Capítulo 14

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Nathan

Às vezes eu não uso o bom cérebro que tenho.
É vergonhoso e vou admitir que mereço o gelo que vem pela frente.
Eu sou um babaca do caralho. Provavelmente o maior babaca da história.
Que tipo de cara tem uma mulher debaixo de si, uma mulher com quem
vem sonhando há semanas, e diz que não vai transar com ela quando ela
pede uma camisinha?
Não poderia ter escolhido uma situação mais íntima para rejeitá-la, e
nem era minha intenção. Espero que ela entenda isso. De qualquer forma,
mesmo que entenda, ficou magoada, ainda que eu tivesse a melhor das
intenções.
É que eu estava bêbado e cheio de ciúmes depois que ela tentou usar o
código do quarto do Ryan para entrar no meu. Estraguei tudo por besteira.
Parabéns, Hawkins.
Eu queria mostrar para ela que não a quero só quando estou bêbado, que
a quero a todo momento. Gosto do jeito dela e quero conhecê-la melhor,
mas realmente estraguei tudo.
Só percebi que ela não estava ali quando me virei, meio sonado, tentando
colocar o braço na cintura dela. Óbvio que ela me esperou cair no sono para
ir embora, e não posso julgá-la por isso.
Desde quando acordei, tentei ligar, mas a ligação vai direto para a caixa
postal. Ela só me deu seu número ontem à noite, e quase caí no chão em
choque. Depois de gozar, ela ficou fofa, sonolenta e calma, sentada no meucolo, falando besteira, me perguntando várias coisas e olhando para mim
com aqueles olhões azuis.
Eu peguei meu celular do bolso para ver a hora, e ela comentou algo
sobre tomar cuidado para não deixá-la ver todos os nudes que eu recebia.
Desbloqueei o celular e entreguei para ela, dizendo que podia ficar à
vontade. Ela foi para a seção de contatos e digitou seu telefone.
— Qual nome eu coloco?
— O seu nome geralmente é uma boa — provoquei.
Ela riu e tamborilou as unhas na capinha do celular.
— Hum… Sem graça… Eu quero ser… “a puta que peguei no carro”. Não,
muito longo. “Puta do Uber”. Perfeito.
Não consegui segurar o riso.
— Tá de brincadeira, né? — perguntei, mas ela já estava digitando.
Então agora estou tentando falar com a Puta do Uber.
PUTA DO UBER
Atende o celular, Tasi.
Por favor.
Atende o celular ou vou mudar seu nome.
Vai ser algo sem graça tipo Tasi ou Anastasia.
Vai ser o fim da Puta do Uber.
Espero que consiga se lembrar dessa conversa.
Só me falta ela achar que estou chamando ela de puta.
Depois de encarar o teto do quarto por uma hora e não receber nenhuma
ligação ou mensagem, me arrasto para fora da cama.
JJ, Robbie e Lola estão comendo na cozinha quando finalmente desço;
estão acabados e de ressaca, mas estão todos rindo. Bom, até eu aparecer e
os olhos de Lola se semicerrarem.
— Cama vazia, Hawkins?
Passo a mão pelo rosto e me arrasto até eles. Apoio os cotovelos na ilha
da cozinha e me preparo para a tortura.
— Eu sei, Lols, eu sei. Como você já sabe disso? Nem foi pra casa ainda.
— Porque a gente viu ela sair vestindo sua camiseta uma hora depois que
vocês subiram.Pela primeira vez na vida, JJ e Robbie estão em silêncio; encaram as
tigelas de cereal como se fossem as coisas mais interessantes do mundo.
— Estou ligando sem parar, mas ela não atende. Qual é o número do
apartamento de vocês? Eu vou lá.
— Levou pancada demais na cabeça, menino? Ela tá lá em cima. — Lola
pega sua xícara de café e leva aos lábios, sem tirar os olhos de mim enquanto
bebe. — Eu não ia deixar minha amiga pegar um Uber bêbada, triste e
vestindo só uma camiseta. Ela dormiu no quarto do Henry.
