Capítulo 12 | Borderline

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Sinto como se não voltasse para casa há anos. Começo a questionar se tudo realmente aconteceu: senhor Griffiths, a casa dele, a noite juntos, todo o cuidado e a preocupação comigo... É tão irreal.

Espalho as roupas que trouxe da casa de senhor Griffiths sobre a minha cama e encontro meu celular enrolado dentro de uma das peças. Logo em seguida me deito. Tudo à minha volta cheira a ele. Seu cheiro é uma das melhores coisas que já senti. Faz meu coração palpitar mais rápido e forte.

As sensações que senhor Griffiths me trás são indescritíveis. Não sei ao certo se acontece o mesmo com os sentimentos... Na verdade, não sei se quero pensar em sentimentos agora. Outro dia, talvez. Hoje vou retornar à minha rotina.

*

Dois dias passaram e eu não tenho notícias dele.
O que deu em minha cabeça para começar algo que não vou conseguir terminar sem me machucar?

*

Três dias desde que vi senhor Griffiths pela última vez, deitado em sua cama. Ele não me procurou, não respondeu meu bilhete nem através de um recado por Vivi.

Não sinto fome e meu sono voltou a ficar irregular. Minhas olheiras estão profundas.
Embora entenda essa minha reação, me recuso a ir atrás dele. Se Griffiths quiser algo terá que vir me procurar.

Já passei pela juventude cedo demais e já fui abandonada mais vezes do que consigo contar. Já fugi para braços de garotos que olhavam para meus olhos e diziam me amar, quando na verdade seus olhos mentiam tanto quanto suas bocas e tudo o que viam era meu corpo, exposto e vulnerável, única e exclusivamente para o prazer deles.

Eu era tão nova, não interpretava as coisas como realmente eram. Na verdade, acho que nunca aprendi a fazer isso. Sempre senti como se meu senso comum fosse distorcido e eu olhasse as ações das pessoas à minha volta por trás de um vidro quebrado.

Homens foram a causa de inúmeras dores em minha vida, tanto mentais, quanto físicas, mas eu segui em frente, mesmo que para isso eu tenha tido que guardar tudo no fundo da minha mente. Não compartilho quase nada e às vezes preciso ir muito fundo para lembrar de como as coisas aconteceram, dos exatos momentos em que eu era esmagada pelo próprio peso da minha existência. E mesmo assim é difícil sentir. Está tudo muito bem enterrado dentro de mim.

Tudo isso faz tanto tempo. Coloquei milhares de quilômetros entre minhas lembranças e mim e mesmo assim elas continuam me perseguindo, como o vento, ou o ar, ou o chão. Algo que sei que sempre estará ali. De fato, não me importo com elas, mas é como se tivessem poder sobre a pessoa que eu sou.

E então, senhor Griffiths aparece. O ver de longe, uma possibilidade impossível, era confortável. Sem nenhum risco de decepção. Ele não era melhor, não era mais, não era tudo. Era apenas fruto da minha imaginação. Agora, depois do que passamos, ele se tornou real. E era para ser melhor. Ele me correspondeu. Sendo assim, por que sinto como se estivesse descendo uma ladeira sem fim? Sentindo como se fosse tropeçar a qualquer momento e rolar sem parar, até me machucar a ponto de não me ter mais para me erguer e ficar dessa forma até alguém vir me resgatar?


Mas quem viria? Quem eu tenho? Eu me coloquei nessa posição, sem ter ninguém. Como posso me deixar continuar com esse sentimento se sei onde vai me levar?
Por que não posso ter um romance normal como qualquer pessoa?
E mesmo com tudo isso, quando eu penso nele...

- Chega! Cordélia, chega! - Grito comigo mesma, tentando parar minha mente. Às vezes ela parece ser uma pessoa independente.

*

Ligo para Vivi.

- Cordélia?

- Oi, Vivi. 

Depois de uma pausa longa escuto Vivi puxar uma grande quantidade de ar. 

