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MARRETA

Saí de casa com passos rápidos, com o sangue ainda fervendo nas veias. Minha cabeça estava um caos, como se cada pensamento fosse uma faca me cortando por dentro. As palavras de Safira ainda ecoavam nos meus ouvidos: "Você sempre pensa o pior de mim!". 

Claro que eu pensava, caralho! Ela não me dava escolha. Com aquela porra de segredo que ela se recusava a contar... como eu não ia pensar o pior?

Minha mente estava tão embaralhada que nem percebi quando Maíra veio correndo atrás de mim. Só senti um puxão no braço. Virei pra ela, ainda tomado pela raiva, e me soltei com força, quase a derrubando.

– O que você quer, Maíra? – rosnei, os olhos queimando de ódio. – Vai defender a Safira também? Vai dizer que não tem nada de errado, que eu tô vendo coisa onde não tem?

Maíra balançou a cabeça, a expressão de decepção.

– Para com isso, Murilo, só um pouquinho! – ela suplicou, segurando meus braços com força. – Você tá cego de raiva! Não vai entender nada desse jeito!

– Entender o quê? – gritei, me livrando das mãos dela. – Que você tá ajudando a Safira a me enganar Que você sabia de tudo e ficou calada?

Ela piscou, assustada com a minha raiva, mas não recuou. Em vez disso, deu um passo à frente, ficando cara a cara comigo.

– Eu não tô te enganando, nem a Safira. Você tá louco, cara! Escuta o que eu tenho pra dizer! – a voz dela estava firme. – A Safira nunca te traiu, mas você vai acabar destruindo tudo se continuar assim!

– Nunca me traiu? – soltei uma risada amarga, olhando nos olhos dela. – Então por que ela mentiu? Por que essa história de curso que não existe, hein? Se não é traição, é o quê?

Maíra respirou fundo.

– É verdade que não tem curso nenhum, Murilo, mas ela não mentiu por mal. A Safira tem medo de você, Murilo. Do jeito que você fica ciumento, possessivo. E se eu te contar o que ela fazia todo esse tempo, talvez você entenda o porquê.

Uma parte de mim queria ouvir, queria que ela dissesse algo que fizesse tudo fazer sentido, mas a outra parte estava preparada para mais mentiras.

– Então fala! – exigi, cruzando os braços. – Quero ver que desculpa você vai inventar agora.

Maíra suspirou, os ombros caindo um pouco antes de começar a falar.

– Ela saia pra trabalhar, pra cuidar de uma criança. Ela é babá, e já faz seis meses que ela tá cuidando de um garotinho de três anos chamado Felipe. Esse é o "Felipe" de quem você tá com ciúmes.

Aquelas palavras me atingiram como um soco no estômago. Babá? Felipe? Um garotinho de três anos? 

– Babá? – murmurei, mais pra mim mesmo do que pra Maíra. – Ela é babá?

– É, Murilo – Maíra confirmou, os olhos fixos nos meus. – E ela ama aquele menino como se fosse da família. Ela mentiu porque tinha medo de como você ia reagir, de você não aceitar. Mas não tem traição nenhuma, entendeu?

Senti o chão se abrir sob meus pés. Todo o ódio, toda a raiva que eu sentia... tudo começou a se transformar em outra coisa. Culpa. Vergonha. Como eu podia ter pensado tão mal dela? Como eu pude gritar com Safira, ameaçar ela daquele jeito?

Mas, ao mesmo tempo, a raiva ainda não tinha desaparecido completamente. Parte de mim queria continuar brigando, queria encontrar alguma desculpa para justificar o que eu tinha feito. Então, ao invés de admitir que estava errado, voltei a atacar:

– E por que ela não me contou? – rebati. – Por que mentiu esse tempo todo?

Maíra olhou pra mim como se eu fosse o maior idiota do mundo, e talvez eu fosse mesmo.

– Talvez porque você seja ciumento, possessivo e tenha essa mania de achar que todo mundo tá te traindo. Talvez porque você se enfureça por qualquer coisa. Ou talvez porque Safira já sabia que, mesmo que te contasse a verdade, você ia transformar isso em mais uma briga, como está fazendo agora.

As palavras dela me acertaram em cheio. Era difícil admitir, mas ela tinha razão. Eu sempre agia assim, sempre achava que todo mundo estava contra mim, que qualquer coisa era uma ameaça. Eu tinha esse maldito instinto de proteger o que é meu a qualquer custo, mas talvez eu estivesse destruindo tudo com as minhas próprias mãos.

– Por que você não me contou antes, Maíra? – perguntei.

Ela suspirou, balançando a cabeça.

– Eu não te contei porque isso não era da minha conta, Murilo. Eu respeitei a decisão da Safira de te contar quando ela estivesse pronta. Mas você não deixou ela fazer isso, não é? Você ficou fuçando, brigando, até que tudo explodiu.

Fechei os olhos. A verdade era como uma lâmina afiada, cortando fundo e deixando feridas que eu não sabia como curar. Eu estava errado. Tinha agido como um idiota, um monstro, e agora não sabia como consertar isso.

– Eu... eu só queria proteger o que é meu – sussurrei. – Não queria que ninguém tirasse ela de mim.

Maíra deu um passo à frente e colocou uma mão no meu ombro, o toque dela mais suave agora.

– Ninguém vai tirar a Safira de você, Murilo. Mas você precisa confiar nela. Não pode continuar agindo assim, porque, se continuar, é você vai acabar afastando ela pra sempre. – disse. – Você tem tanto medo de que alguém tire a Safira de você, que eu acho que é você mesmo que vai fazer isso, irmão.

As palavras dela ecoaram na minha mente, como uma verdade amarga que eu não queria aceitar. Como eu ia olhar nos olhos dela depois de tudo o que fiz? Como consertar as coisas, quando eu mesmo tinha destruído tudo?

– E agora, Maíra? O que eu faço? – perguntei, minha voz um sussurro desesperado.

Ela suspirou.

– Você vai voltar pra casa e vai falar com a Safira, com calma. Vai pedir desculpas, vai ouvir o que ela tem pra dizer. E, acima de tudo, vai mostrar pra ela que confia nela. Porque, se não fizer isso, Murilo, você vai perder a mulher que ama.

Levantei a cabeça rápido com o que ela tinha dito.

– Nem adianta tenta negar ou dizer que eu tô doida. Eu sei que ama. – olhando pra mim com uma expressão que misturava compaixão e cansaço. – De um jeito bem maluco, vamos ser sinceros, né?!

Eu não neguei, mas também não admiti... Apenas ignorei o que ela tinha dito.

– E se ela não me desculpar? – perguntei, a voz quase inaudível.

Maíra deu de ombros, mas o olhar dela era firme.

– Aí, Murilo, você vai ter que aceitar as consequências dos seus atos. Porque a Safira não merece menos que isso.

Ela me soltou e deu um passo pra trás, me deixando ali, sozinho com meus pensamentos. Mas eu sabia que não podia ficar ali, parado, afundando no meu próprio arrependimento. Eu tinha que fazer alguma coisa, tinha que tentar consertar as coisas.

Respirei fundo, tentando reunir a coragem que me faltava, e comecei a andar de volta pra casa.


Aprisionada pelo Dono do Morro [Série Donos do Morro #2]Onde histórias criam vida. Descubra agora