Capítulo 49

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Anastasia

Flashes estouram ao nosso redor, e meu peito está doendo tanto que não
consigo respirar.
Eu o empurro, mas ele me segura com força, e não quero fazer uma cena
no meio do gelo, já que tem cerca de trinta câmeras filmando tudo de vários
ângulos.
Filmando.
Isso vai estar disponível para todo mundo ver. As pessoas já viram; estão
vendo de novo. Nathan está em casa, vendo isso, neste momento. Vendo a
gente se beijar.
Vou vomitar.
Aaron finalmente se solta de mim e se inclina para trás com um sorriso
vitorioso no rosto. Ele levanta um braço para acenar para a multidão, e estou
me segurando para não cair no choro na frente de todo mundo. Meu corpo
começa a se mexer sozinho, me levando para fora do gelo em direção ao
rosto sorridente de Brady.
Claro que está sorrindo: fomos perfeitos. Eu senti em cada movimento,
cada rodopio e curva, cada momento em total sintonia sobre o gelo. Até
Aaron colocar a boca na minha sem permissão e estragar tudo.
Eu pego os protetores de lâminas das mãos da treinadora, desvio do
abraço que ela tenta me dar e entro no túnel para fugir das câmeras e de
Aaron.Mal consigo ver a saída na minha frente por causa das lágrimas que
borram minha visão.
— Tasi! — grita Aaron atrás de mim, e consigo ouvir a confusão na voz
dele. Ele não entende por que estou saindo correndo dele quando
deveríamos estar comemorando nossa performance maravilhosa.
Uma performance inacreditável.
O tipo de performance que chama atenção do tipo de pessoa que você
quer chamar atenção.
Ele segura meu braço, me faz parar, e não tenho escolha a não ser me
virar para encará-lo. Quero parecer forte, dar a impressão de que ele não me
afeta, mas não consigo, porque as lágrimas começaram a rolar.
— Acabou, Aaron. Você foi longe demais dessa vez.
Suas sobrancelhas sobem tanto que quase tocam seu cabelo.
— Como assim, “acabou”? Fomos incríveis!
Brady aparece atrás dele, seus olhos voando entre nós.
— Temos que esperar pela nota, Anastasia. Eu sei que você está chateada,
e vamos lidar com isso, mas precisa enxugar as lágrimas e fingir que está
tudo bem para as câmeras. — Meu peito arfa quando eles me encaram com
olhares preocupados. — Eu sei, querida — ela me conforta. — Sinto muito,
de verdade. Mas você precisa pensar na sua carreira. Vamos lidar com isso
depois, prometo.
— Não entendo o que eu fiz — diz Aaron, sem emoção. — Eu não
entendo. Para de chorar, precisamos ir ver nossa posição.
— Não! Pra mim já deu — digo, soluçando. — Eu não consegui afastá-lo
de mim. Ele não parava. Eu não queria. Você não me soltou. Não vou mais
fazer isso, treinadora. Eu não quero, não quero, não quero.
As portas atrás de nós se abrem e fico em choque ao perceber que Nathan
vem correndo. Eu observo ele se aproximar de nós e, ao ver minhas
lágrimas, ele sabe que não era atuação. Não era parte da coreografia. Não
estávamos vendendo uma ideia romântica para as câmeras e os jurados.
— Ah, caralho. Só faltava essa — resmunga Aaron.
— Você está bem? — pergunta Nate, me puxando para um abraço. Os
dedos dele enxugam minhas lágrimas enquanto olho para ele e nego com acabeça.
— Quero ir para casa — consigo dizer em meio às lágrimas.
— Isso é ridículo. Anastasia, desculpe se eu te chateei, tá? Mas eu estava
no calor do momento. Era o que as pessoas queriam ver, e eu queria dar isso
a elas. Não vou fazer de novo se você for ficar tão chateada por causa de uma
besteira.
— Você não entende, né? — Nathan sibila para Aaron, me solta e vai na
direção dele. Antes que eu consiga falar para não fazer nada, ele dá um soco
na cara de Aaron, derrubando-o no chão. Brady segura o seu braço antes
que ele faça mais alguma coisa e grita o nome de Nathan. — Você beijou ela
à força, seu merda — grita para Aaron, que está com a mão no rosto.
— Ai, meu Deus. Calma, todo mundo! — grita Brady. — Hawkins, sai
daqui. Aaron, levanta. — Ela mexe no cabelo, perdendo a paciência. —
Anastasia, se recomponha por quinze minutos, por favor. Depois vamos
conversar, prometo.
