Capítulo XXXII - Parte II

6K 716 85
                                    

Quando meus olhos se abrem novamente, já está claro no ambiente.

É dia de novo, mas não tenho nenhuma vontade de levantar. Sinto um calor insuportável em todo meu corpo, mas não estou suando. É como se tivesse uma fonte de energia ligada dentro de mim.

Experimento mexer alguns membros do corpo, e solto um gemido quando a dor irradia do meu tornozelo direito. O resto do corpo também parece um enorme peso morto e dolorido, mas descarto essa sensação para longe quando penso em tudo que ainda está por vir.

Tento me sentar, amaldiçoando baixinho. Encaro as escoriações e arranhões em minhas pernas, todos os hematomas e o enorme inchaço no meu pé. Por um minuto, desejo mais do que tudo estar em casa, enrolada em algum cobertor com meu caderno de desenhos. Solto um suspiro.

Quando levanto meu olhar, reparo instantaneamente que a porta de ferro não está fechada, por isso o ambiente está tão claro. A luz do sol invade da porta da frente o ambiente. Posso ver a fogueira armada lá fora e há alguém cochilando junto a ela, com uma revista na mão; um garoto não muito mais velho do que eu.

Eu o encaro e me lembro de tê-lo visto na última noite quando adentrou o cômodo com o outro cara. Ele usa um boné virado para trás, óculos fundo-de-garrafa, tem problemas com acne e é magro demais para as roupas largas que usa. Benjamin quer que eu sugue o sangue dele, mas ele não me parece ter quase nenhum. Por um segundo sinto pena dele.

─ Você está horrível. - Desvio meu olhos para Ben, que me encara com uma carranca medonha. Pisco para ele. - Sabe, me lembro de que você sempre gostou do perigo, mas não de quando começou a ter tendências suicidas.

O "v" em sua testa está mais marcado do que nunca, e sua boca comprimida em uma linha rígida. Ele está furioso e pelo modo como me olha, deve me achar burra ou maluca por ter feito que o fiz. Ou os dois.

─ Valeu a pena.

Digo a ele, enquanto aperto em minha mão direita o meu prêmio, sem que ele perceba, me tranquilizando por ele estar ali. Eu permito que o alívio me invada um pouquinho.

─ "Valeu a pena"? - Ele repete, descrente. Seus olhos ganhando o tom dourado do ouro. - Valeu a pena quase ser eletrocutada até a morte? Valeu a pena estar com a cara parecida com um saco de pancada? Ou estar com o tornozelo completamente fodido? Francamente, Madeline, você não me ouve? Eu disse que...

─ Eiiii! - Eu o corto e ele faz uma cara feia para mim, me queimando com seus olhos em brasa. Vejo que o garoto sentado a fogueiro se remexe. - Pelo amor de Deus, Benjamin; menos. Você quer sair daqui, mas não quer que seja do meu jeito. Eu não preciso mais que você fique cuidando de mim.

─ Não é o que parece. - Ele rebate, e é a minha vez de fazer uma cara feia para ele.

─ Porque você está sussurrando? - Indago, percebendo que em nenhum momento sua voz esteve em um tom normal.

─ Porque são seis da manhã e ainda estão todos dormindo. - Ele responde, mal humorado. - Talvez não quisesse causar mais estragos.

Ele me lança um olhar significativo, e eu reviro os olhos para ele.

─ Você sabe que horas o cara sai para caçar? - Pergunto.

─ Ele já saiu.

─ Há muito tempo? - Insisto.

─ Sim.

Merda.

─ Porque você quer saber?

Ele levanta uma sobrancelha para mim, mas não o respondo. Ao invés disso, tento me por de pé, me arrastando até as grades e as usando como apoio.

Entre Lobos & Flores - Livro 1Onde histórias criam vida. Descubra agora