Luise.
Cada mesa que arrumo leva um tempo. Isso por que estou fazendo isso praticamente sozinha. O Ian saiu já faz um bom tempo e não me disse exatamente o que foi fazer. Suponho que seja importante, ele não sairia assim se não não fosse.
Tenho que admitir que estou amando essa missão. A área de saúde sempre chamou minha atenção. Faço isso desde pequena, brincando de médica com minhas irmãs, ouvindo seus batimentos com um estetoscópio de brinquedo. Era roxo e preto. As minhas cores favoritas. Estar em um hospital ajudando é quase como realizar um sonho. Talvez
eu trabalhe aqui algum dia.
Termino de arrumar os suprimentos no andar e olho no relógio. Já é hora do almoço. Penso se espero o Ian ou almoço sozinha. Mas a verdade é que não sinto fome. Não tenho apetite. Em casa meu pai me dá bronca para que eu coma alguma coisa.
Decido ir até o quarto dos enfermeiros. Sento no banco e olho para as paredes. Pego meu telefone e olho minhas mensagens. Maggie mandou uma coletânea de fotos de cosplays que ela está pensando em comprar. Não há mensagens da Karen. Ela costuma empanturrar meu celular com um monte de memes ou coisas que ela acha que a gente pode gostar. Na verdade acabo rindo muito com a escolha de memes dela, e as ideias que ela me manda são realmente boas. Fico pensando se ela está bem. Considerando o quão desatenta ela é, pode escorregar e bater o pé em alguma coisa. Pode ter pegado em algum inseto e se ferido, pode ter tido olho grande por causa da fome e comido algo com veneno.
— Oiê! — Larah aparece na porta.
Ela olha em volta e seus olhos param em mim, ela parece estar um pouco decepcionada, talvez porque o Ian não está aqui?
— Oi! — respondo.
— Muito obrigada por ter arrumado tudo. Ficou ótimo!
— De nada.
— Pode dar uma olhada nesses pós operatórios? São apenas três.
— Claro. Sem problemas. — pego a lista que ela me entrega.
— Obrigadinha.
Balanço a cabeça pra ela. Larah se afasta mas então volta.
— É... — ela parece pensar no que falar, mas muda de ideia — Não esqueça da reunião hoje a noite.
— Não esqueci.
— Certo.
Ela se afasta de novo, para por um segundo e volta a andar. Olho a lista e procuro o primeiro paciente.Ian.
Após o tiro eu sinto uma dor excruciante. Evito um grito mordendo meu lábio com força. Respiro calmamente e ouço o cara se aproximar. Continuo mordendo e respirando. A dor não para. Mas me concentro. Quando vejo a mão dele com a arma, agarro com força e empurro o pulso dele contra a quina da parede. Ele urra de dor, tenta atirar mas sua arma cai da mão. Começa uma luta. Tento usar minha arma, mas ele vem pra cima de mim. Ele tenta dar um soco em mim, mas me esquivo do golpe com o braço. Aproveito para dar uma cotovelada que prensa seu pulso novamente. Ele usa sua outra mão e acaba acertando na minha costela. A dor parece aumentar, mas ao invés de me paralisar, só me dá mais adrenalina para puxar seu braço contra mim e dar um forte soco no queixo. Ele cai desmaiado no chão e respiro fundo. Sinto gosto de sangue. Vem do meu lábio, mordi com tanta força que cortei. Cuspo no chão e aponto minha arma para sua testa. Dou um tiro para garantir que ele não vá acordar por agora.
— Ian? — Graham aparace ao meu lado.
— Tudo sobre controle. — sorrio.
— Ouvi uma explosão e você ficou calado.
— Ele tava muito perto e não pude falar. Vamos pegar esse e juntar com os outros. — ele se inclina para me ajudar — Então? Acabaram todos os caras?
— Sim, este é o último. Hey cara você tá sangrando. — ele me olha preocupado.
— Eu tô legal. Esse filho da mãe me acertou, mas já me vinguei.
Aponto para a testa dele.
— Mano, tem sangue na sua boca.
— Relaxa. Já tô indo pra o hospital.
Ele balança a cabeça.
— Valeu pela ajuda.
— Nada.
Volto para meu carro com muito esforço. Eu realmente odeio tomar tiro. Sento e fecho a porta. Levanto a camisa e dou uma boa olhada. Foi de raspão. O soco que levei deve ter feito o corte aumentar mas não é nada realmente demais. Abaixo a camisa e dirijo de volta para o hospital. Quando chego faço mais um esforço pra sair e então vou para a entrada.
— O que aconteceu com você? — uma médica surge ao meu lado.
— Tomei um tiro.
— Aí minha nossa! Deixa eu ver isso.