- Cordélia! - Ela grita. - Como a última coisa que sei sobre você depois daquela ligação de noite, na qual você soava desestabilizada, para dizer o mínimo, foram as últimas notícias suas que eu tive em dias? O que aconteceu?

- Eu acho que tive algum tipo de ataque, não sei classificar pelos sintomas. Talvez eu só tenha ficado ansiosa. As drogas devem ter mexido com a minha cabeça. O importante é que eu e senhor Griffiths... - Começo a ficar agitada só de lembrar da voz dele em meu ouvido, de seus lábios tocando os meus... - Bom, eu voltei para a biblioteca naquela noite e acabei perdendo a consciência. Me lembro de sentir como se estivesse sem ar e tudo à minha volta girava sem parar. Eu me sentia sufocada. E então dormi por dois dias seguidos e acordei na casa do Senhor Griffiths.

Uma pausa. Ela arranha a garganta como se não tivesse gostado muito.

- Continue. - Responde seca.

- Ele me encontrou na biblioteca e depois de eu acordar do meu sono incrivelmente longo ele estava lá e... Eu sei que você não gosta que eu fale dele assim, mas você é minha única amiga, por favor?

- Eu vou ter que insistir para você continuar? - Vivi responde.

- A casa dele era tão bela... E ele estava numa sala aconchegante, tão diferente de tudo o que eu já vi e estava com a camisa aberta... Nunca tinha visto um homem tão sexy, Vivi...

- Cordélia, pule seus pensamentos, quero o que aconteceu. - Ela diz fingindo estar irritada. 

- E então eu estava em seu colo e suas mãos estavam em meu corpo e seus lábios em meu pescoço e sua voz sussurrando em meu ouvido... Vivi, se ele quisesse fazer qualquer coisa comigo naquele momento eu temo que teria deixado. A sensação dele em mim... Nunca tinha sentido nada igual antes.

- Então vocês fizeram? 

- Então sobre isso - Digo tentando explicar porque passei tanto tempo sozinha com ele e não fiz nada.

- Como disse, passei dois dias dormindo, equivalente a dois dias sem comer, a menos que ele tenha me alimentado sem eu saber, o que não aconteceu. 

- Cordélia! - Agora ela soa irritada de verdade. 

- Tudo bem! Então ele preparou algo para eu comer e depois me levou para tomar um banho. Ele me comprou roupas, sabia? Lingerie. Você acha estranho?

- Estranho? Se eu fosse você tomaria cuidado comigo, porque estou considerando roubá-lo de você. 

- Fique à vontade. 

- Como? - Ela pergunta irritada. 

- Você sabe, Vivi, em mais de dois anos que estou aqui nunca tive ninguém.

- Sim, você nunca teve ninguém. Seus traumas são partes de você, mas não é porque você foi magoada antes que isso vai se repetir todas as vezes.

- Quebrada. Eu fui quebrada mais vezes do que poderia contar, Vivi.

- E você sente a mesma coisa quando está com ele? Quando você estava com ele se sentiu quebrada? 

- Eu me senti... Eu me sinto queimar. Como se ele estivesse me quebrando por dentro e me segurando por fora. 

Uma pausa longa, antes de Vivi voltar a falar. 

- Você me perguntou naquela noite se deveria voltar e eu não te respondi. Bom, acho que você deve voltar para ele. Em pouco tempo você já está assim e ele cuidou de você. Senhor Griffiths pode ser finalmente algo bom para você.

Depois de alguns instantes respondo. 

- E se ele não quiser? 

- Você acha que alguém que não quer provoca isso em outra pessoa? 

- Acho que não, certo? 

- Não sei. Mas se eu estiver errada, pelo menos ele vale a pena pela aparência e pelo dinheiro. Definitivamente vale um coração quebrado. 

- Posso dormir com você hoje? 

- Você já sabe onde fica a chave.

Com amor, Cordélia (Daddy!)Onde histórias criam vida. Descubra agora