— E onde Henry dormiu? — pergunto com toda a calma possível.
— Não sei, talvez tenha se aconchegado com ela. — O sorriso de Lola é
imenso, quase sinistro. — Eles não desceram ainda. Dizem que homens já
acordam de pau duro. E ele é tão gentil e legal; são sempre os mais
quietinhos, né? Henry vai cuidar bem dela.
Mesmo correndo escada acima, ainda consigo ouvir a risada de Lola.
Correr de ressaca não é uma boa ideia.
— Não foi engraçado, Lola.
O quarto de Henry é do lado do meu, então não ter ouvido nada é um
bom sinal. Bato à porta e espero alguém me deixar entrar. Agora que estou
do outro lado da porta consigo ouvi-la rindo. Bato de novo, mas ninguém
responde.
Foda-se.
Aperto o zero quatro vezes; Henry tem pavor de ficar trancado do lado de
fora e não conseguir entrar para pegar suas coisas.
Ela ainda está deitada embaixo dos lençóis, de rosto limpo e cabelo
molhado, e segura uma caneca de café nas mãos. Está rindo de algo que
Henry disse, mas, quando me vê, a diversão desaparece, e sua expressão se
torna um sorriso forçado.
Para o meu alívio, Henry está sentado em um colchão inflável meio vazio.
Ele olha para mim, para ela, então se levanta.
— Vou tomar café da manhã.
Ele passa por mim, desconfortável, e quando escuto seus passos na
escada, entro no quarto e me sento na beirada da cama. Ela se senta e apoiaas costas na cabeceira. Ainda está vestindo minha camiseta e, puta merda,
como é linda.
— Tasi, me desculpa.
Ela continua com o sorriso forçado.
— Não precisa pedir desculpa, Nathan. Você tem o direito de dizer não a
qualquer momento. Eu nunca, jamais, ficaria chateada com você por mudar
de ideia. — Ela respira fundo e repousa a caneca na mesa de cabeceira. — É
que…
— Tasi, para — interrompo, e me aproximo um pouco. — Fico muito
feliz que você saiba disso, e é claro que tem razão, mas não é esse o caso. Eu
não estava mudando de ideia nenhuma, só estava com ciúme. — Nossa,
como me sinto idiota de admitir isso. — Eu achei que, se a gente transasse,
você ia acordar hoje de manhã e sumir. Odeio quando fica chateada comigo,
e toda vez que parece que consigo passar pelos muros que você coloca entre
a gente, algo acontece e volto à estaca zero.
Ela escuta tudo que tenho a dizer: sem discutir, sem revirar os olhos, sem
responder.
— Eu tenho problemas com rejeição — diz ela, baixinho. — Nunca lidei
bem com isso, desde criança. Ontem me senti rejeitada e ansiosa. Eu só
queria ficar contigo, e você começou a falar sobre não me dividir com
ninguém.
Ela se mexe na cama, brinca com as pontas dos cabelos, e percebo que
está se sentindo desconfortável.
— A minha sensação é que você quer um relacionamento ou alguma
coisa que está além do que posso te oferecer. Eu me sinto muito atraída por
você, Nate, mas a gente mal se conhece. Desculpa por ter ido embora. Eu só
não gostei do que rolou e senti uma necessidade de fugir da situação.
Ela tem razão. Eu gosto dela, mas não levei em consideração o que ela
queria.
— Eu gosto que você saiba falar sobre seus sentimentos.
Ela ri e puxa os joelhos para o peito, enfiando-os por baixo da minha
camisa.— Eu já fiz terapia pra cacete. Demorei anos para conseguir dizer “eu
tenho problemas com rejeição”. O dr. Andrews vai ficar muito feliz por eu ter
conseguido dizer isso em uma situação real.
