Um nó se formou na minha garganta quando Camila terminou de falar, erguendo as mãos para esconder o rosto, porque as lágrimas escorriam pelas suas bochechas sem parar. Era uma imagem que me causava uma sensação horrível, como se alguém estivesse segurando meu coração e o apertando com força.
—Em nenhum momento você se perguntou se tinha acontecido alguma coisa comigo, pra eu ir embora sem me despedir. Você decidiu que eu era uma pessoa horrível em poucos segundos e pronto, os anos em que fui sua melhor amiga e a pessoa por quem você se apaixonou, passaram a não ter mais importância. —Ele suspirou, balançando a cabeça negativamente, como se estivesse muito cansada daquilo, porque agora falou com a voz incrivelmente baixa. —E você se recusa a ouvir qualquer coisa, porque na sua cabeça eu sou uma pessoa mentirosa e falsa e é isso que importa pra você. Mas o que eu passei? Se eu fui embora por que quis? Se eu sofri assim como você? Por que você se importaria com isso, se já tem uma opinião formada sobre mim.
Abri a boca para dizer alguma coisa, mas nada saiu. Minha cabeça parecia ter dado um nó, porque toda vez que eu tentava pensar em algo pra dizer, mais confuso e perdido eu me sentia. Dei um passo na direção dela, antes de ouvir o som da porta se abrindo. Camila limpou as lágrimas na mesma hora, se virando para ver quem era.
—O que vocês dois estão fazendo aí dentro? —Paulo apareceu, fazendo uma careta ao ver que eu e Camila estávamos presos ali dentro e, principalmente, quando viu que ela estava chorando. —O que está acontecendo aqui?
—Camila? —Chamei, erguendo a mão para segura-la, mas ela já tinha disparado para fora do depósito, passando por Paulo de cabeça baixa.
Apertei minhas mãos fechadas ao lado do corpo, comprimindo meus lábios em resignação, enquanto via Paulo erguer as sobrancelhas e me encarar com uma expressão questionadora. Ele cruzou os braços na frente do peito, de uma forma que deixava claro que tinha certeza que a culpa, do que quer que tivesse acontecido ali, era minha.
Contei a ele minha história com Camila da forma mais resumida possível, recebendo um olhar reprovador dele quando terminei, antes de receber um puxão de orelha e finalmente ser liberado para ir embora. Não encontrei Camila no bar quando voltei pra lá, e muito menos minha irmã e Léo.
[...]
—Você não parece nervoso. —Felipe comentou, enquanto eu me sentava no sofá ao lado dele, ajeitando os botões da camisa.
—Não estou. O juiz precisa ser muito maluco pra deixar a Érika com meu pai. —Afirmei, mesmo que por dentro eu estivesse uma pilha de nervos. Eu só estava tentando disfarçar um pouco. —Fiz tudo que era possível pra melhorar minha vida pra Érika. Arrumei outros alunos pra dar aula de bateria e isso vai me dar uma boa grana. Minha mãe abriu mão da guarda em meu nome e a Érika vai deixar claro que também quer ficar comigo. Ela tem 16 anos, então a opinião dela provavelmente vai ser levada em consideração acima de qualquer outra, certo?
—É claro que vai. Se ela se sente bem com você e não com seu pai, o juiz não pode ignorar isso. —Bernardo murmurou, antes de fazer uma careta. —Pelo menos eu acho que não.
—De qualquer forma, vamos estar torcendo pra vocês. —Felipe levou a mão até meu ombro e a apertou de leve. —Você vai conseguir, cara. Seu pai claramente não leva jeito pra criar sua irmã. O juiz vai ver isso.
—Eu espero que sim. —Falei, soltando um suspiro pesado, antes de olhar pro corredor quando escutei uma porta batendo. Camila surgiu dali, com um vestido preto florido, os cabelos presos em um rabo de cavalo e o rosto iluminado com uma maquiagem que a deixou de tirar o fôlego.
—Oi. —Ela sorriu para Bernardo e Felipe. Um sorriso tão bonito que fazia meu coração doer dentro do peito. Ainda me lembrava de quando aqueles sorrisos eram destinados a mim. Mas isso faz tempo demais pra parecer real. —Estou indo no cinema com a Júlia e a Manu.
—Elas contaram. Quando terminar, liguem pra gente que vamos buscar vocês. —Bernardo falou, fazendo Camila assentir com a cabeça, antes de se despedir dos dois e sair, sem olhar na minha direção um único segundo sequer, como se eu nem existisse.
—A coisa desandou de vez, não é? —Felipe olhou pra mim assim que ficamos só nós três de novo. Fiquei de pé, pegando meu celular e os documentos do carro, tentando agir como se aquilo não me incomodasse. Pelo menos não deveria incomodar. —Sinceramente, eu acho que vocês dois deveriam sentar e conversar, sendo sinceros um com o outro.
A verdade é que Camila estava me ignorando dessa forma, como se eu nem existisse, desde a noite que ficamos presos no bar. Quase uma semana atrás. Ela não falou comigo nem mesmo pra pedir o número da minha conta, na qual eu me surpreendi uma manhã ao recebe uma transferência no nome dela, que eu imaginava ser do que ela devia no antigo lugar que morava.
Quando perguntei a Érika, ela confirmou que tinha sido ela a passar, depois de Camila insistir muito. No final das contas, ela estava agindo como eu esperava que agisse quando estipulei aquelas regras de convivência quando ela se mudou pro apartamento. Mas em vez de estar feliz, eu estava incrivelmente frustrado, não com ela, mas comigo mesmo.
—Ela foi super sincera na nossa última conversa. —Falei, umedecendo os lábios com a língua, afastando a lembrança das palavras dela. —E acredite, parece que foi o suficiente pra nós dois. Tenho que me preocupar com a minha irmã agora. Ela é a minha prioridade.
—Que fofo, até parece que me ama. —Érika saiu do quarto, usando roupas completamente pretas, como se estivesse indo pra um enterro. O enterro do nosso pai, eu esperava, e não das minhas chances.
—Pelo menos na frente do juiz, a gente precisa fingir que se ama. —Falei, observando meus amigos rirem e negarem com a cabeça, como se eu e Érika fôssemos impossíveis. —Você tá pronta, pirralha? Não pode falar besteira na frente do juiz.
—Quem fica falando palavrão pra qualquer coisa é você. Vou me comportar como um anjinho. —Érika retrucou, enquanto eu fazia uma careta, pensando como aquela audiência ia ser uma loucura hoje. —Até escrevi e gravei o que vou falar pro juiz.
Mordi o lábio, encarando minha irmã por tempo suficiente para ela me chamar de esquisito. Mas ela não fez isso, porque por baixo da confiança que ela estava exibindo, havia um certo medo. Então estendi a mão pra ela, sentindo seus dedos gelados pelo nervosismo envolverem os meus.
—Se eu não conseguir... —Eu ia perguntar se Érika iria me odiar pro resto da vida, mas ela apertou minha mão e me lançou um sorriso tenso.
—Você vai conseguir. Nós dois vamos conseguir.
Continua...
VOCÊ ESTÁ LENDO
Todas as lembranças perdidas / Vol. 3
RomanceCinco anos atrás Eduardo teve seu coração partido pela sua melhor amiga, assim que ela desapareceu e nunca mais entrou em contato, logo após ele ter se declarado pra ela. Depois disso, ele decidiu que nunca mais iria se envolver com alguém de novo...