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DULCE MARIA

Washington DC

Meu corpo estava tão cansado, os joelhos latejando e o estômago roncando de fome, mas precisava terminar o que fazia antes que Blanca chegasse.

Normalmente eu não me preocupava com isso, porque com Maite me ajudando, no meio da tarde estava tudo feito. Contudo, ela tinha uma entrevista de emprego naquele dia, então saiu de casa cedo, e mesmo com toda a minha agilidade, ainda faltava muita coisa para fazer.

Coloquei-me de pé e fiz um leve alongamento a fim de relaxar os músculos doloridos e fatigados.

Todas as sextas-feiras, assim que minha mãe saía de casa, eu pulava da cama para dar faxina na antiga mansão em que morávamos, a mesma que fui servida por várias pessoas durante boa parte da infância, mas que agora abrigava tão somente minha mãe, eu e os únicos empregados que sobraram, afinal, o tempo das vacas gordas tinha passado e nossa realidade era outra.

Blanca manteve o emprego da nossa cozinheira e de seu marido, o que era nosso motorista, jardineiro, faz tudo, com a condição de que eles dessem conta de todo o serviço da casa, coisa que era impossível, pois a propriedade era gigantesca, com isso, eu e Maite, filha deles e minha melhor/e única amiga, nos dispusemos a ajudar para que dessem conta de tudo.

Claro que eles foram contra, afinal, eu era a "patroa", além do mais, todos nós sabíamos que se minha digníssima mãe sonhasse que eu ajudava nas tarefas de casa, os colocaria no olho da rua. Mas seria impossível para mim, deixar Consuelo fazer tudo sozinha. Ela tinha um problema na coluna que a impedia de fazer muitos movimentos, imagina limpar uma casa daquelas.

Para completar, Consuelo, Benito e Maite eram ilegais no país e se saíssem dali, talvez não arrumassem algo melhor, isso se não fossem deportados, então agarravam-se ao que tinham.

De minha parte, faria de tudo para mantê-los comigo. Era deles e de Gemma que vinha todo o afeto que recebia desde a morte de meu pai, pois minha querida mamãe só se preocupava com o próprio umbigo e não erguia a mão para fazer nada naquela casa, nem mesmo seu quarto ela se preocupava em preservar arrumado. Ela era uma mulher horrível e eles, minha família.

Eu costumava iniciar a limpeza pelas salas de estar e jantar, passando pelo hall de entrada de onde só saía quando o piso ficava reluzente. De lá, ia para a grande escada com piso de mármore e corrimão de ferro forjado, todo trabalhado, de onde eu precisava tirar a poeira e esfregar a flanela até cada detalhe dourado estar brilhando.

Enquanto eu encarnava o papel da própria gata borralheira, minha mãe passava o dia em um spa com direito a todo tipo de tratamento, nos outros dias ela ia a almoços, ao Jockey Club ou às casas de suas amigas socialites, tentando encontrar uma forma de voltar a ser rica, já que com seu consumismo desenfreado, a herança que papai deixou estava prestes a acabar.

Por várias vezes me propus a arrumar um trabalho, mas ela sempre falava a mesma coisa: não investira todo aquele dinheiro em minha educação para que eu acabasse atrás de um balcão de loja.

Balancei a cabeça para tentar dissipar esses pensamentos e não me aborrecer, mas todo dia ela aparecia com uma coisa. Blanca Saviñon era uma mulher fria e gananciosa que tinha prazer em me torturar psicologicamente. Na minha concepção, era o próprio diabo de saias usando Loubotins.

Estremeci só de visualizar a imagem enquanto me retirava do banheiro que acabara de limpar.

Pelo tempo que papai viveu, tudo funcionou perfeitamente e por alguns anos tive a vida de princesa.

Ia para o colégio com motorista, tinha uma babá, que depois se tornou nossa governanta e que foi uma verdadeira mãe para mim. Fora isso, meu dia era cheio de atividades tais como balé, aulas de piano, etiqueta, línguas estrangeiras, culinária, decoração e tudo o que uma dama de alta sociedade precisava ter em seu "Portfólio para Arrumar Um Marido Rico", que todas nós adquiríamos desde o nascimento.

O políticoOnde histórias criam vida. Descubra agora