12 - Combata Fogo com Fogo

5 3 2
                                    

Samuel agradecia aos céus e a quem mais pudesse ter ouvido. Apesar de todos os seus esforços, ele não teria chegado a tempo se a sorte não tivesse lhe sorrido. De algum modo, a garota ainda estava viva.

        O anjo cavalgara sem parar uma única vez a até chegar em Ascensão. Já no vilarejo, encontrou a caravana, mas nada de Pandora. Alguns membros apontaram que ela teria ido visitar uma fazenda da região, mas ninguém sabia dizer o nome ou a direção do local. Ao sair, encontrou um menino escravo à espreita, assustado. Ele revelara que a garota corria perigo e lhe indicara o caminho.

        Talvez não tivesse tanta sorte se estivesse lidando com outro demônio ou mesmo com o antigo Belfegor, um homem bem mais pragmático. O novo, contudo, havia conquistado uma certa reputação não só por suas proezas em tão pouco tempo na ativa, mas também por seu comportamento pouco ortodoxo.

        A garota também tinha sorte, do contrário não teria chegado tão longe.

        O piromaníaco removeu a lâmina de seu pulso com um puxão e provou o sangue em sua ponta. Em seguida, desacoplou a arma inutilizada de seu braço e a devolveu ao flanco direito. Ele examinou Samuel de cima a baixo e exibiu um sorriso indecifrável.

        — Você deve ser o mameluco — ele disse. — Samuel, correto?

        — Vejo que fez o dever de casa — Samuel respondeu, com indiferença.

        — Não seja modesto. Sua reputação lhe precede — Belfegor sorriu. — Inclusive o que fez antes dos anjos.

        Em outros tempos, talvez Samuel tivesse se incomodado, mas já havia aprendido a não cair em provocações.

        — Sua reputação não fica atrás — ele devolveu. — Quantos infantes foram?

        Belfegor também não deu sinais de abalo, mas demorou para responder.

        — Acho que não entendi.

        — Ah, é mesmo? Então os demônios não passaram os últimos anos matando membros da família imperial?

        — É a sua palavra contra a minha — Belfegor respondeu, rindo.

        — Será mesmo? — Samuel gesticulou para o buraco no chão. — E o que tem a dizer sobre a garota?

        — Sabe que não posso comentar sobre o trabalho. Importa-se se eu subir aí? Essas conversas precisam ser olho no olho, não acha?

        O anjo não respondeu. Mesmo assim, Belfegor caminhou tranquilamente até as escadas e retornou ao terceiro piso. Os dois colocaram o buraco e os restos de maquinário entre eles. Samuel deu uma espiada rápida em Pandora lá embaixo. Parecia estar respirando. Seus olhos se voltaram ao demônio.

        — Quem é o contratante? Dom Guillermo?

        Belfegor fingiu uma expressão de choque.

        — Cuidado, Samuel! Esse tipo de comentário pode lhe render uma guilhotina!

        Samuel não precisava de uma confissão. Bastava apenas que o outro não negasse. Não conseguiria muito mais do que isso. Internamente, já havia entre os anjos o consenso de que os demônios eram os responsáveis pelos assassinatos, só não havia provas. A culpa do imperador era uma questão um pouco mais complexa, mas somente ele, com a ajuda de seus apoiadores, poderia dispor de tais recursos. O interesse dos demônios nessa questão, contudo, era bem mais nebuloso...

        — Só estou curioso. Mesmo sendo filha de quem é, uma ordenhadeira do interior me parece um peixe pequeno demais para um demônio.

        — Sendo justo, talvez nós nem tivéssemos ficando sabendo da existência dela se o seu amigo não tivesse a encontrado primeiro.

Engel - O Prelúdio dos Anjos de FerroOnde histórias criam vida. Descubra agora