Aaron e eu devemos estar com uma cara terrível enquanto sentamos no
banco, esperando as notas.
Meus olhos estão vermelhos, e a lateral do rosto de Aaron está inchada,
mas coberta por uma bolsa de gelo que ele pegou. Brady está sentada entre
nós dois, segurando nossas mãos, e não imagino uma situação em que três
pessoas odiaram tanto estar sentadas juntas do que nós agora.
As notas saem e ficamos em primeiro lugar entre as duplas que já se
apresentaram, mas não consigo ficar empolgada. Acabou. Fico parada,
imóvel, ignorando a celebração de Brady e Aaron. Ela coloca o braço sobre
meus ombros para me reconfortar, mas, quando a luz da câmera apaga,
sinalizando que a filmagem acabou, eu me levanto e vou procurar Nathan.
— Anastasia, espera! — A treinadora me chama, e ouço os passos dela
atrás de mim. Eu desacelero, me viro para encará-la e vejo ela correr até
mim de braços abertos. — Eu sinto muito que ele tenha feito isso com você.
— Acabou.
— Você já falou isso, mas o que quer dizer? — pergunta ela com cuidado.
Eu vejo Aaron se aproximando, andando tranquilamente como se nãotivesse feito nada. — Não pode desistir de patinar por causa de um beijo,
Anastasia. Não vou deixar isso acontecer.
— Não vou desistir — digo, olhando por cima do ombro dela quando
Aaron chega perto de nós. — Eu só nunca mais vou patinar com ele.
Ele solta uma risada zombeteira, e sinto um desejo de socar o outro lado
de seu rosto.
— Você nunca vai conseguir outro parceiro e, mesmo se conseguir, não
vão conseguir se preparar em dois anos. Vai mesmo começar sua carreira
olímpica com vinte e sete anos? Porra, seja realista. Só aceita meu pedido de
desculpas, Tasi. Vamos conversar sobre isso com a dra. Robeska semana que
vem. Precisamos nos concentrar na competição de amanhã. Olha como
fomos incríveis! A gente…
Eu deixo ele falar, vendendo seu peixe como um verdadeiro profissional.
E, quando finalmente termina, sorrindo para si mesmo, porque acha que seu
papo furado funcionou de novo, eu olho para Brady.
— Eu vou patinar sozinha. Se nossas notas nos classificarem, por favor,
diga para eles que eu recuso.
Aaron agarra o próprio cabelo quando começa a entender a magnitude
das minhas palavras.
— Você não pode patinar sozinha. Porra, não faz isso comigo, Anastasia.
Depois de tudo que eu fiz por você, puta merda. Para de ser uma puta
teimosa! Você nem é boa o suficiente para competir sozinha. Meu Deus.
Puta merda. Você vai acabar com a minha vida.
— Já chega — grita Brady com ele.
— Eu vou encontrar meu namorado e depois vou para casa. Adeus,
Aaron.
— Tasi, por favor — ele implora.
— Eu confiei em você, Aaron. Por dois anos e meio, eu dei tudo de mim
para essa parceria dar certo, para a nossa amizade dar certo. Tudo que você
fez foi me usar e me manipular, me xingar, dizer que eu não sou boa o
suficiente para ser sua parceira. Bom, finalmente entendi. Você não me quer
e tudo bem, porque eu também não quero você. Prefiro patinar sozinha ecorrer o risco de falhar do que vencer ao seu lado. Ganhar não significa nada
se vou me odiar sempre que estiver com você.
Eu não lhe dou uma chance de responder, pois começo a andar até a
entrada principal, procurando Nate. Parte de mim está livre, leve, mas uma
parte muito maior e mais poderosa faz eu me sentir envergonhada e
decepcionada por ter achado que poderíamos manter uma parceria.
Nate se levanta em um pulo e corre até mim assim que me vê me
aproximando. Eu não lhe dou uma chance de perguntar se estou bem, em
parte porque começo a chorar de novo, e pergunto se ele pode me levar até o
hotel para pegar minhas coisas.
Eu não consigo olhar para o celular no caminho entre a arena e o hotel,
mas sei que deve estar cheio de mensagens. Ainda bem que eu não tinha
desfeito a mala, então só a pego, entrego o cartão na recepção e tomamos a
estrada de volta para Maple Hills.
Eu vejo o nome da minha mãe brilhar na tela do meu celular pela
milésima vez e ignoro a ligação até cair na caixa postal. Nathan ainda não
disse nada, mas a mão dele segue passeando entre minha perna e minha
nuca desde quando entramos no carro, me fazendo carinho, às vezes
apertando de leve para me lembrar de que ele está ao meu lado.