Ela me guia até uma maca. Ela é até bonita, cabelos curtos loiros e olhos castanhos claros. Me sento na maca, ela levanta minha camisa, arfa, depois balança a cabeça e começa a olhar o ferimento.
— Foi de raspão. — ela olha pra mim.
— Foi sim. — encaro ela. Isso tá doendo pra caramba.
— E sua boca? — ela toca meu rosto.
— Eu mordi ele com muita força.
— Ah... — ela arfa de novo, ela gostou desse detalhe? Não posso nem pensar nisso.
Ela coloca uma gase no meu lábio e começa a cuidar do meu ferimento.
— Acho bom a gente fazer um raio X pra ver se não há mais nada.
— Não há.
— Só pra ter certeza. — ela pisca pra mim.
Entrego meu celular para ela, que coloca no bolso e me leva para a sala de raio X. Ela me dá alguma coisa e tomo, não quero admitir mas não estou aguentando muito essa dor. Após analisar ela vem até mim com um sorriso.
— Tá tudo tranquilo.
— Eu te disse. — minha voz sai rouca.
— É pra ter certeza. Vamos pra cá agora.
Ela me leva para a maca, deixo a camisa levantada para que ela possa cuidar. Ela me entrega o telefone e aproveito para mandar uma mensagem para a Luise, informando que já cheguei e depois vou encontrar ela. Mas assim que clico em enviar, ela aparece.
— Ian? — levanto os olhos e vejo ela na minha frente. Ela olha para meu rosto, em seguida olha para baixo.
— Oi. — retiro a gase pra falar— Demorei muito?
— Sim. O que aconteceu com você? — as sobrancelhas dela se franzem.
— Tomei um tiro e um soco no mesmo lugar.
Ela arregala os olhos e se aproxima. A médica levanta o rosto e sorri para ela.
— Foi de raspão, ele vai ficar bem.
Luise balança a cabeça e concorda. Tento não contorcer de dor a cada vez que a médica aperta o lugar.
— Como assim? — Luise parece confusa.
— Te explico depois... Ahh! — a médica tocou no ponto que não aguentei.
— Desculpa. — ela sorri sem graça.
— Tudo bem. Você está aprendendo não é?
— Sim... — ela parece se encolher.
— Só promete que vai fazer os pontos direitinho.
— Tá... — ela dá um riso fraco.
Ela pega o equipamento de sutura e então começa suturar. Acabo fazendo uma careta de dor.
— Você precisa ficar quietinho.
— Tudo bem.
— Não seja um bebezão, Ian. — Luise brinca.
— Não estou sendo.
— Você está quase chorando.
Reviro os olhos. Mas me mantenho quieto. Quando a garota faz a última sutura, respiro aliviado. Dou uma boa olhada.
— Não é que ficou bom? — de verdade, ela fez um bom trabalho na sutura — Olha aqui, Luise.
— Verdade. — ela olha para o lugar — Ficou perfeito, não vai ficar muito marcado.
— Obrigada. — ela sorri tímida. — Vou só fazer o curativo e você vai ficar bem. — ela me lança outro sorriso, acabo restituindo.
Luise me olha e semicerra os olhos. Dou de ombros e sinto a pontada de dor. A médica passa uma pomada que logo reconheço. Foi criada por profissionais da nossa agência, ajuda na cicatrização, de forma que não parece que a pele foi machucada algum dia.
— Vamos lá.
— Vamos.
Ela me olha com um sorriso bobo. Apesar de eu realmente não poder fazer nada, estou me divertindo com isso. Olho para a Luise e pisco pra ela. Ela balança a cabeça negativamente pra mim.
— Prontinho.
— Obrigado.
Ela balança a cabeça sorrindo e se afasta. Abaixo a camisa e me levanto.
— Temos algun trabalho?
— Na verdade não.
— Ah que bom.
— Vai me contar o que aconteceu?
— Sim. Vamos para o quarto. Aliás, não almocei hoje.
Passamos no refeitório e pego uma bandeja de comida. Luise pega um pote de batatas fritas e seguimos para onde costumamos comer.
— Então? — Luise olha para mim esperando que eu conte tudo.
— Fui ajudar um colega. — conto a ela tudo o que aconteceu, desde a ligação até a briga. Suas sobrancelhas estão arqueadas.
Com os dedos toco e faço elas abaixarem. Sorrio para ela.
— Oi! — Larah aparece.
— Oi.
— A doutora Anders disse que você tinha levado um tiro.
— A doutora Anders é uma fofoqueira? — pergunto e ela gargalha — Estou bem. Não foi nada de mais.
— Bom saber. Vocês estão liberados pelo resto do dia. Só precisam vir para a reunião.
Concordo com a cabeça e ela sai.