— Você pode ser a paciente modelo dele. Olha, sinto muito que você
tenha se sentido assim. Não era minha intenção.
— Isso é muito estranho. Eu queria cavalgar você a noite inteira, Nathan,
não causar uma cena dessas. Preciso ser sincera: eu não curto esse negócio
de exclusividade. Não gosto de compromisso. Não tenho tempo. Minha
agenda já está cheia.
Mais clara e direta impossível. Eu não gostei de nada do que falou, além
do fato de querer me cavalgar, porque eu quero isso também, mas não posso
dizer que ela não se comunicou bem.
— Entendi, Allen, em alto e bom som. Fobia de compromisso, saquei.
Queria deixar registrado que, agora que estamos entendidos, você pode me
cavalgar quando quiser.
— Ah, Nate — ela fala com uma voz fofa e arrogante ao mesmo tempo,
com um sorriso imenso estampado no rosto. — Não estou mais bêbada.
Você voltou pra minha lista de inimigos, ok? Vou considerar te tirar dela
quando me devolver meu rinque.
— Achei que eu estava sob observação. Quando isso virou uma lista de
inimigos? Estou pelo menos no topo? Sou o número um?
— Sem dúvida alguma você é o número um.
Ficar no topo da lista de inimigos de Tasi é a coisa mais fácil que já fiz na
vida.
Treinamos antes dela e de Aaron todos os dias da semana, porque Brady
mandou que eles fizessem alguma merda lá para compensarem os erros que
cometeram na competição regional.
O problema é que todo dia o treino começa e termina em atraso, porque
Faulkner fica reclamando das coisas. Ela fica em pé, bufando, de braços
cruzados, tentando me matar com o olhar.
— Tasi… — tento falar enquanto saio do gelo e passo por ela.— Nem começa, Nathan, a menos que queira que eu te bata com seu taco
de hóquei — diz ela com uma voz tão calma que é ainda mais assustadora
do que um grito. Na hora eu sinto um calafrio.
Ontem, estávamos ocupados ganhando nosso jogo em San Diego, então
ela teve o rinque inteiro para si, mas hoje acho que não saio daqui vivo.
Consigo vê-la pela visão periférica enquanto patino de um lado para o outro
do rinque. Ela está usando uma roupa azul-bebê; é estranho ver alguém tão
furioso vestindo uma cor tão delicada.
Apesar de não conseguir ver seu corpo, imagino que a roupa está
marcando todas as curvas dela, então pelo menos vou ter uma bela visão
antes de morrer.
Vejo ela discutindo com Aaron, o que me deixa mais feliz do que deveria,
mas me distrai o suficiente para deixar JJ se chocar comigo, e saio voando
até as laterais.
— Presta atenção, otário.
Olho para o relógio e sei que estamos uns quinze minutos atrasados.
Faulkner disse para não pararmos até ele mandar, e ele não vai fazer isso até
ver Brady parada ali, batendo o pé.
Todos os músculos do meu corpo doem, porque ele está fazendo a gente
treinar como se fosse o exército, e ele…
O que caralhos ela tá fazendo?
Ela está patinando até o meio do rinque com um olhar determinado no
rosto e parece pu… Ela vai começar a fazer a coreografia? Vai ser esmagada.
Cacete, cadê Aaron e Brady?
— Tasi, sai da pista! — Ela nem olha para mim, só levanta o dedo do
meio e continua o que está fazendo enquanto os caras patinam ao seu redor.
Bobby para do meu lado.
— Ela vai se machucar, capitão. É melhor você fazer alguma coisa.
Ela está deslizando pela pista em meio ao time, e sinto como se estivesse
tentando pegar uma borboleta. Um vulto azul girando e deslizando,
ignorando o perigo ao redor. Metade dos caras nem percebeu a presença
dela ainda, então não desaceleraram e, infelizmente, está difícil alcançá-la.Sou o capitão de um time de hóquei e não consigo acompanhar o ritmo
de uma patinadora artística de um metro e sessenta… Nunca vou conseguir
superar essa.
