32 - O Olho da Onça

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A espera do lado de fora da mina não foi tão longa, mas cada minuto foi excruciante. Tanto pela companhia indigesta quanto pela ideia perturbadora de que Samuel poderia ter morrido naquelas galerias subaquáticas.

        E se ele fugiu sem mim?, Pandora chegou a cogitar. De fato, ela não o conhecia há tanto tempo assim, como Radamés fizera o favor de apontar. Mas ela não conseguia acreditar nisso. Podiam chamá-la de ingênua, mas ela via algo em Samuel, sabia que podia confiar nele. Só não sabia explicar o porquê.

        Mas ele realmente está demorando.

        Quando Radamés tirou seu relógio do bolso e o verificou mais uma vez, Pandora sentiu um arrepio na espinha.

        — Pois é, mocinha — o sertanista provocou. — Pelo visto, o Samuel não se importa tanto com você. Acho que é uma de nós agora.

        Os homens riram. Um que estava mais próximo deu um beliscão na bunda de Pandora, que deu um salto e um tapa na mão do homem, fazendo os outros explodirem em gargalhadas de novo.

        — O Samuel não faria isso — ela protestou.

        — Está apostando demais nas virtudes dele, senhorita Pandora — Radamés disse, num tom mais sombrio do que de costume. — O homem é um assassino frio, é uma cobra traiçoeira e é tão avarento quanto qualquer um de nós.

        Os olhos de Pandora se estreitaram numa tentativa de mostrar força.

        — Eu não acredito em você.

        — Ah, não? — Radamés se aproximou de Pandora, a encurralando lentamente até que ela desse de costas contra a grade. A mão mecânica do homem se apoiou contra a parede também, logo ao lado da orelha direita da leiteira. — Eu nunca fui atrás dele. A Jovem Onça veio buscar minha ajuda, porque só o bando de selvagens dele não daria conta do que ele pretendia fazer. Nós saqueamos dezenas de vilarejos e ele matava sem dó. Na verdade, eu nunca vi ninguém matar como ele, dá arrepios só de lembrar. Isso prova que ele é um assassino.

        — Não...

        — Mas a melhor parte foi quando chegou o grande plano — ele prosseguiu, seus dedos metálicos tamborilando na parede. — Um ataque a um posto militar onde, segundo ele, conseguiríamos armas e onde uma grande remessa de impostos estava armazenada para ser transportada para a capital. O meu grupo seria a distração enquanto o dele entrava pelos fundos e fazia a limpa. Mas parece que os soldados já estavam esperando por nós. Muita gente boa foi perdida ali. Nós fomos postos para correr. E eu ainda nem cheguei na melhor parte.

        Pandora tentou sair dali, mas o sertanista a cercou com o outro braço.

        — Quando fomos ao ponto de encontro pegar a nossa parte do saque, foi a vez do grupo dele armar uma emboscada para nós. — Radamés fez uma pausa, dando uma risada maníaca. — O desgraçado olhou nos meus olhos quando indicou onde estavam os caixotes. Foi só um dos meus homens puxar a lona que cobria o saque e a flecha em chamas zuniu. Aí, BUM! Quem não morreu na hora, caiu no fosso que se abriu sob nossos pés. Quem não estava perto o suficiente, foi caçado pela mata que nem bicho. E isso prova que ele é traiçoeiro.

        Mal terminou de falar e Pandora lhe acertou no queixo com uma chave inglesa. Radamés vacilou, atordoado mais pela surpresa do que pela força. Quando limpou o sangue de sua boca com a mão, não pôde evitar rir.

        — É como tudo mundo fica repetindo — Pandora disse —, o mundo é assim. Eu não concordo com isso, eu acho que são vocês que fazem ele assim e não têm coragem de mudar. Eu sei que o Samuel deve ter feito coisas erradas no passado, mas sei que ele não se orgulha disso, e isso também não importa. Se uma pessoa tem uma segunda chance, ela não precisa se definir pelo seu passado. O que importa é o que ele faz agora, e o que ele faz agora é tentar mudar o mundo para melhor.

Engel - O Prelúdio dos Anjos de FerroOnde histórias criam vida. Descubra agora