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MARRETA

Assim que as duas passaram pela porta, senti o estalo de alguma coisa quebrando dentro de mim. Era como se a saída dela, daquele jeito, levasse junto o que restava de controle em mim. Fiquei parado por um segundo, olhando para a porta que ainda balançava com a passagem delas, a raiva fervendo por baixo da minha pele.

Safira realmente foi embora, não olhou para trás, nem por um segundo. E minha mãe, que sempre esteve ao meu lado, me abandonou também.

Eu estava tão tomado pela raiva, pela frustração, que a única coisa que me veio à mente foi destruir o que estava ao meu alcance. A primeira coisa que encontrei foi o abajur na mesinha ao lado do sofá. Em um movimento rápido, o derrubei no chão, e ele se espatifou em mil pedaços. Mas isso não foi o suficiente. A raiva ainda estava ali, viva e pulsante. A próxima vítima foi o vaso que a Safira tanto gostava. Eu o joguei contra a parede.

E ainda assim, não bastava. Fui de um lado para o outro, derrubando cadeiras, chutando a mesa de centro, arremessando os quadros da parede. Cada impacto era como uma pequena descarga de adrenalina, mas o vazio que vinha logo depois era sufocante. O som dos objetos quebrando ao meu redor parecia distante, abafado pela confusão na minha cabeça.

Por que ela fez isso? Por que não me contou desde o começo? Será que ela estava se escondendo de mim por outro motivo? Todas essas perguntas rodavam pela minha mente, sem resposta.

Finalmente, depois de derrubar quase tudo na sala, eu parei, respirando com dificuldade. Meu peito subia e descia rápido, o suor escorria pela minha testa, e as mãos tremiam de tanto apertar os punhos. Olhei ao redor, vendo a destruição que causei, mas isso não trouxe nenhum alívio. Nada mudou. Safira ainda estava fora de casa, longe de mim, e minha mãe ainda estava contra mim.

Eu precisava sair dali. Ficar naquele ambiente só fazia minha cabeça girar mais e mais. Saí da casa, batendo a porta com força, e comecei a andar rápido.

O QG era o único lugar onde eu podia desabafar sem ser julgado, onde eu poderia encontrar os caras e, talvez, um pouco de tranquilidade. Cheguei lá em pouco tempo, empurrei a porta e entrei sem pensar. Rafael e William estavam lá, como sempre, limpando suas armas na mesa pequena no canto.

Eles levantaram os olhos quando me viram entrar, e eu sabia que algo no meu rosto denunciava o estado em que eu estava.

– Que porra é essa, Murilo? – Rafael perguntou, colocando a arma de lado e se levantando.

Eu não conseguia responder de imediato. Fiquei parado por um segundo, tentando organizar os pensamentos que estavam uma bagunça. Passei as mãos pelos cabelos, ainda suando, tentando encontrar uma maneira de explicar o que tinha acontecido.

– Fiz merda. – acabei dizendo, minha voz saindo mais rouca do que eu esperava. – Fiz uma merda enorme.

William se inclinou na cadeira.

– Que tipo de merda, cara? – ele perguntou, a voz baixa e séria.

Eu respirei fundo. Falei sobre como descobri que Safira estava trabalhando e que ela tinha escondido isso de mim. Como ela tinha mentido, saído sem me contar nada, e como eu perdi o controle, confrontando ela de um jeito que só piorou as coisas.

Rafael cruzou os braços, balançando a cabeça enquanto eu falava, e William ouvia em silêncio, o rosto inexpressivo.

– Você tinha que ter ido com calma. – Rafael disse, quando terminei de falar. – Sei que é difícil, mas você já parou pra pensar que ela podia ter um motivo?

Rafael sempre foi o "bonzinho". Era sempre muito racional... tanto que dava até raiva.

– Motivo? – eu explodi, cerrando os punhos. – Que porra de motivo justifica esconder isso de mim? Ela sabia muito bem que eu nunca deixaria ela trabalhar, nunca! Não era nem pra ter inventado essa porra, porque eu nunca deixei faltar nada pra ela.

– Também não é como se ela estivesse completamente certa nessa história. Esconder as coisas só piora tudo. – William finalmente falou, ainda com aquele tom sério.

– Ela saiu de casa. – eu disse, a voz falhando um pouco enquanto admitia isso em voz alta. – Foi pra casa da minha mãe. E eu sei que ela não vai deixar eu nem olhar pra ela.

Agora, depois do que aconteceu, eu sabia que ela não iria facilitar as coisas para mim.

– Cara, você precisa se acalmar e pensar no que vai fazer agora. – Rafael disse, sua voz mais calma, mas ainda carregada de seriedade.

Eu sabia que tinha agido errado, mas admitir isso era como engolir vidro.

William olhou para mim, os olhos cheios de uma compreensão que eu não esperava dele.

– Você quer mesmo a Safira, até que ponto? – William perguntou, sua voz era séria, cortante, como se ele estivesse tentando me fazer enxergar alguma coisa que eu ainda não tinha percebido.

Eu não precisei pensar muito antes de responder. As palavras saíram automaticamente, sem hesitação.

– A ponto de ficar preso a ela pro resto da vida, porra. Ela é minha mulher.

William sorriu de leve, balançando a cabeça.

– Então tá aí a resposta. – ele disse, seus olhos brilhando com algo que eu só fui entender depois. – Tua mãe não tava louca pra ter um neto? Só engravidar a Safira, que de quebra, o netinho vai fazer esquecer o que aconteceu.

Eu fiquei em silêncio por um momento, processando o que William tinha acabado de dizer. A ideia era tão simples, tão direta, que quase parecia óbvia. Mas então, um detalhe me veio à mente.

– Safira não tá nem olhando na minha cara. Como que eu vou fazer isso? – perguntei.

– Mulher fica mansinha com homem apaixonado.

William deu uma pausa, deixando o isqueiro estalar na palma da mão.

– Se você realmente quer a Safira de volta, e ainda por cima quer que sua mãe pare de encher o seu saco, vai ter que engolir esse orgulho e, no mínimo, fingir que tá desesperadamente apaixonado por ela.

Ele sorriu, e eu sabia que ele estava gostando de cada segundo daquela proposta sórdida.

Se por um lado, Rafael era o racional dos três. William era o contrário.

eu, não via nada além da Safira na minha frente.

– Engravidar ela vai ser a parte mais fácil. Com ela grávida, a Safira vai ficar presa a você de um jeito ou de outro, e sua mãe... Bom, sua mãe não vai estar nem aí pro que aconteceu, desde que o netinho dela esteja a caminho.


Aprisionada pelo Dono do Morro [Série Donos do Morro #2]Onde histórias criam vida. Descubra agora