O rádio para quando o nome do meu pai aparece na tela do painel, nos
avisando que ele está ligando.
— Eles vão ficar chateados comigo. Gastaram tanto para comprar esta
roupa…
— Eles não vão ficar chateados, amor. Está na cara que estão
preocupados com você. Posso atender?
Eu assinto, e ele aceita a ligação.
— Alô.
— Nate, desculpa incomodar você. Você por acaso falou com Annie?
Julia está ligando, mas ela não atende. Estávamos assistindo à transmissão e
ela parecia muito chateada. Que fique entre nós, mas Julia está muito
preocupada.
— Ela está aqui comigo. — Ele olha rapidamente para mim e depois para
a estrada. — Ela está dormindo. Está muito chateada, exausta também.Estamos voltando para Maple Hills. Ela, hum, não ficou muito feliz quando
Aaron a beijou. Não fazia parte da apresentação e eu, hum, não acho que ela
vai querer mais patinar com ele.
Eu não gosto de fazer Nate ter que mentir para meus pais, mas não estou
pronta para lidar com eles.
— Não estou surpreso — resmunga meu pai. — A bolsa de gelo…
Nate pigarreia.
— Fui eu que dei um soco nele. Mas quero que você saiba…
Antes que ele comece a explicar que não é uma pessoa violenta, meu pai
o interrompe:
— Não precisa se explicar. Eu acho que foi merecido. Estamos tão
orgulhosos dela, ela foi maravilhosa até ele estragar tudo. Peça pra ela nos
ligar quando acordar, por favor. Queremos nos certificar de que ela está
bem. Podemos pegar um voo para Los Angeles se ela quiser, mas sem
pressão.
Meus pais odeiam voar, então o fato de se oferecerem para virem me ver
me faz querer chorar de novo. A única coisa que impede as lágrimas é o fato
de que eu deveria estar dormindo e não posso soluçar no fundo.
Nate aperta minha coxa de leve.
— Digo, sim. Obrigada por ligar.
— Eles não parecem estar chateados — digo para mim mesma.
— Eles não estão chateados.
Eu realmente durmo no carro e só acordo quando o carro passa pelo
quebra-molas na entrada do estacionamento do meu prédio.
Eu fiz a besteira de trazer todas as minhas coisas da casa de Nate na
semana passada, mas quero pegar alguns itens reconfortantes antes de
voltarmos para lá. Consigo ouvir uns barulhos antes de abrir a porta, e em
parte fico preocupada que esteja prestes a presenciar Lola e Robbie fazendo
alguma coisa no sofá, mas assim que abro a porta vejo Russ em pé na minha
sala de estar, com uma cara de choque, carregando uma caixa onde está
escrito “putaria”.— O que está acontecendo? — murmuro, e olho para os vários jogadores
de hóquei no apartamento. Nate coloca a mão na minha cintura e me guia
para dentro do apartamento, e depois fecha a porta atrás de nós.
— Força, vamos — grita Lola para ninguém em particular quando sai do
meu quarto. Em dois segundos ela já está me abraçando apertado.
— O que está acontecendo? — pergunto com o restante do ar que me
resta.
— Estamos nos mudando — responde ela, casualmente.
— Nós? Eu e você? Para onde vamos? — Eu pareço uma idiota sem saber
o que falar enquanto os meninos trabalham ao nosso redor, seguindo o que
imagino que foram ordens bem específicas de Lo.
Nathan abraça meus ombros e enfia a cabeça na curva do meu pescoço,
beijando a parte de trás da minha orelha.
— Para onde você acha?
— Tá bom, homem das cavernas — ela interrompe. — Junte-se aos
meninos. É só até a gente achar um lugar para nós duas. Não podemos
morar com ele.
Ouço algo quebrar no meu quarto e acho que consigo ver a pressão
arterial de Lola subir.
— JJ! — grita e vai correndo em direção ao barulho.
Eu deveria estar me sentindo exausta agora, mas, na verdade, só sinto
alívio. Tomei uma grande decisão hoje e não estava pronta para fazer mais
nenhuma. Eu me viro nos braços de Nathan e me aconchego no seu peito,
deixando o caos ao meu redor sumir. Ele beija meu cabelo e ri.
— Pronto para brincar de casinha todo dia?
— Desde que seja com você.

Quebrando o Gelo- Hannah GraceOnde histórias criam vida. Descubra agora