𝟎𝟏𝟕 | O Último Olhar

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— Fique com essa — Christian murmura, entregando uma M14 para Amélia, seu olhar sombrio refletindo a seriedade da situação, mas as mãos que entregam a arma tremem levemente, como se carregassem o peso de uma promessa oculta. — Fique aqui e proteja essas pessoas.

Eles estão no segundo andar da mansão, numa sala abafada e iluminada por lâmpadas de luz amarela que lançam sombras longas e inquietantes sobre as pilhas de armas. O local, que antes parecia comum, agora se transformou em um arsenal improvisado. Soldados se armam apressadamente, pegando pistolas, rifles, facas e munições espalhadas pela mesa de metal. Cada movimento gera um som áspero de metal e ecoa em um silêncio tenso.

Amélia observa a correria, ainda com a expressão alarmada pelos eventos dos últimos minutos, e respira fundo para reunir forças.

— E você? — ela sussurra, com a voz trêmula, quase suprimida pelo ruído ao redor. A ideia de vê-lo partir a inquieta mais do que ela gostaria de admitir.

Christian verifica o pente de sua Colt M1991, inspecionando-o com o cuidado de quem já esteve em combate vezes demais para subestimar um erro. Seu olhar é resoluto, e ele fecha o pente com um clique seco antes de devolvê-la ao coldre, como se estivesse concluindo uma parte de si.

— Eu vou com eles — ele responde, sem tirar os olhos das armas. Sua voz tem uma nota de resignação que Amélia nota de imediato.

Ela franze o cenho, dando um passo à frente.

— Eu vou com você.

Christian balança a cabeça, contrariado, e a seriedade em seu olhar a detém. O olhar dele a perfura, como se carregasse o peso de uma memória que ele não deseja reviver.

— Amélia… — ele começa, hesitando, a voz agora mais suave, quase trêmula. — Eu já sei como isso vai acabar… e não vai acabar bem para todos. — Ele pausa, engolindo em seco, seus olhos vacilam e perdem o foco, perdendo-se em lembranças distantes. — Já vi isso na escola... Quando aqueles quatro prisioneiros fingiram ser policiais. — Ele aperta os lábios, respirando fundo antes de continuar, e Amélia percebe o tormento escondido em cada palavra. — Tantas pessoas morreram. E eu não posso...

Ele não termina, as palavras ficando presas em sua garganta como um nó que recusa se desatar. O peso da lembrança o deixa vulnerável por um breve instante.

— E? — Amélia o incentiva a falar, seus olhos curiosos, tentando compreender a profundidade do que ele carrega.

— Eu não posso perder você também. — A voz dele é mais suave, quase um sussurro, e Amélia é pega de surpresa. Ele a encara com um misto de vulnerabilidade e angústia, como se cada palavra fosse uma revelação dolorosa. — Eu sei que não sou um bom homem… e que você não sente o mesmo por mim. Não quero que sinta, mas você é importante para mim.

A confissão deixa Amélia sem palavras, o peso do que ele sente preenchendo o ar. Ele aperta os punhos, o rosto tenso, como se aquela declaração fosse algo que ele sempre guardara profundamente.

— Só… por favor, não me faça passar por isso de novo. Não me faça perder mais alguém que eu me importo… — ele suplica, os olhos carregados de uma tristeza quase insuportável. — porque eu simplesmente… não consigo mais.

Amélia tenta encontrar palavras que transmitam o que sente sobre ele, as emoções borbulhando dentro dela, mas tudo o que ela consegue é uma tentativa hesitante.

— Você não é um homem ruim, eu...

Christian ergue uma mão, interrompendo-a antes que ela prossiga, e sorri, mas é um sorriso triste, sem alegria.

The Dead Come Back To Life: O Caminho Para CrossvilleOnde histórias criam vida. Descubra agora