NathanDeixo Tasi brincando de Tetris com nossas malas e vou para a cozinha
pegar uma bebida para ela, ansioso para sair dali antes que ela me peça
ajuda.
Ao abrir a porta, a última pessoa que eu esperava ver ali era meu pai.
Parece estranho dizer que encontrou alguém na casa da pessoa, mas ele
nunca está em casa.
Eu achei que ele não teria me visto entrar por estar envolvido demais
com o que estava lendo, mas então ele fala:
— A que horas vocês vão?
— Daqui a pouco.
— Eu gosto dela. Ela é determinada. Isso é bom. Vai precisar disso para
ter sucesso. Você a ama?
— Sim.
Ele balança a cabeça para si mesmo e finalmente olha para mim,
juntando as mãos e apoiando o queixo nelas.
— Ela me lembra a sua mãe quando a conheci pela primeira vez. Forte,
bonita, sem medo de nada. Uma vez ela chamou o seu avô de porco
misógino, sabia? — Ele sorri e, pela primeira vez em muito tempo, é um
sorriso de verdade. — Na cara dele. Quase me engasguei com a bebida,
morto de vergonha. E, quando brigamos depois, ela me desafiou a provar
que não era verdade.Eu me apoio no balcão da cozinha e lhe dou total atenção, desesperado
para saber mais sobre minha mãe.
— Eu não sabia disso.
— Eu não podia, é claro. Seu avô era um sacana, essa é a palavra. Ele era
muito rigoroso, e sua mãe não gostava disso. Acho que ela foi a única pessoa
que o enfrentou na vida. Ela era a única pessoa que me defendeu, pelo
menos. — Ele pega os papéis que estava lendo e tenho a impressão de que a
conversa acabou, mas ele os solta e suspira. — Anastasia te ama também.
Isso está na cara. Uma mulher como ela, como a sua mãe… Ela vai ser
incrivelmente leal e protetora. Você tem sorte.
— Se a mamãe era tão incrível, por que você fez aquilo?
Eu não preciso explicar o que era “aquilo”. Ele sabe do que estou falando,
mesmo sem dizer.
— Pessoas cometem erros, Nate.
— Alguns erros são imperdoáveis.
Ele acena com a cabeça.
— Eu sei.
Tasi entra na cozinha e para quando nos vê de lados opostos da ilha.
— Desculpa interromper, eu queria…
— O que foi, Tasi? — pergunto educadamente para que ela não surte ao
ver que eu estava conversando de verdade com meu pai.
— Eu preciso que você se sente na mala. Não está fechando, e Sasha é
muito leve.
— Já vou.
Ela assente e vai embora em um piscar de olhos. Olho de novo para meu
pai, mas ele voltou a encarar os papéis.
Agora, vendo seus ombros caídos e a expressão vazia em seu rosto,
percebo que ninguém pode odiá-lo por seus erros mais do que ele mesmo.
Voltar para Los Angeles me dá uma sensação estranha. Claro, ficar longe
do meu pai é a melhor coisa para todo mundo, mas não tive muito tempo
para ver Tasi dar uma de irmã mais velha com Sash.Eu sei que deveria agradecer pelo dia que elas puderam passar juntas,
sendo que nem eram para ter se visto, mas sou ganancioso. Quero vê-las
felizes curtindo a companhia uma da outra.
A promessa de Ano-novo de Tasi é ler mais, então ela passa o voo de
volta inteiro com a cara enfiada em um livro que comprou no aeroporto.
— É uma releitura inversa de Uma linda mulher — ela me conta,
empolgada. — Ela é autista e contrata um acompanhante para ser melhor na
cama. É tão bom, e a Stella é engraçada e fofa.
Eu pego o livro da mão dela, examino a capa azul, e paro em uma página
aleatória.
— Você está lendo pornografia em público? Que safada!
Ela cobre minha boca com a mão, me fazendo jogar a cabeça para trás de
tanto rir.
— Para de gritar. — Ela briga comigo e olha ao redor para ver se tem
alguém olhando para nós. Ela abaixa a voz e me puxa para perto. — Não é
pornografia. É um livro de romance que por acaso tem cenas de sexo.
