Três.

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Anita caminhava com raiva, sendo seguida por uma Verônica igualmente irritada. A delegada parou na porta de sua sala, dando passagem para a escrivã, que tinha uma postura nada amigável. Com seu queixo erguido e cara fechada, Verônica parou em sua frente, observando Anita fechar a porta sem delicadeza alguma.

- Isso não vai dar certo, claro que não! Que ideia de merda. - Anita disse mais para si mesma do que para Verô. - Como eu poderia esperar um resultado diferente com vivência do lado, não é, Torres? - A mulher se aproximou de Verônica, a encarando com raiva.

- Claro que não vai dar certo, porra! Você conseguiu ouvir uma palavra do que disse dentro daquela sala? - Os olhos castanhos de Verô estavam ainda mais escuros. - Não vai dar certo e a culpa vai ser sua!

- Eu sou quem da as ordens, Escrivã! Eu sou a delegada dessa porra e sua chefe, escutou? Chefe? Acima de você e da sua ladainha.

A tensão entre Anita e Verônica era palpável, com as duas trocando palavras ásperas na sala da delegada. A escrivã não se deixava intimidar pela postura autoritária de Anita, mantendo-se firme em suas convicções.

- Chefe? - Verônica repetiu com um sorriso irônico. - Pode até ser, mas não significa que ta sempre certa. Se continuar agindo desse jeito, só vai foder com o caso.

Anita cerrou os punhos, controlando sua raiva antes de responder.

- Não me faça repetir, Torres. Você está aqui para cumprir minhas ordens, não para questioná-las. Vou deixar bem claro: ou você segue minhas instruções sem questionar, ou teremos problemas sérios. Entendeu?

A escrivã apertou os lábios, reprimindo um impulso de retrucar com mais sarcasmo. Ela sabia que Anita tinha poder sobre ela na delegacia, mas isso não significava que precisava aceitar tudo calada. No entanto, naquele momento, optou por recuar e concordar, pelo menos por enquanto. Não arriscaria sua posição na equipe.

- Entendi, delegada.

Concordar com as ordens de Anita chegava a ser sufocante para Verô, uma sensação de desconforto se instalou em seu peito. Ela não podia deixar de se perguntar até onde iria para manter sua integridade e o mais importante, a justiça.

Anita observou a reação de Verônica com um olhar afiado, percebendo o conflito que se desenrolava na escrivã. Um sorriso sutil de triunfo brincou nos lábios da delegada, ela se aproximou de Verônica, diminuindo a distância entre elas com passos calculados.

- É bom que tenhamos isso claro, Torres! - A voz de Anita era suave, mas carregada de ameaça velada. - Pois, se você ousar atravessar meu caminho novamente, vai se arrepender profundamente.

Verônica sustentou o olhar desafiador de Anita, seu próprio semblante era uma mistura de determinação e desafio. Ela não seria intimidada tão facilmente, não importa o quão poderosa Anita achasse que era.

- Não tenho medo de você, doutora. - Verônica respondeu com firmeza, suas palavras ecoando por toda a sala. - E se você acha que pode me calar com ameaças ridículas, ta muito enganada.

O confronto entre as duas mulheres fervia no ar, os olhares mais uma vez grudados, tão afiados quanto facas.

- Ta dispensada, escrivã! - Anita recuou. A tensão era esmagadora e a loira já sentia sua cabeça latejar. - Até onde eu sei, ainda precisa me entregar o que eu pedi.

Verô revirou os olhos.

- Como quiser, delegada!

- Mas sem demora ein? Eu quero dar uma olhada no terreno onde o corpo foi encontrado. - A mulher se sentou atrás de sua mesa, deixando claro, a contragosto, que Verônica ainda estava dentro.

Após o tenso embate com Anita, Verônica saiu da sala da delegada sentindo o peso de sua presença ainda pairando sobre seus ombros. Ela retornou à sua mesa, onde Nelson já a esperava, observando-a com uma expressão inquisitiva.

- E então, Verô, o que foi aquilo? Mais uma sessão de terapia com a doutora? - Seu amigo perguntou, lançando um olhar de canto de olho na direção da sala de Anita.

Verônica bufou, rolando os olhos em resposta.