Passamos o resto do dia analisando as pistas que temos. Nenhum rapto tem sido feito na nossa área, o que reforça a ideia de que o Nathan é realmente a próxima vítima.
— A câmera não detectou nada de estranho. — comento com minha parceira.
— Que bom! Não quero que ninguém toque nele.
— É. Mas não sabemos o que eles estão tramando agora.
— Temos que continuar procurando outras crianças.
— Fiz minha lista.
Luise mexe no celular. Nós marcamos de cada um fazer uma lista de outras crianças que também poderiam ser vítimas. Só consegui reunir cinco. Ela parece ter encontrado algo.
— Quer ver a minha?
— Quero, olha a minha.
Trocamos os celulares e lemos a lista um do outro. Ela tinha achado várias. Meu celular vibra na mão dela, mas continuo lendo. Só espero que não seja nenhuma mensagem indecente.
— Tem mensagem pra você. — ela devolve o telefone.
Dou uma boa olhada. É a Cloe perguntando se vou chegar muito tarde. Digo que talvez que vou chegar em breve, mas terei que voltar, ela responde com um ok e emojis de beijinhos.
— Devíamos voltar pra nos preparar para a reunião.
— Verdade.
Chego na mansão e ando junto com a Luise no jardim. Ela me olha torto.
— Você não vai se arrumar?
— Vou. — quando ela franze a sobrancelha eu solto uma gargalhada — Eu já morei aqui lembra? Tenho algumas roupas no meu antigo quarto.
— Ah! É verdade. E vai ser melhor do que você ir e voltar.
— Exato.
Andamos pelo corredor, ela para na frente do seu quarto e eu continuo caminhando. Entro no meu antigo quarto e abro o guarda-roupa.
— Tava me perguntando onde estava essa gravata... — murmuro sozinho.
Escolho uma calça social preta e uma camisa branca. Também pego um blaze e vou até o banheiro. Tomo um banho e me perfumo. Visto a roupa e procuro um tênis na gaveta. Escolho um sapato social preto. Pego a meia e calço ele. Meu cabelo está úmido mas não vai demorar pra secar.
Ao sair encontro o Josh no corredor. Ele acena com a cabeça, aceno de volta e continuamos nosso caminho. Quem não o conhece pode até pensar que é um cara frio e calculista. Mas isso é só porque o Ryan Carter é um homem extremamente inteligente. Mas ele também é alguém com um coração enorme. Ele acolheu não só a mim e a minha irmã, como ao Kieran e ao Hak também. Nós não tínhamos nenhum expectativa no futuro. Não tínhamos família alguma, a não ser nossos irmãos. Poderíamos ter nos tornado pessoas horríveis, nosso passado justificaria isso. Mas o Josh meio que nos adotou, posso dizer que é quase um pai porque sempre que fazemos algo de errado ele nos dá bronca como tal. Ele nos treinou e nós nos tornamos pessoas diferentes. Pessoas melhores.
Sinto cheiro de Malbec. E vejo a Luise fechar a porta do quarto. Meus olhos deslizam pelo seu corpo. Uma camisa sem mangas preta e uma calça social marrom. Um coturno completa o visual. Tento forçar meu rosto para o rosto dela. Ela percebe que estou olhando para ela. Caminho devagar em sua direção.
— Vamos? — minha voz soa baixa e olho para seus olhos.
Ela balança a cabeça.
Esperamos do lado de fora da sala, esperando que a chefe nos chame. Tento distrair minha mente pensando em outra coisa. Mas para meu alívio a porta se abre.
— Carter? White? Podem entrar.
Na sala encontro o doutor Brown junto com a Larah , há também uma outra mulher e dois homens. Eles apontam para duas cadeiras, nós nos sentamos e aguardamos.
— Vocês estão bem? — o doutor Brown pergunta.
— Sim. — Luise responde.
— Claro.
— Nós vamos ao ponto. — Larah toma a palavra — Todos nós queremos agradecer por toda ajuda.
— Sabemos que não é um trabalho oficial. Mas mesmo assim achamos que vocês merecem uma recompensa. — o doutor Brown fala.
— É sobre pagamento. — uma outra mulher ri.
— É só isso. — a Larah completa.
Todos dão risada e acabamos rindo também.
— Estou mandando agora mesmo. — um homem diz.
— Ah obrigado pessoal. Não vou dizer que não precisava. — brinco e mais uma rodada de risos se não estende.
— É isso.
— Já podemos ir?
— Claro.
No momento que cruzamos a porta. Nossos telefones tocam. Olho a notificação de pagamento.
— Uau! — Luise sorri abertamente — Gostei dessa reunião.
Não é um grande pagamento. Mas nos deram um salário de aprendiz, que é baixo, mas é muito se comparado ao que receberiamos em outro hospital.
— Vou gastar hoje mesmo. — brinco.
