Vinte e sete.

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Prata estava jogado no sofá de Verônica, ouvindo a amiga reclamar, pela milésima vez, de sua suspensão. Não podia dizer nada, a não ser ouvir a fúria da escrivã, que parecia um animal enjaulado. Afinal, aquela era Verônica, cheia de sede por justiça, inquieta, justiceira, mesmo que fosse preciso fazer a justiça com as suas próprias mãos.

- Eu preciso trabalhar, Prata! O caso tá sendo investigado e eu tô de fora.

Prata ergueu as mãos em sinal de rendição, observando a agitação de Verônica. Era difícil vê-la tão perturbada, especialmente porque ela sempre uma das mais focadas e decididas, mas ali, naquele momento, suspensa do caso, sua energia estava presa em um turbilhão de frustrações.

- Calma aí, Verô! Você ta de fora por culpa sua. Não vai me inventar mais nenhuma arte. Já tá levando um boi que a delegada não te ti tirou do caso.

- Ainda tenho uma semana de suspensão e ninguém me fala nada. Porra, custa pelo menos me informar?

Prata suspirou, compreendendo a frustração de Verônica, mas também ciente de que ela precisava assumir a responsabilidade por suas ações impulsivas. Era difícil encontrar o equilíbrio entre o desejo de justiça e a necessidade de seguir os protocolos, as regras básicas.

- Verônica, Verônica... Sua sorte é que sua delegada tá de quatro pro você. Se isso fosse a um tempo atrás... - Prata gargalhou. - Ela ia dar um jeito de transformar sua vida em um inferno.

Verônica parou ao ouvir a fala do amigo, respirando pesadamente.

- O que? Vocês duas fingindo que nada mudou é ótimo, Verônica.  - Prata encarou a morena. - E não adianta me olhar assim, a delegada tá na sua, gata! Ou você acha mesmo que a essa altura, em outros tempos, ela seria tão boazinha? O caralho, né Verô!

Verônica buscou uma resposta, mas aquilo ecoou em seu cérebro como um grito em uma pedreira, alto e claro. Alto demais!

- Pera aí, Prata! A gente não tem nada, mal se conhece, tá rolando algo tem pouco tempo. - Verônica se defendeu.

Prata observou Verônica com um olhar perspicaz, percebendo a tensão que pairava entre ela e a delegada. Havia mais do que apenas um casinho ali, algo mais profundo e complicado, algo que Verônica parecia relutar em reconhecer.

- Depois de anos brincando de gato e rato, você acha mesmo que seria diferente, Verô? Para né, tá se fazendo de burra!

Verônica sabia que ele tinha razão, Anita serviria sua cabeça enfeitada em uma bela bandeja de prata há alguns meses atrás.

Não podia negar que tudo havia mudado, tudo estava diferente. Mas ao assumir a mudança de Anita, teria que assumir a sua própria, e isso envolvia as coisas que andava sentindo. Era como se a simples menção do nome de Anita fizesse seu coração acelerar e sua mente se encher de pensamentos confusos. Verônica sabia que precisava enfrentar esses sentimentos de frente, mas a ideia de se abrir para algo daquele tipo, ainda mais com Anita a assustava mais do que ela gostaria de admitir.

Sentia como se estivesse pisando em um terreno totalmente desconhecido, um lugar onde as regras eram diferentes, onde o perigo era muito mais emocional do que físico. Mas, ao mesmo tempo, havia uma sensação de excitação, de algo novo e emocionante se desdobrando diante dela. Era como se estivesse começando a entender que havia mais entre ela e Anita do que ela jamais imaginou, e essa percepção só aumentava todos os seus conflitos.

Prata, que encarava a amiga, como se pudesse ler sua mente, se levantou, indo até cozinha.

- Enquanto você se prender no que vocês tiveram antes, nas brigas, nas desavenças, em como as coisas costumavam ser, mais confusa você vai ficar. Poxa Verô, eu vou precisar te ensinar a viver?  você que é tão corajosa para tudo, será que não vai ser corajosa para isso?

CRAWLING - VeronitaOnde histórias criam vida. Descubra agora