Capítulo 47 | Coventry

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Depois de cinco horas de viagem eu finalmente chego ao meu destino: Coventry. Uma cidade antiga, pequena e com grandes histórias. 

Coventry é distante de tudo o que eu conheço. De Londres. De Tom. Não vou encontrar nenhum rosto familiar aqui.

Quero me perder pelas ruas dessa cidade, visitar construções de séculos atrás e mergulhar nos segredos que todos esses lugares guardam.

Quero esquecer sr. Griffiths.

Com minha mochila nas costas, desembarco do ônibus e sinto a brisa quente do meio da tarde de uma primavera europeia me dar boas vindas. Assim, parto para explorar a cidade.

Meu primeiro objetivo é visitar o ponto mais conhecido daqui: A Catedral de Coventry. Bombardeada na segunda guerra mundial, mas a construção continua "inteira". Apenas sem o teto. É quase poético que a maldade dos homens não tenha destruído essa igreja. Logo a igreja, que é uma representação da esposa, da mulher, na bíblia.

A catedral está cheia demais, penso. Não vou passar mais do que cinco minutos aqui dentro - apenas o tempo de circular rapidamente e me afastar da multidão sufocante.

Saio e decido que vou voltar mais tarde quando tudo estiver mais vazio, mesmo que esteja escuro.

Com um mapa em mãos, eu ando sem rumo como gosto e deixo a cidade me guiar. Caminho por Priory Hall, Swanswell Gate, pelo Jardim de Lady Hebert... Não conheço nada e não faço questão de criar um roteiro. 

É só mais um dia normal na vida de todas as pessoas à minha volta. Porque seria diferente comigo? O sofrimento faz parte da vida. Eu, assim como todo mundo, só preciso seguir em frente.

Depois de muito circular e de conhecer a história de alguns pontos turísticos do centro de Coventry, o sol começa a se pôr. Por todos os lugares pelos quais eu passei a catedral destruída foi meu norte. Sem nunca sair do meu campo de visão ela me seguia enquanto eu caminhava pelo centro da cidade, por entres as ruas estreitas, lá estava ela acima dos prédios, ao virar uma esquina.

Enfim, resolvo parar na frente de um cinema. Do outro lado da rua há um teatro. Sem pensar muito eu atravesso de uma calçada de paralelepípedo para outra.

Dentro do teatro, reparo nas pessoas ao meu redor e depois nos atores quando começa o primeiro ato. Logo minha mente se perde em devaneios. Paro de prestar atenção no enredo. A cadeira confortável e o ambiente agradável e calmo são meus únicos companheiros para este momento em que sei que tudo o que eu preciso fazer é sentar e respirar. Simplesmente respirar. Deixar com que os pensamentos venham à tona e depois que eles voem para longe.

Me pergunto como deve ser a vida real dos atores. O que eles fazem quando não estão atuando ou ensaiando? Quantos lugares belos eles já devem ter visto? Será que é comum namorar os outros atores ou será que eles preferem as pessoas dos bastidores? Será que na vida real dá para saber se um deles está falando a verdade ou mentindo?

Me pergunto se o resto dos meus dias serão assim, tendo apenas eu como companhia e fingindo que foi escolha minha, que eu estou assim, sozinha, e cheguei a esse destino por que escolhi e não por que não tive outra opção.

Me pergunto se minha vida será sempre momentos de tristeza sufocante e de prazeres resplandecentes que passam rápido demais para no final não sobrar nada. Apenas uma tela cinza, sem relevos, sem cores para mesclar, sem linhas para delimitar. Nada. Apenas o vazio cinza de uma tela que já foi pintada, mas que eventualmente foi esquecida e, empoeirada, tomou um canto pequeno no sótão do mundo.

Quando a peça acaba, lágrimas embaçam minha visão, mas tampouco têm relação com a história apresentada. Levanto-me e caminho lentamente desviando das pessoas conversando, casais de mãos dadas, idosos que parecem felizes e grupos de adolescentes escandalosos.

Com amor, Cordélia (Daddy!)Onde histórias criam vida. Descubra agora