SAFIRA
Um dia eu vou fugir e ele nunca vai me encontrar, eu juro!
Essa era a única coisa que se passava na minha cabeça e o que me dava mais ódio era ter que manter a boca fechada ou apanharia de novo.
— Engole esse choro, caralho! — do nada ele virou para mim e gritou. Me encolhi mais, se isso fosse possível.
Se eu já chorava antes, agora eu gritava, fazia barulhos altos, me engasgando com meu próprio choro e soluços.
Era incontrolável.
Murilo pegou meus cabelos e puxou minha cabeça para trás com força, senti uma dor absurda no meu couro cabeludo.
— Me solta, por favor. — tossi, chorando.
— Mandei engolir o choro!
— Tá bom, tá bom. — minha voz saiu com dificuldade.
Eu tinha uma mão no meu cabelo e a outra segurava os lençóis, eu estava nua.
Apesar do jeito estranho dele, lhe dei um voto de confiança e fui idiota o bastante em pensar que eu realmente poderia mudar alguém como ele.
Tentei isso em cada sorriso que lhe dava e não era correspondida, em cada vez que permitia que ele me beijasse, tocasse o meu corpo... Nada disso despertava sequer um resquício de sentimento e afeto por parte de Murilo, ao contrário, ele parecia ter mais ódio de mim.
Por que ele só me tratava assim quando estávamos sozinhos?
Por que na frente dos outros, ele se controlava?
Eu me perguntava isso constantemente. O que havia em mim que o fazia agir com tanta crueldade apenas quando não havia testemunhas?
Eu realmente achei que podia mudar Murilo, que podia alcançar um lado bom dele, se é que esse lado existia. Mas cada vez que ele me machucava, eu percebia que estava enganada.
Não sei porque hoje eu achei que seria diferente e que depois de transar com Murilo, simplesmente poderia pedir para que ele me deixasse livre para ir embora.
Você é uma idiota, Safira. Achou mesmo que ele te daria a liberdade se você pedisse?
— Eu mandei calar a boca e engolir o choro, tá surda? — gritou com o rosto colado no meu, sua testa quase tocando a minha.
Me esforcei para parar de chorar, mas meu peito ainda saltava com os soluços.
Levei minhas mãos à minha boca, apertando para cessar o choro e o lençol caiu, revelando minha nudez.
Ele me olhou de cima a baixo e voltou sua atenção ao meu rosto, me encarando com aquele mesmo olhar de sempre.
Era difícil descrever o olhar que cobria o seu rosto, pois não tinha expressão alguma. Eu não sabia quando ele estava feliz ou triste, a única coisa que denunciava a sua raiva era a violência com que ele agia, era ainda maior do que a sua forma costumeira de me tratar.
— Nunca mais tente sair dessa merda. Você não sai mais daqui, vai me servi de brinquedinho, ser a minha mulherzinha e isso sem reclamar, porra. — falou tudo com extrema frieza, olhando bem dentro dos meus olhos.
— Porque comigo, Murilo? — chorei.
— Você não é pro meu bico, né? Agora vai me aguentar. — debochou, lembrando de algo que minha amiga tinha dito assim que nos conhecemos, e segurou meu rosto com as duas mãos, selando nossos lábios num selinho forçado.
Uma frase de Maíra tinha transformado a minha vida naquele inferno.
Assim que ele separou os lábios dos meus, me encarou e permaneceu sério e então pressionou a sua boca com mais força contra a minha e eu o observava com os olhos abertos.
— Melhora essa cara ou então já sabe. — avisou e eu olhei rapidamente para os meus pés, suspirei e tentei manter a calma.
Eu não queria que tudo aquilo recomeçasse, era demais para mim.
Murilo caminhou até o banheiro e parou no meio do caminho.
— Ah. — levantou o dedo como se tivesse lembrado de algo. — Eu vou tomar banho e vou sair, mas nem pense em colocar um dedo fora dessa casa.
Seu olhar me dava medo.
— Mulher minha fica em casa, limpando e fazendo almoço para quando eu voltar.
Não o olhei, se eu fizesse isso não aguentaria e despejaria tudo o que estava entalado na minha garganta há tempos.
— Olha para mim, caralho! — mandou e eu fechei meus olhos com força.
Como não o encarei, ele veio em passos largos em minha direção e pegou meu queixo com brutalidade, levantando minha cabeça.
— Eu mandei você olhar para mim. — disse com os dentes cerrados. — Eu vou repetir mais uma vez e espero que dessa vez você não se faça de idiota, ouviu?
Assenti fungando com um novo choro que se iniciava.
— O que vai fazer quando eu sair por aquela porta, Safira?
— Cuidar da casa e esperar você voltar. — repeti a frase dele.
— Por quê?
— Porque eu sou a sua mulher. — Era tão difícil dizer essas palavras.
— É isso mesmo, esposinha. — disse satisfeito e deixou um beijo na minha bochecha com força.
Assim que ele virou para o banheiro, limpei meu rosto com força e aproveitei para catar o que tinha sobrado das minhas roupas que ele havia rasgado.
Me permiti deixar que algumas lágrimas caíssem, deixando minha boca salgada.
Eu me amaldiçoava por todas as vezes que deixava ele me beijar, me tocar. Eu me odiava por gostar dessas vezes, por sentir meu corpo responder aos toques dele mesmo sabendo do monstro que ele era.
Cada sorriso que lhe dava, cada carícia permitida, era uma traição a mim mesma, um sinal de esperança que nunca deveria ter existido.
Eu me odiava por ter me permitido ter sentimentos por Murilo. Por ter aprendido a amar aquele homem e pelas migalhas que raramente eu conseguia arrancar dele.
Com a voz rouca, quase inaudível, murmurava para mim mesma enquanto as lágrimas escorriam pelo meu rosto:
— Esse amor não vai me segurar aqui.
As palavras saíam com um tom de desespero.
— Ele não vai me prender aqui pra sempre... — sussurrei, engolindo o choro. — Não importa o quanto eu queira acreditar, esse amor é uma prisão que me sufoca.
Com a cabeça baixa e os olhos fechados, continuava a murmurar, tentando ignorar a dor física e emocional que me consumia:
— Eu sei que sou uma idiota... uma iludida que ainda acredita que ele pode mudar. Mas, no fundo, eu sei que ele não vai mudar. — minha voz falhou, e um soluço involuntário escapuliu.
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Aprisionada pelo Dono do Morro [Série Donos do Morro #2]
RomanceSafira cresceu na favela e nunca teve uma vida fácil. Ela fazia de tudo para ignorar aquela parte tão violenta do que era morar ali. Com a morte recente dos pais, Safira se vê sem rumo na vida. Do outro lado, Murilo, também conhecido com Marreta, er...