Ela tenta esconder o rosto, mas pego seu queixo e viro o rosto dela para
mim. Eu a beijo e me aproximo do seu ouvido.
— Tudo que você ler, eu faço com você quando chegar em casa.
Quando me encosto, vejo as mil possibilidades passarem pelos seus
olhos.
— Sinceramente, não é esse tipo de livro… mas eu tenho alguns em casa
que podem ser… — o vermelho em seu rosto fica mais forte — ...
interessantes para você.
— Eu amo uma mulher que gosta de ler.
— Sai fora, Hawkins. Você teve ela só pra você por semanas, não dá pra
dividir por cinco minutos?
Eu nem estava fazendo nada quando Lola começou a abusar verbalmente
de mim. Bom, eu me aproximei para beijar Tasi na cabeça quando passei por
elas, mas fora isso, as deixei em paz. Mas Henry…
— Você não é a única que precisa conversar com ela, Lola — resmunga
ele, cruzando os braços e colocando os pés gigantes sobre a mesa como sefosse uma criança mimada. — Eu tenho minhas coisas também.
Eu atravesso o cômodo, pisco para Tasi em vez de chegar perto dela
porque Lo me dá um medo da porra, e me jogo ao lado de Hen.
— O que rolou? — Entrego uma cerveja para ele enquanto Henry me
olha como se eu tivesse duas cabeças. — As suas coisas. Posso ajudar?
— Eu não tenho coisas… mas eu poderia ter coisas se quisesse. Eu
poderia ter mais coisas do que Lola. Eu poderia ter mais coisas que todos
vocês.
— Ninguém tem mais coisas do que Lola — sussurra Robbie e olha por
cima do ombro para se certificar que ela não ouviu. — Tanto metafórica
quanto literalmente.
Conversar com os meninos demorou cerca de quinze minutos, mas Lo
não consegue fazer nada em quinze minutos. Quinze minutos é só o
aquecimento dela.
Depois de uma hora de conversas baixas na cozinha, Anastasia se
aproxima e se aperta entre mim e Henry.
— Você teve um bom Natal, Henry?
— Você se afogou — responde ele.
Ela fica um pouco em choque e a cabeça se vira para mim, depois para
Henry.
— Eu sei, mas estou bem agora. Nathan me salvou.
— Você poderia ter morrido. — Ele olha para as próprias mãos em vez de
olhar para ela, e não sei por que estou surpreso. Henry ama Tasi como se
fosse uma irmã e me mandou mensagem todos os dias para checar se ela
estava bem. Eu achei que isso tinha sido o bastante para ele, mas pelo visto,
não.
— Mas não morri e estou aqui — responde ela, gentil, apoiando a cabeça
no ombro dele.
Ele se levanta rapidamente e vai para a cozinha onde fica encarando a
geladeira por mais tempo do que o necessário.
— Podemos ir pra cama? Estou cansada — ela me pergunta. Eu olho mais
uma vez para Henry e concordo, ciente de que ele precisa respirar um
pouco.Eu a sigo para o andar de cima e trabalhamos como uma equipe para nos
lavarmos, trocarmos e prepararmos para a cama. Ela se agarra em mim e faz
carinho no meu peito.
— Sinto falta da sua cama.
— Quer que eu compre o mesmo colchão?
— Não — diz ela, prolongando o “ã” como se quisesse dizer sim. — Não
tem por quê, a formatura é daqui a seis meses. Vai ser mais uma coisa para
levar quando se mudar.
— Sim, mas você vai continuar aqui.
A tentação de reprovar este ano e refazê-lo só para me formar com ela é
forte. É estranho? Sim. Eu me importo? Não. Mas acho que os Vancouver
Vipers se importariam, e é por isso que estudo.
Anastasia se solta de mim e se senta de frente, com as pernas cruzadas.
— Nathan… Eu não quero morar aqui ano que vem. Ainda mais com
você no Canadá.
— Por que não? — Sinto um aperto no estômago, e eu queria poder
voltar trinta segundos no tempo e não começar a ter esta conversa. — Por
que tenho a sensação de que você vai me falar algo que eu não quero ouvir?