- Nelson, você não imagina como foi revigorante. Mal posso esperar pela próxima! - Sua voz carregava um tom sarcástico enquanto ela se sentava e começava a mexer nos papéis em sua mesa.

Nelson conteve um sorriso, entendendo perfeitamente a ironia de Verônica. Ele sabia que as interações entre ela e Anita eram tudo, menos amigáveis.

- Bem, pelo menos você parece estar inteira. Posso imaginar que o encontro tenha sido... encantador. - Ele comentou com uma pontada de humor.

- Absolutamente encantador. Eu me sinto uma pessoa completamente nova depois de cada conversa com ela. - Verô retrucou, suas palavras carregadas de cinismo.

Verônica, que corria com seu trabalho atrasado, notou que Anita a observava da sua sala, podendo sentir o peso de seu olhar mesmo separadas pela parede de vidro da sala da loira. Como uma presa e seu predador, a delegada estava ali, silenciosa, à espreita, seus olhos fixos em Verônica como se tentasse não só decifrar seus pensamentos, mas se infriltrar neles.

- Olha só, Nelson, o nosso anjo da guarda está nos observando. - Verônica comentou com um sorriso irônico, inclinando-se para Nelson e apontando sutilmente na direção da sala de Anita. - É reconfortante saber que estamos sempre sob os cuidados atentos da nossa adorável delegada.

Nelson reprimiu uma risada, balançando a cabeça em concordância.

- Acho que você está trabalhando com o diabo, Verô, isso sim! Lúcifer também já foi um anjo! Talvez a gente precise de um exorcista para nos livrar desse mal. - Ele brincou, mantendo um tom leve, diminuindo da tensão no ar.

Verônica riu baixinho, mas o riso estava carregado com um toque de amargura.

- Um exorcista seria uma boa ideia, Nelson. Talvez assim eu consiga manter minha sanidade intacta enquanto lido com a nossa delegada. Ou, pelo menos, posso pedir umas férias prolongadas por motivo de possessão demoníaca. O que acha?

Os dois compartilharam um olhar cúmplice, sua conversa repleta de humor ácido para aliviar a pressão que pairava sobre eles, principalmente sobre a escrivã. No fundo, Verônica sabia que enfrentar Anita era uma batalha constante. Nada ali era novidade, não! Recordando os primeiros dias em que começaram a trabalhar juntas, Verônica não pôde deixar ignorar o que sempre sentiu em relação a delegada. No início, ela admirava secretamente a determinação e a competência de Anita, embora nunca tenha admitido isso em voz alta, a loira era firme, obstinada, sabia como separar seu emocional dos casos, o que era quase impossível para a escrivã. Anita era uma mulher jovem em um cargo de liderança, aquilo era difícil de ignorar. Por trás das divergências e confrontos constantes, Verônica ainda mantinha um certo respeito por Anita. Ela reconhecia a competência da delegada e, certa forma velada e quase escondida, admirava sua habilidade em lidar com os casos mais difíceis. Anita era durona, não podia negar, mas preferia morrer a admitir aquilo tudo para si mesma e para a delegada de forma aberta.

Desde o começo, a relação entre Anita e Verônica foi marcada pelo caos. Anita, com sua postura autoritária e determinada, e Verônica, com seu espírito insubordinado e teimoso, pareciam destinadas a colidir. A escrivã não hesitava em desafiar as ordens de Anita quando acreditava firmemente em suas convicções, o que frequentemente gerava atritos entre elas.

E, apesar dessa admiração silenciosa, Verônica não conseguia deixar de questionar as motivações de Anita e suas abordagens muitas vezes implacáveis, insensíveis. Verônica acreditava firmemente em sua própria visão da justiça e, por mais que respeitasse o trabalho de Anita, não podia concordar com todos os métodos da delegada.

Estar ao lado de Anita trazia uma sensação desconfortável, mesmo assim, Verônica estava determinada a se manter no caso, e principalmente a manter sua integridade e seguir em frente, e isso significava enfrentar Anita mais uma vez. E a ideia, no final das contas, era tão familiar para Verô quanto respirar.

CRAWLING - VeronitaOnde histórias criam vida. Descubra agora