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DULCE MARIA

A boate onde Maite gostava de ir pertencia a Kellan, um primo de Christian, e ficava em uma região meio barra pesada, bem afastada do bairro onde eu morava. Entretanto, os frequentadores eram, em sua maioria, gente de bem, que apenas queria desestressar de uma semana difícil de trabalho.

Como o lugar era simples, eu tentava ao máximo passar despercebida, o que era difícil, porque grande parte das pessoas daquele bairro eram negras ou latinas e eu, com minha pele ultra clara, chamava atenção sem querer, então não fazia questão de me arrumar demais.

Por ser noite de hip hop, coloquei um vestidinho preto com jaqueta jeans, botinhas e muitos acessórios, deixei os cabelos soltos e fiz uma maquiagem mais carregada.

Se Blanca me visse, jamais acreditaria que era sua filha, pois com ela eu sempre usava roupas mais sóbrias e clássicas, geralmente aquelas que ela não queria mais.

Sim, minhas roupas eram todas provenientes da pilha que minha mãe tirava de seu closet a cada seis meses. Na verdade, eu não me lembrava de quando havia comprado alguma roupa para mim depois de adulta. Mas me recordava muito bem das palavras cruéis que ouvi na última vez em que me atrevi a pedir algo:

"Olhe bem para você, Dulce Maria, acha mesmo que um vestido novo fará diferença? Se ao menos fosse bonita... Não me faça gastar dinheiro à toa."

Nas primeiras vezes que ela me falou coisas assim, eu me tranquei no quarto e chorei por horas, mas com o passar do tempo percebi que só fazia isso por maldade, inveja ou simplesmente para me magoar. Foi quando parei de me importar e a me recusar a lhe dar mais munição.

A mulher era do mal e nada iria mudar sua natureza. Então apenas aceitei que seria daquela forma e resolvi aproveitar, ao ver o lado bom daquilo.

As roupas, além de serem lindas, eram sempre novas. Com isso, eu conseguia me manter sempre bem vestida e, de quebra, Consuelo e Maite também conseguiam algumas peças entre as que ficavam boas em seus corpos bem mais voluptuosos que os nossos. O que sobrava eu doava para o bazar da igreja, ao que eles agradeciam efusivamente.

No final, todos saíam ganhando.

Depois de pronta, desci para encontrar Maite, que já me esperava em frente à porta de entrada.

Quem nos levaria seria Benito. Apesar das outras obrigações que tinha na casa, ele precisava ficar à disposição da patroa 24h por dia. Geralmente a levava aos lugares e voltava para casa, permanecendo à espera de uma ligação, quando chegava a hora de ir busca-la.

Então, sempre que íamos sair, aproveitávamos esse intervalo para que ele nos levasse ao local escolhido e depois nos pegasse.

No começo ele foi contra, pois tinha medo de que ela descobrisse, mas depois de algum tempo e muita insistência, o motorista percebeu que arrumaríamos um jeito de ir, com ou sem sua ajuda, e decidiu que era mais seguro colaborar.

Quando ia a seus eventos noturnos dos finais de semana, Blanca costumava voltar para casa entre duas e três da manhã, o que eu achava meio absurdo para alguém que se dizia "uma mãe de família", mas não para quem estava à caça.

Contudo, não iria reclamar e muito menos questionar o que ela fazia até altas horas na rua pois adorava quando ela saía. Mesmo nos dias em que não havia nenhum programa combinado com Maite, era bom, parecia que o ar dentro de casa ficava mais leve.

Todas as vezes que eu saía assim, sentia-me a própria cinderela tendo que estar de volta até meia-noite. A diferença era que a madrasta má era a mulher que me deu à luz e que, em tese, devia me amar e cuidar.

O políticoOnde histórias criam vida. Descubra agora