O demônio se virou casualmente para a garota, como se o ferimento não o incomodasse, não tanto quanto a imagem da garota viva. Aquilo desafiava a lógica, até feria seu ego.
Rafaela engatilhou a arma mais uma vez puxou o gatilho. O click produzido ecoou quase tão alto quanto o disparo. Frustrada, a garota rosnou e arremessou a arma longe.
— Você não mantém essa droga carregada? — Ela repreendeu Samuel.
— Rafaela! — Pandora gritou, exultante. A leiteira se levantou e agitou os braços violentamente para afastar as moscas enquanto avançava até a ruiva. — Me... deixem... em paz!
Rafaela permitiu que Pandora lhe amparasse e examinasse. O corte era fundo, mas, de algum modo, a garota ainda estava viva. O sangue manchava a camisa quase que por inteiro. Pandora rasgou um pedaço da barra da própria saia e pressionou contra o ferimento, era o melhor que podia fazer para estancá-lo.
— Deveras impressionante — Belzebu disse. Ele estudava o próprio braço e repetia em sua mente o movimento, tentando entender onde ele havia errado. — Acho que não estou acostumado a lutar com adversários de menor estatura. A lâmina deve ter acertado logo acima do seu coração.
— Não é tão esperto quanto pensava, não é, aberração? — Rafaela provocou.
— Bem, há sempre uma lição a ser aprendida. Para mim, — ele levou a mão ao próprio peito, e então gesticulou para a garota —, e para você. Nem todo mundo tem uma segunda chance. Você deveria aproveitá-la e convencer o seu parceiro a irem embora...
— Cale a boca! — Rafaela rugiu. — Você me deve dois ossos.
Belzebu levou um segundo para processar, incerto se teria ouvido corretamente.
— Eu lhe devo o quê?
— O último que encostou nos meus peitos teve dois ossos quebrados — ela explicou. — Você me deve dois ossos.
O demônio pareceu divertir-se com aquilo. Ele se virou para encarar o indígena.
— Samuel, ponha um pouco de juízo na cabeça da sua...
As palavras penderam no ar quando o punho de Samuel encontrou seu queixo e o arremessou a vários metros.
— Não se cobre tanto — Samuel comentou. — Ela também tira a minha concentração, de vez em quando. Você se acostuma.
As moscas zumbiam furiosamente, mas Samuel as ignorou, assim como ignorou o demônio caído e chocado. Ainda segurando o ombro, o anjo foi até a parceira. A situação ainda era desfavorável, Belzebu era um adversário formidável e eles tinham poucas chances de vitória, mas algo naquela virada havia lhe dado uma injeção de ânimo.
— Você está bem? — Ele perguntou.
— Tão bem quanto alguém com um buraco no peito pode estar. Mas não pretendo morrer hoje.
— Eu também não pretendia, mas vamos precisar de um plano se quisermos ter alguma chance de tirar a Pandora daqui.
— Eu não vou deixar ninguém pra trás! — Pandora protestou.
— E eu não vou conseguir dormir se não puder socar aquele merdinha — Rafaela acrescentou. — Talvez se você entregar a ele o presente do Muriel.
Samuel ponderou por um segundo.
— Aquilo não vai ajudar muito.
— Aquilo vai nos dar algum tempo — ela corrigiu. — É só do que precisamos.
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Engel - O Prelúdio dos Anjos de Ferro
AdventureO Imperador está morto. A notícia pegou o país de surpresa, acabando com as esperanças de muitos. Cerca de um ano antes, Dom Pedro II renunciava ao trono em favor do seu então desconhecido irmão, Dom Guillermo, e partia para o exílio na Áustria. A e...