palavras certas, que agora rodopiavam em sua mente -É como um poema suave, uma melodia que ecoa em minha alma, ao mesmo tempo que é como o calor de uma pira em uma noite fria, acendendo uma chama ardente dentro de mim, justo de mim, que sou a própria água. É como se cada toque dos seus lábios fosse uma nota perfeita, harmonizando-se com o ritmo do meu cerne. É intenso e gentil ao mesmo tempo, como uma brisa suave que acalma e inflama paixões e uma energia que queima profundamente e me consome.
-Tudo isso? Pois parece-me muito apenas para um beijo. Tão exagerado.
Rain não precisava vê-lo para saber que sorria, pedante.
-Sim, Ghoul, tudo isso.
Ele o puxou contra seu corpo, valsando em um silêncio melódico, tentando fazer daquele momento eterno nas poucas horas que restavam, tentando aproveitar cada segundo que podiam naquele quarto, pois assim que saíssem, suas mãos não mais se tocariam, os olhares seriam controlado e não haveriam beijos. Não haveriam mais eles.
-Preciso ir, Rain.
-Não, não precisa, teu lugar é aqui, assim como também é o meu. Nunca mais sairemos dessa cama.
Com gentileza, Fire virou-se em seu braços, em um beijo apaixonado, calmo, sincero.
O último.
E com uma promessa, Fire se foi, para que pudesse se arrumar para o café que antecederia sua ida, deixando Water para trás, naquele quarto gélido e escuro, que agora parecia-lhe vazio, parecia-lhe solitário.
Fire havia deixado seu casaco propositalmente para trás, como um presente, uma oferenda e Rain o abraçou, mais uma vez buscando seu cheiro, seu cheiro de fim de tarde.
Aquele cheiro que significava paz, o aroma de um dia bem vivido, de momentos compartilhados e memórias criadas. É como se cada respiração fosse uma lembrança dos momentos felizes que poderiam viver juntos, e a promessa de que seriam vividos.
Antes de sair do quarto, não pode evitar que uma lágrima trilhasse por seu rosto. Tinha medo daquele sentimento, tinha medo de se entregar, tinha medo de amar, de se envolver. Mas Fire, logo Fire, parecia ter tanta certeza daquilo, mesmo com tudo que haviam passado, ele havia se declarado, ele havia o buscado, ele havia dado o primeiro passo.
"Que seja", pensou conformado, ouvindo a tempestade cada vez mais intensa, "Que ele dispa minha armadura e tenha-me à sua vontade, eu posso suportar mais algumas cicatrizes, desde que não me matem de amor."
Enquanto a chuva rugia lá fora, ele sentiu-se envolto por uma sensação de desamparo. Aquelas palavras, tão carregadas de resignação, ecoavam dentro dele, ecoando seus medos mais profundos.
"Não está se divertindo comigo como vingança, está?"
Com um suspiro pesado, ele reconheceu a verdade sombria que as palavras carregavam, sobre a forma que ele próprio se torturava. Ele estava disposto a se entregar, a baixar suas defesas e se abrir para Sodo, mesmo que isso significasse reviver as dores do passado, as deles e as suas próprias. Pois ele sabia que o amor poderia ser uma faca de dois gumes, capaz de curar e destruir, e ele temia as cicatrizes que poderiam resultar.
Mas ainda assim, enfrentaria.
Mesmo sem ter dito, aquilo era óbvio.
Ele amava Fire.
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Waterdrop Firedrop (Rain x Sodo)
FanficUma história de Ghost, mas em um mundo de alta fantasia! Lembrando que será Rain X Sodo/Dewdrop E se os Ghouls fossem seres elementais de um reino mágico comandado por Papa Emeritus? E o que aconteceria se uma nova criatura surgisse trazendo o caos...