Ela finalmente desacelera para fazer umas piruetas elaboradas e consigo
alcançá-la, então a agarro e a coloco no meu ombro, ignorando os gritos de
raiva. Seus punhos batem nas minhas costas, e fico feliz por estar usando o
equipamento de proteção.
Não disse uma palavra, mas ela sabe que sou eu.
— Nate Hawkins, me solta agora.
Minha mão segura a parte de trás das suas coxas; eu aperto de leve.
— Cala a boca, Anastasia. Está tentando se machucar?
Ela tenta se desvencilhar, mas estou segurando firme, então só consegue
me bater e, sinceramente, não é tão ruim quanto pensei.
— Para. De. Me. Mandar. Calar. A. Boca! Me solta, Nathan! — A raiva
borbulha a cada sílaba e sei o que vem pela frente assim que eu a soltar.
Quando a coloco no chão do lado de fora do rinque, seus olhos parecem
em chamas, suas bochechas estão vermelhas e as mãos, fechadas em punhos.
Suas mãos vão para os cabelos, seus dedos se entrelaçam quando ela
balança a cabeça, nervosa, seu peito arfando. Estou tentando me concentrar
na fúria, não nos peitos dela, mas é difícil.
— Anas…
— Se você… — seu olhar trava no meu, e congelo ao ouvi-la falar em voz
baixa — ... tocar em mim de novo, Nathan Hawkins, eu te garanto que o
único trabalho que vai conseguir em uma pista de patinação vai ser
dirigindo um nivelador de gelo. Entendeu?
Eu mordo a língua porque, puta merda, quero tanto beijá-la agora. Suas
mãos descem até o quadril. Ela fica tão gostosa quando está com raiva.
— Entendi.
— Você está atrasado e atrapalhando minha agenda. Eu tenho planos
para hoje e vou me atrasar porque você não sai da porra da pista e me deixa
patinar.
— Quais são seus planos?
Ela bufa e cruza os braços.— Não é da sua conta.
— Hawkins! — grita o treinador para chamar minha atenção para a pista.
— Chega de papo!
Eu olho mais uma vez para ela.
— Você tá linda hoje.
Anastasia abre e fecha a boca em seguida, e sei com certeza que a peguei
de surpresa com essa. A raiva em seu rosto começa a se dissolver, o olhar
relaxa, e por uma fração de segundo, como se fosse mágica, o mundo
desaparece.
— Ah, vai se foder, Hawkins — grita ela ao se afastar de mim, pisando
forte.
Me sinto uma espécie de detetive tentando descobrir para onde ela vai
hoje.
— Stalker é a palavra que a polícia usa pra isso, Nate — comenta Henry
do outro lado da sala. Eu nem duvido que ele saiba aonde ela vai; deve ter
simplesmente perguntado e ela falou. É essa a dinâmica entre esses dois, né?
Pego meu celular e torço para ela ter pena de mim agora que terminou
seu treino.
PUTA DO UBER
Vai pra onde hoje?
Quem é?
Você sabe quem é.
Desculpa, acho que é engano.
Humm.
Acho que não. Festa?
Encontro com uns motoqueiros.
Enormes.
Cheios de esperma.
Adorei a referência.
Você é tão malcriada.Vamos fazer o seguinte, Hawkins. Se conseguir
me encontrar antes da meia-noite, eu deixo você
finalmente foder essa “minha boquinha”.
Assim vou deixar de ser “essa garota malcriada,
mandona e impaciente”? O que acha?
Você vai ficar tão linda com meu pau na sua
boca.
Boa caçada!
Anastasia tem um talento para usar minhas próprias palavras contra
mim, mas agora me deu o incentivo perfeito para encontrá-la.
Merda.
Henry tem razão; eu pareço mesmo um stalker.

Quebrando o Gelo- Hannah GraceOnde histórias criam vida. Descubra agora