— Provavelmente não quer, mas não quer dizer que não devemos
conversar sobre isso. — Ela ri e coloca a mão na minha coxa. — Eu amo que
vocês gostam que eu more aqui. Sinceramente, não sei o que seria de mim
sem os meninos. Mas, como eu disse várias vezes, quero voltar pro meu
apartamento.
— Você quer morar com o cara que vive falando merda de você? —
pergunto de um jeito muito, muito mais grosseiro do que gostaria.
— Olha, eu sei que pode não fazer sentido pra você, mas não precisa. Lo
me contou tudo o que perdi enquanto estava sem celular, e eu acho que
Aaron está pronto para resolver as coisas.
— Anastasia, ele foi maldoso com você. Ele é um mentiroso e um bully.
Você não precisa dele.
— Sim, eu sei disso! Isso não sai da minha cabeça, mas não estou dizendo
que vou ser amiga dele. Mas eu preciso dele, sim. Ele é meu parceiro de
patinação e, a menos que eu queira começar do zero, algo que não estoudisposta a fazer depois de dois anos de sofrimento, preciso achar um jeito de
trabalharmos juntos.
— Eu odeio isso.
— Eu sei que odeia, amor. E eu amo o quanto você é protetor, mas era
para eu ficar aqui só temporariamente. Você sabe como é difícil passar cada
segundo do dia com você sabendo que vai embora em seis meses?
— Eu não quero me mudar também, mas você sabe que não tenho
escolha!
— Não foi isso que eu quis dizer, Nathan. É claro que quero que você
jogue no seu time dos sonhos. Mesmo que não tenha assinado o contrato
ainda, eu apoio que você vá para qualquer lugar que quiser. — Ela suspira, e
esse som, que escuto com tanta frequência, me diz o quanto ela está
mentalmente exausta com essa situação toda, e me faz odiar que nossas
férias de fim de ano estão terminando assim. — O que quero dizer é que
quero ficar empolgada por você daqui a seis meses, e não ficar chorando
porque não quero que vá embora. Acho que vai ser bem mais fácil se estiver
no meu apartamento de novo.
Ela toca nos lábios e balança a perna. Está nervosa. Meu coração dispara.
— O que você não está me contando?
A mão na minha perna se mexe, me preparando para a notícia ruim que
está prestes a me dar.
— Aaron foi liberado para patinar de novo. Eu ia te contar de manhã,
porque foi um dia muito longo, mas acho que isso quer dizer que você pode
voltar a jogar.
Saber que posso jogar hóquei de novo deveria ser música para os meus
ouvidos, mas, na verdade, parece que estou perdendo Anastasia.
— Então não vamos mais patinar juntos, e você vai se mudar daqui? —
questiono. — Eu vou ser só mais um cara às quintas-feiras à noite? Quando
vai ter tempo pra mim no seu planner?
Eu me arrependo assim que as palavras saem da minha boca.
Ela arregala os olhos, e vejo que fica tensa.
— Você está chateado, Nathan, mas, por favor, não fala assim comigo.Eu peço desculpas, mas a vergonha que sinto não deixa que minha voz
saia mais alto do que um sussurro.
— Você é meu namorado e eu te amo. Vou te ver sempre que puder, mas
você está se precipitando. Eu vou ouvir o que ele tem a dizer, é só isso.
— Você tem um coração grande demais, Tasi — murmuro, e a puxo de
volta para mim, me sentindo melhor assim que seu corpo encontra o meu.
— Não quero que ele te magoe mais do que já fez. Eu não confio nele, mas
confio em você e no seu julgamento. Vou ficar ao seu lado, seja lá o que
decidir.
Ela pega no sono rápido, e eu ouço o barulho suave da sua respiração,
deixando esse som me acalmar. Não funciona, e eu durmo pensando que
definitivamente não confio em Aaron Carlisle.
O cheiro de flores está tomando conta dos meus sentidos e estou ansioso
para voltar para o carro. O florista não tem pressa alguma para embrulhar as
peônias que escolhi e estou muito consciente de JJ passeando ao meu redor,
falando sozinho.
— O que você está resmungando aí?
Ele enfia as mãos nos bolsos e dá de ombros.
— Eu quero um cara gato que me dê flores.
Eu o encaro, esperando pelo sorriso arrogante dele para saber que está
brincando.
