A luz dos contos de fadas

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Sunghoon não fazia ideia do que estava sentindo. O estômago doía, a mente ficou inquieta, tomada por pensamentos a respeito de Jake e tudo o que foi mostrado pelo livro. Lembrava dos dias na biblioteca, lendo e jogando conversa fora baixinho, para a bibliotecária ranzinza não ouvir e expulsá-los. Também lembrava de quando almoçaram juntos, as aulas em que estiveram lado a lado, fosse mexendo com plantas mágicas ou desenhando, tinha aprendido a gostar da presença de Jake sem sequer perceber.

Por esses outros motivos aquelas cenas mexiam consigo. A realidade era uma: não conseguia imaginar Jake o envenenando, não aquele Jake que conheceu, que ria de piadas bobas, gostava de jogos e sempre tomava cuidado, sendo tão certinho que parecia bobo.

Jake nunca seria aquela imagem vilanesca do livro! Agora Sunghoon tinha certeza absoluta disso, mas a confusão em sua mente seguia tão forte quanto a certeza da natureza benigna do Shim.

Se forçou a sair da quadra o mais rápido possível, já estando ao pé da porta quando a Fada Madrinha despediu-se de todos. A cabeça latejando o impedia de ficar sequer mais um minuto junto de tanta gente, com todos murmúrios e conversas, a maioria fofocas sobre si e os outros filhos dos contos de fadas expostos.

Com a dor de cabeça de justificativa, ele foi para casa mais cedo, ficando trancado no quarto o restante da tarde depois de tomar o remédio trazido por Preguiça. Naquela noite ocorreria o baile que trouxe seu pai a cidade, um evento social dos grandes, patrocinados por vários membros da alta sociedade, logo sua família não podia faltar, e isso incluía a si, o herdeiro do grandioso conto da Branca de Neve. Depois de hoje, sua ausência iria causar mais barulho do que a presença, disso tinha certeza.

Ficar em silêncio dentro do quarto o deu tempo de pensar, pensar de novo e de novo sobre tudo o que aconteceu nas últimas semanas. Além de seus pais e Jake, Heeseung e Sunoo eram mais duas figuras recorrentes, gritando tão alto mesmo que suas imagens não soltassem um pio dentro de sua mente. Sunoo trazia aquela amargura em seu peito, uma dor latente subindo pela garganta na forma de culpa. Heeseung se fazia presente pela dor, queria o amigo ao lado, precisava de alguém para conversar, conversar de verdade, sem pisar em ovos ou agir perfeitamente, precisava da única pessoa que o escutava de verdade e o enxergava sem repulsa ou desgosto.

Se Jake soubesse o que pretendia no dia da festa, usá-lo, levá-lo para cama para depois zombar dele e desgraça-lo para toda escola… Ele o odiaria, odiaria como Sunoo o odeia, e aquela dor que sentia duplicaria, já crescia somente de imaginar a cena, supor sua reação.

Refletir sobre isso fazia Sunghoon sentir-se sujo, sujo ao ponto que não importava quantos banhos tomasse, nunca se sentia limpo, seguindo na imundice de si mesmo, na sujeira de seus atos, pensamentos e intenções.

Quando Preguiça bateu sua porta, avisando que seus pais tinham chegado e iriam se arrumar para o baile, Sunghoon forçou-se a levantar da cama. A enxaqueca não havia passado, mas ela não iria libertá-lo de ir ao baile, conhecia seus pais o suficiente para ter essa certeza. Sua mãe mandaria Preguiça trazer algum remédio forte, e enfiaria em sua goela, então iria passar o restante da noite grogue, e entre dor de cabeça e não lembrar da noite, a dor era uma opção mais segura de seguir.

Ele tomou um banho rápido, lavando os cabelos com pressa. Quando saiu do banheiro com a cintura enrolada por uma toalha, seu reflexo no espelho do banheiro pôde registrar quando dezenas de fios em seu cabelo assumiram um tom branco quase prateado vivido, formando mechas brancas macias.

Sunghoon não tinha se atentado àquilo, aos fios crescentes que surgiam em sua cabeleira escura. Não tinha se atentado à própria aparência nos últimos dias, estava com tanta coisa na cabeça. Quando Preguiça o viu na cozinha, já vestido adequadamente para o baile, pensou se tratar de alguma moda nova entre os jovens e ignorou aquilo. Seu pai sequer notou, o olhar desatento ao filho, já sua mãe manteve indiferença, presumindo a mesma coisa que Preguiça, e contanto que ele tivesse usado os produtos de sua marca e não comprado da concorrência, pouco importava o que essa fase de pintar os cabelos representava, iria passar.

Espelho Espelho Meu - JakehoonOnde histórias criam vida. Descubra agora