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SAFIRA

Deitados na nossa cama, eu, Murilo, Gustavo e Ágata estávamos aconchegados sob as cobertas. Era a nossa rotina de toda noite, pelo menos até as crianças irem para o quarto deles. Hoje, Murilo tinha pegado o livro do Peter Pan para contar a história antes de dormirem. O que parecia uma leitura simples acabou virando uma comédia.

— "E então, Peter levantou voo, puxando Wendy para as estrelas" — Murilo começou a ler, com aquela voz séria de quem tenta se concentrar.

Gustavo, com seus seis anos, já não caía tanto nas histórias, mas adorava ouvir o pai lendo. Ele estava deitado de um lado de Murilo, enquanto Ágata, com apenas quatro, se aconchegava do outro lado, com os olhinhos atentos, mergulhada no mundo de fantasias que ele criava.

— Voar com uma garota que acabou de conhecer? — Murilo interrompeu a leitura com uma expressão de descrença. — Tá de brincadeira, né? Isso foi praticamente um sequestro disfarçado de aventura. Quem em sã consciência aceitaria voar com um moleque que apareceu do nada? — Ele balançou a cabeça, rindo. — Essa Wendy não tinha noção de perigo, certeza.

Gustavo e Ágata explodiram em gargalhadas, e eu, claro, não consegui segurar o riso.

— Murilo! — eu repreendi, dando um tapinha nele. — Deixa as crianças curtirem a história!

— Tô só dizendo, amor... — ele continuou, com um sorriso travesso. — O Peter Pan é praticamente o chefe de um bando de crianças fugitivas. Se isso fosse hoje em dia, a polícia já tava atrás dele!

— Eu não deixaria ninguém me sequestrar, pai! — ele disse, se inclinando pra frente com um brilho no olhar.

— Aí sim, meu garoto! — Murilo respondeu, levantando a mão para um "high five".

Eu ri, balançando a cabeça, enquanto Gustavo soltou uma gargalhada.

— Murilo... — eu o repreendi, batendo de leve no ombro dele.

— O Peter Pan é legal, papai! — Ágata protestou.

Ele deu uma risadinha e abaixou o livro, bagunçando os cabelos dela com carinho.

— Claro que ele é legal, princesa. — ele disse. — Mas vou te contar uma coisa: por mais que o Peter Pan seja o herói da história, eu não deixaria você sair por aí voando com qualquer moleque que aparece de repente, nem pensar. Só com o papai, combinado?

Ágata soltou uma risada gostosa, se aconchegando mais perto de Murilo, e Gustavo completou:

— Se o Peter Pan aparecesse aqui, o papai ia mandar ele voltar pra Terra do Nunca rapidinho! — Murilo piscou pra mim, rindo.

— Isso aí, filho. Aqui, o único super-herói sou eu!

Eu não consegui segurar o riso também. 

— Eu quero voar igual o Peter Pan! — Ágata disse, batendo os bracinhos com tanta energia que parecia que ia levantar voo ali mesmo na cama.

Eu só consegui suspirar e rir.

— Ai, meu Deus, lá vamos nós... — falei, dando um tapinha de leve no ombro do Murilo, que já estava se acabando de rir junto com as crianças.

— Tá vendo, Safira? Agora você vai ter que explicar pra ela que nós, meros mortais, não voamos por aí. — Ele olhou para Ágata com aquele olhar divertido que só ele sabia fazer. — Desculpa, amorzinho, mas o papai não sabe voar.

Ágata fez um biquinho adorável, claramente frustrada com a notícia.

— Ah, papai... — ela resmungou, olhando para ele com aqueles olhinhos brilhantes, esperando que ele de repente revelasse que podia, sim, voar.

Aprisionada pelo Dono do Morro [Série Donos do Morro #2]Onde histórias criam vida. Descubra agora