— Tá falando sério?
— Tipo, seria legal ganhar flores, sabe? As pessoas com quem eu saio
esperam que eu compre flores para elas. É sempre, tipo, “JJ, nossa, seu pau é
tão grande”, ou “Nossa, você é tão inteligente”, ou “JJ, esse foi o melhor sexo
da minha vida”. Nunca é “JJ, comprei flores pra você”. Deixa pra lá, é besteira.
— Ele chuta o ar e passeia em torno dos girassóis.
Quando me viro de novo para a florista, ela também parou para ouvir o
lamento de JJ. Balanço a cabeça enquanto coloco a mão no bolso para pegar
mais dinheiro.
— Pode fazer dois buquês, por favor?Ainda estou com o cheiro forte das flores no meu nariz no caminho de
casa. JJ está sorrindo de orelha a orelha, segurando suas peônias azul-claras,
e as rosas de Anastasia estão nos joelhos dele, para não amassarem.
Merdinha manipulador.
Eu adoraria dizer que estou comprando flores para minha namorada só
porque a amo, mas, para ser sincero, são flores cheias de culpa.
Flores lindas e caras e cheias de culpa.
Eu não gosto de como falei com ela ontem à noite e, apesar de ter pedido
desculpas e me arrependido imediatamente das minhas palavras, na minha
cabeça eu queria ter dito coisa muito pior.
Eu queria brigar com ela e lembrá-la de todas as coisas terríveis que
Aaron falou, tudo que ele fez que a deixou se sentindo mal. Fazer com que
ela visse por que ele deveria ficar longe das nossas vidas.
Mas não é justo, porque ela sabe disso. Eu a abracei enquanto chorava por
causa das palavras dele. Ela sabe exatamente por que deveria ficar longe dele.
Não posso fingir que parte de mim realmente não quer dividi-la com ele.
Patinar com ela todos os dias pelas últimas seis semanas me deixou malacostumado.
Acordar ao lado dela, cozinhar com ela, até malhar e estudar
com ela me deixou mal-acostumado.
E se ela fizer as pazes com Aaron e decidir que não precisa mais de mim?
Quero construir uma vida com ela: uma que vai continuar quando Maple
Hills for apenas uma lembrança, então isso tudo faz parecer que estamos
andando para trás. Todos os meus instintos me dizem para segurá-la,
interferir, protegê-la, mas sei que isso não é certo. Não vou ser esse tipo de
cara. Não vou ceder a isso depois que Anastasia trabalhou tanto em si
mesma. Ela merece a melhor versão de quem eu sou, e essa versão confia e
apoia sua namorada.
E também compra flores quando age que nem um babaca.
Eu e JJ fomos falar com o treinador Faulkner e, por sorte, ele estava de
bom humor. É o que sempre acontece, depois de duas semanas longe de nós.
É um cara completamente família e, apesar de ser assustador, é um pai
muito gentil para as filhas, então adora passar o fim de ano com elas.Ele não fala muito sobre as meninas. Imogen e Thea devem estar pelo
menos no fim da adolescência, mas tenho medo de perguntar, mesmo por
educação.
Faulkner confirmou o que a Lo disse, o que é um alívio e um estresse.
Aaron recebeu alta enquanto estava em Chicago; Brady mandou um e-mail
hoje pela manhã e disse que tudo voltará ao normal amanhã.
— Anime-se, caralho — diz o treinador quando eu não pulo de alegria
como ele esperava. — Se isso for por causa da menina, Hawkins, eu juro por
Deus…
— Ela é minha namorada, senhor.
Ele suspira, apertando a ponte do nariz.
— Justo do que você precisava no último ano: uma namorada. Pelo amor
de Deus, use camisinha. Estou falando sério, pelo bem de vocês dois, usem
proteção.
JJ ri ao meu lado até Faulkner lhe lançar um dos seus olhares famosos.
— Nem começa, Johal.
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Quebrando o Gelo- Hannah Grace
RomanceUma patinadora artística ultracompetitiva tem de dividir o rinque com o capitão «quebra-corações» da equipa de hóquei? O gelo não vai quebrar entre estes dois, vai derreter! Anastasia treina todos os dias com a ambição de garantir um lugar na equipa...