— Eu vou guardar o meu.
— Mão de vaca!
— Sou mesmo!
— Qual é, vamos beber! Gastar um pouquinho.
— Eu não bebo.
— Você pode tomar água. — tô realmente chamando ela pra beber comigo?
— Não, obrigada. Aliás, você deveria descansar. Você tomou um tiro.
— Eu vou descansar hoje, prometo.
Durante o caminho ainda brinco com a Luise. Deixo ela em casa e volto para a minha. A Cloe queria falar algo comigo.
— Cloe?
— Aqui na sala!
Deixo o casaco no porta casacos e vou para a sala. Há um karaokê na TV. Está tocando alto. Cloe dança ao som de Blinding Lights de The Weekend. Ela me puxa para dançar mas a dor na costela não permite.
— Qual é? Vamos!
— Desculpa tô machucado.
Ela pausa a música na hora e vem até mim, preocupada.
— Onde?
Levanto a camisa e mostro a ela.
— Eu vou ficar bem.
— Quem fez isso com você?
— Me machuquei durante uma missão. Mas tá tudo bem. Ok?
Ela balança a cabeça e nós nos abraçamos. Pedimos um jantar e enquanto chega, Cloe e eu fazemos um dueto. A comida chega e nós comemos. Minha irmã ainda parece estar preocupada. Deito em minha cama e ela se junta a mim trazendo sua coberta de gatinhos e um travesseiro rosa.
— Você tem que ser mais cuidadoso...
— Eu sei. — sorrio pra ela e bagunço seu cabelo.
Mando uma mensagem para a Luise vir para cá de manhã. Cloe começa a cantarolar alguma coisa. A dor ainda é chata, mas acabo dormindo tranquilamente.
Luise.Acordo e me estico. Em poucos segundos o despertador começa a tocar. Já ouvi essa música tantas vezes que morro de ódio só de ouvir ela tentar me acordar outra vez. Clico para que ela pare e começo a me arrumar. Não tomo café. Não sinto fome. Mas assim que cruzo com meu pai no corredor penso melhor e como uma torrada.
Peço ao motorista que me leve até a casa do Ian como de costume. Deixo uma mensagem para ele e vou.
— Oi! — Cloe atende a porta e entro.
Vejo o cheiro de alguma coisa queimando e ela corre para a cozinha. Fecho a porta e vou para a cozinha. Há uma fumaça saindo da frigideira.
— Merda! — Cloe exclama.
— Quer ajuda?
— Sim, por favor.
Me aproximo e calculo o estrago. Os ovos estão queimados.
— Sinto muito Cloe. — desligo o fogo e tiro a panela dali.
— Ah... Eu queria fazer alguma coisa para ele...
— Tá tudo bem. Por que não fazemos torrada? A torradeira é automática.
— Tem razão.
Ela pega o pacote de pães e me entrega. Coloco na torradeira e aperto o botão. Tão prático.
— Não entendo por que é tão difícil...
— Eu também não sou tão boa.
— Deve ser melhor que eu.
— Cadê o seu irmão?
— Na cama. Droga! Esqueci de acordar ele. Acho que consigo passar a geleia nas torradas você pode acordar ele? Não se preocupe ele está vestido.
— Ah... — penso se é uma boa ideia ir até lá. Mas digo a mim mesma 'que se dane' e vou.
Bato na porta mas ninguém fala nada, ao invés disso, a porta abre pra mim. O quarto está um pouco escuro. Ligo a luz e vejo ele deitado. Seu rosto está prensado contra o travesseiro. Os lábios estão entre abertos, um braço está embaixo do travesseiro. Vejo o músculo flexionado e arfo. O outro braço está a frente dele. O cobertor está cobrindo até a cintura. Vejo parte da sua barriga, percebo que estou encarando a muito tempo e então chamo por ele. Como ele não atende eu me aproximo. Seguro seu braço e balanço ele. Sua pele é quente contra minha mão.
— Acorda dorminhoco.
Seus olhos se abrem e ele me encara, confuso. Engulo em seco e tiro minha mão do braço dele.
— Oi. — a voz dele é grave e parece percorrer todo meu corpo.
Ai meu Deus! Para agora! Ele olha para mim e se aproxima. Não tenho certeza se estou respirando. Ele olha para meus lábios. Acho que meu coração acelerou. A mão dele chega perto do meu rosto.
Ah meu pai do céu! Será que ele vai me beijar agora?

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Muito bom, amigo
Ciencia FicciónLuise e Ian sempre foram bons amigos. Nada mais que isso. Após relacionamentos fracassados, ele busca apenas boas noites, e Luise sequer procura alguém. Mas um bom amigo é para todas as horas, não é mesmo? Este livro está conectado com: Não quero ni...