Capítulo 66: Vento e Geada Acompanham minha Jornada

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Victor Tavares, mais conhecido como "Jogador"


"-O que foi que tu falou, moleque? Repete. Repete o que tu falou.Tu me chamou de que? "

Vez ou outra eu me lembrava da voz dele naquele dia.

Esse domingo começou uma merda, eu sonhei com aquela noite. Eu odeio quando sonho com aquela noite, eu não sou de sonhar muito, de todos os meus sonhos só um me traz algum tipo de conforto, é quando eu sonho com aqueles dois. Quando eu sonho com aquela noite eu sei que meu dia vai ser uma merda.

Eu mal levantei e já acendi um cigarro, eu tô fumando demais ultimamente, tenho que maneirar, o Fantasma disse várias vezes pra eu maneirar, eu acho até engraçado porque ele parece que vai morrer a qualquer momento, o cara troca o dia pela noite e fica parecendo um ursinho panda com aquelas olheiras.

Eu lembro que ele ficava puto quando alguém chamava ele de panda quando a gente era criança, ele era gordinho,branquelo,favelado e como trabalhava de noite no movimento ficava com umas puta dumas olheiras aí o apelido pegou: "Panda"

Ele ficava puto sempre que alguém lembrava disso. Depois que ele escolheu o nome de Fantasma teve um dia que um mano chamou ele de Panda na frente da galera e o Fantasma deu uma coronhada na boca dele que o maluco perdeu todos os dentes da frente, ele ainda mandou o cara tirar a roupa e voltar nu pra casa, todo mundo riu daquele otário.

A gente foi crescendo no movimento desde cedo, a mãe do Fantasma era uma maluca crente mas era até legal, o pai dele era outro crente e era um arrombado safado. O Fantasma foi a primeira pessoa pra quem eu contei quem era meu pai quando eu tinha uns 12 anos.

"-Meu pai é o Pantera! - eu disse empolgado.

-Nem fudendo, menó! Tu tá de caô! - ele respondeu.

-Tô falando! Ele vem lá em casa toda noite ficar com minha mãe. Foi ela que me disse que ele era meu pai. "

Eu via o Pantera como um super herói, ele era o homem mais poderoso do Complexo e era meu pai, eu tinha tanto orgulho disso que meu peito chegava a doer, eu queria poder gritar pra todo mundo que ele era meu pai e abraçar ele. Minha mãe me dizia que eu devia ficar calado por enquanto, que ele tinha pedido pra que isso fosse nosso segredo, que era pra me proteger. Quando eu via o Pantera andando na comunidade todos iam o abraçar e apertar sua mão, os mais velhos o amavam e ele parava pra ouvir cada pedido, cada queixa, cada conversa, até mesmo a das idosas mais chatas ele parava e ouvia atentamente.

Ele comprava bola pras crianças jogarem, bonecas pras meninas brincarem e carrinhos pros meninos brincarem. Ele era amado por onde quer que passasse, e toda noite ele vinha na minha casa. Eu ficava acordado pendurado na lage esperando ele vir, e ele vinha toda noite ver minha mãe, durante o dia ele usava armas e colete, grandes correntes de ouro e anéis mas durante a noite o negão Pantera vinha de calça e camisa polo, perfumado e com o cabelo brilhando de gel, ele sempre vinha com uma pistola na cintura, se eu fechar os olhos eu posso até lembrar o cheiro do perfume que ele usava.

Quando ele chegava eu fazia questão de ir até a porta e abrir pra ele entrar. Ele sempre sorria pra mim e passava a mão na minha cabeça e era esse momento que eu esperava.

Ele e minha mãe ficavam conversando na cozinha e depois minha mãe ligava o som e botava um cd pra tocar, um cd que ele deu de presente pra ela. Os dois ficavam dançando e eu ficava ali observando eles deslizarem na cozinha da casa, quando a música acabava eles ficavam abraçados por vários minutos, depois ele ia para o quarto da minha mãe e ela me levava para a casa da minha avó que ficava na mesma rua.

O Dono do Morro : Eu Odeio Amar VocêOnde histórias criam vida. Descubra agora